15 de ago. de 2020

Espiritualidade é atividade

 O agente da Pastoral Litúrgica que não cultiva e não bebe da espiritualidade litúrgica pouco a pouco começa a perder o interesse pelo seu serviço e, quase sempre, ou abandona ou o realiza de qualquer jeito. Diante desse quadro, entende-se a necessidade de incrementar e cultivar a espiritualidade entre os agentes da Pastoral Litúrgica para que encontrem sentido naquilo que fazem e o façam da melhor forma possível. Assim, a atividade pastoral reverterá em benefício próprio e beneficiará espiritualmente todos os celebrantes pela qualidade espiritual cultivada e partilhada nas celebrações.

Conceito de espiritualidade          

A palavra espiritualidade tem a ver com “espírito”; com “espiritual”. Não é novidade para ninguém que ao falar de espiritualidade, vamos tratar de coisas referentes ao espírito e ao que tem relação com espiritual. Se existe esta primeira dimensão, referente ao “espírito” e ao “espiritual”, há uma outra conotação que precisa ser considerada: o sufixo “dade” que indica ação, atividade, algo que se constrói, que vai sendo edificado, vai sendo cultivado pouco a pouco. Isto faz compreender que a espiritualidade não é algo pronto, mas cultivado da mesma forma que se cultiva um jardim, com o mesmo cuidado e dedicação no cultivo de uma horta.  

Diante de tais considerações, compreende-se que “espiritualidade” não é algo passivo, mas uma ação, uma atividade, uma verdadeira construção que pertence à esfera do espírito, à esfera do espiritual, à interioridade da pessoa. A espiritualidade é um exercício que, pelo seu cultivo, vai formando, modelando a pessoa, à medida que ela se abre e permite que o Espírito Santo nela aja. Portanto, o cultivo da espiritualidade não é unicamente humano, mas principalmente divino e humano (Jr 18,6). Trata-se de um exercício tão forte que influencia todo o agir da pessoa: seu modo de pensar, de tratar os outros e seu relacionamento consigo próprio. A espiritualidade determina um modo de vida e um modo de relacionamento.   Em resumo: a espiritualidade determina um comportamento e um estilo de vida.

A espiritualidade, portanto, não tem nada a ver com passividade, inativo, somente receptivo, mas algo ativo que precisa ser exercitado por meios próprios para o crescimento sereno e equilibrado. Não se pode reduzir a espiritualidade a momentos de oração, de meditação Bíblica, de Lectio Divina, de celebrações sacramentais... tudo isso, e outras atividades mais, neste contexto, fazem parte do cultivo da espiritualidade. O foco é compreender a espiritualidade como atividade do Espírito Santo na vida pessoal.

Agente da PLP e cultivo da espiritualidade

           O enquadramento proposto pela compreensão da espiritualidade, nada exaustivo, faz compreender que quem atua em qualquer atividade pastoral da Igreja só terá bom desempenho se neste serviço for cultivada a espiritualidade. Isto é ainda mais válido para quem atua na PLP, na Pastoral Litúrgica Paroquial.

            Quem atua na PLP tem uma responsabilidade direta, quase obrigatória, eu diria, para com o cultivo da espiritualidade na comunidade. Isto é ainda mais premente nas comunidades que não contam com uma Pastoral da Espiritualidade, quando a Liturgia é única fonte da espiritualidade da comunidade. Ora, quem é responsável por Liturgia torna-se responsável para cultivar a vida espiritual na comunidade e da comunidade. Como ninguém não pode dar do que não tem, o agente da PLP deve ser um exemplar cultivador da espiritualidade, especialmente da espiritualidade litúrgica.

            Certamente que todos os cristãos são convidados a cultivar a espiritualidade, mas alguns são chamados, por vocação, a dedicarem completamente suas vidas ao exercício da espiritualidade. Muitos se retiram do mundo para poder cultivar este estilo de vida. No meio do povo, nas mais diferentes atividades existenciais e sociais, como diz o documento conciliar Gaudium et spes, está o testemunho vivo dos leigos e, no caso presente, daqueles que atuam pastoralmente na atividade litúrgica. Quer dizer: quem bebe na fonte espiritual da Liturgia vive testemunhalmente o que celebra no meio do mundo.

Serginho Valle

Agosto de 2020

 

8 de ago. de 2020

Espírito Santo e Penitência

    No segundo Domingo da Páscoa, o Evangelho relata que os Apóstolos estão reunidos no cenáculo. Jesus entra, sopra sobre eles e lhes confere o Espírito Santo e, pela ação do Espírito Santo, o poder de perdoar os pecados e conceder o dom da paz. O fato está relatado em Jo 20,22-23. 

Preparação espiritual

A crise do Sacramento da Penitência, em nossos dias, entre outras causas, tem forte relação com o fato de não ser celebrado como rito litúrgico conduzido pelo Espírito Santo. Na prática, isto significa, que o Sacramento da Penitência, em muitas celebrações, é celebrado sem espiritualidade, sem a mística do encontro com a misericórdia divina.

A quarta fórmula de acolhimento do penitente, proposta no Ritual da Penitência diz: "A Graça do Espírito Santo ilumine o teu coração, para que confesses os teus pecados e reconheças a misericórdia de Deus". Uma celebração, no entender da Teologia Eucológica da Penitência, a ser realizada com a luz e na condução do Espírito Santo. Uma celebração para ser realizada na silenciosa experiência da presença do Espírito Santo. Não sem motivo, a Praenotanda do Ritual da Penitência pede que o padre confessor se prepare com oração e com silêncio antes de atender uma confissão. A mesma necessidade da oração e do silêncio antes de celebrar a Penitência é recomendada ao penitente, orienta a Praenotanda da Penitência n. 15.

 

Espírito Santo e perdão dos pecados

O Espírito Santo é o Espírito de Deus que Jesus ressuscitado doa à Igreja. Jesus deixa seu Espírito na Igreja. Faz isso pelo gesto do sopro: "soprando sobre eles". Deixa seu "ar", seu "respiro", seu Espírito. A Igreja vive porque respira o ar, respira o “sopro divino” do Espírito Santo, o Espírito de Deus.

Na sua primeira aparição, que João data no mesmo dia da Ressurreição, Jesus doa o seu Espírito para perdoar os pecados. Observe que é a primeira atividade da Igreja: perdoar os pecados com o dom e pelo dom do Espírito Santo. Perdoar os pecados no poder do Espírito Santo. Perdoar os pecados e, como consequência, oferecer a paz.

 

Sacramento da Penitência e dom da paz

O dom do Espírito Santo é precedido pelo dom da paz: "a paz esteja convosco!" Em seguida, soprou o Espírito Santo para perdão dos pecados. O dom da paz é a condição para acolher o perdão dos pecados e, ao mesmo tempo, é a consequência imediata de quem recebeu o Espírito Santo pelo perdão dos pecados. Isto acontece pelo gesto da imposição das mãos, gesto doador do Espírito Santo, no Sacramento da Penitência.

Paz, no sentido Bíblico do shalom. Paz com Deus, paz vivendo harmoniosamente com a criação, paz vivendo fraternalmente com os outros, paz dentro do próprio coração. O pecado é destruidor desta paz. Destrói a conivência com Deus, destrói a fraternidade, destrói a serenidade interior. O perdão é a ação do Espírito Santo que reconstrói a paz. É o que diz a fórmula da absolvição: "Deus, Pai de misericórdia, que, pela morte e ressurreição do seu Filho, reconciliou o mundo consigo e enviou o Espírito Santo para a remissão dos pecados, te conceda, pelo mistério da Igreja, o PERDÃO E A PAZ."

A paz é sinônimo de harmonia com Deus, com a criação, com os outros e consigo mesmo. Ir confessar-se não para declamar uma listinha de pecados, mas para celebrar o dom da paz divina, dom e presença do Espírito Santo em quem é perdoado.

 

Dom da paciência

A paz interior produz a paciência. A paciência, a lado da humildade e da sinceridade, são as três virtudes de uma boa confissão. A paciência é fruto do cultivo da paz. Quem vive em harmonia com Deus, com a criação, com os outros e consigo mesmo é uma pessoa paciente; quer dizer cheia de paz. O Sacramento da Penitência é fonte da paciência. O paciente, portanto, é alguém que está cheio da paz divina e, por este motivo, é paciente com todos, especialmente com que lhe ofende.

Diante disso, compreende-se que o ministro da Penitência, o bispo e o padre, são chamados a ser homens da paz e, consequentemente, pacientes. Cultivadores da paciência para compreender as limitações espirituais e psicológicas de quem vem confessar, pacientes para ouvir as lamentações e as dores que o pecado provoca no coração do penitente. Paciente, principalmente, para se dispor a acolher e celebrar o perdão divino. E para isso, ele precisa pacientemente dispor de todo seu tempo. Não existe nada mais incômodo, na celebração da Penitência, que padre apressado e ansioso para terminar logo.

Serginho Valle

Julho de 2020


 

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