14 de nov. de 2020

Celebração do Mistério Pascal de Cristo no tempo

 

Celebrar os mistérios de Cristo, do ponto de vista teológico litúrgico, não é apenas “lembrar” o que Jesus fez por nós e, menos ainda, acompanhar a biografia de Jesus, iniciando no Natal, quando nasceu, terminando na sua volta ao Pai, na Ascensão. Ano Litúrgico não é isso. Não se trata, tampouco, de repetir em ritos o que Jesus realizou uma vez para sempre. O Ano Litúrgico, através das celebrações, torna atual e insere os celebrantes na mesma eficácia salvífica do gesto histórico realizado por Jesus Cristo. Assim, por exemplo, aquele momento histórico da Morte e Ressurreição de Jesus Cristo, que favoreceu a reconciliação com Deus tem, no momento celebrativo, a mesma eficácia, a mesma ação e dinâmica salvífica através da celebração litúrgica. 
        Um belo fundamento encontra-se na Constituição Sacrosanctum Concilium (SC 7) descrevendo a visão da Igreja sobre a Liturgia: “Disto se segue que toda a celebração litúrgica, como obra de Cristo sacerdote, e de seu corpo, que é a Igreja, é uma ação sagrada por excelência, cuja eficácia, no mesmo título e grau, não é igualada por nenhuma outra ação da Igreja.” A compreensão do acontecimento memorial no Ano Litúrgico, está ainda mais aprimorada na SC 102: “Relembrando destarte os Mistérios da Redenção, franqueia aos fiéis as riquezas do poder santificador e dos méritos de seu Senhor, de tal sorte que, de alguma forma, os torna presentes em todo o tempo, para que os fiéis entrem em contato com eles e sejam repletos da salvação.” 
        Compreende-se assim que a espiritualidade litúrgica se alimenta diretamente do Mistério Pascal de Cristo, isto é, do projeto divino realizado por Jesus Cristo no mundo e atualizado na celebração litúrgica, em qualquer momento da História. Diferentemente de espiritualidades baseadas em devoções, por exemplo, a espiritualidade litúrgica alimenta-se diretamente na e da Salvação divina realizada por Jesus Cristo e faz com que os celebrantes participem e comunguem desta realidade salvífica com sua eficácia.

Serginho Valle
Novembro de 2020

 

7 de nov. de 2020

Dois modos de compreender o Ano Litúrgico

 

Um modo muito simples, mas bem revelador para compreender o Ano Litúrgico da Igreja é a frase título de um livro do liturgista italiano Aldo Bergamini: “Cristo, festa da Igreja”. O autor escreve que celebrar o Mistério Pascal de Jesus Cristo, no tempo, é “trazer” Jesus Cristo, com sua salvação, aos nossos dias. A atualização da atividade salvífica de Jesus Cristo, no hoje da história, fundamenta-se na Teologia do memorial.

Em sua Teologia do Ano Litúrgico, Bergamini diz que o Ano Litúrgico é Sacramento e, por isso, é memorial de Jesus Cristo agindo no nosso hoje. Considera-se assim que o Ano Litúrgico não é um calendário de celebrações, é a grande e única celebração de Jesus Cristo nas diferentes celebrações que a Igreja realiza no tempo. Jesus Cristo está presente nas ações litúrgicas da Igreja e continua agindo com a mesma eficácia salutar daquele tempo histórico, quando estava neste mundo, pela ação do Espírito Santo que ele mesmo enviou, como tinha prometido (Jo 14,16-17).

Outro liturgista italiano, Salvatore Marsili, teólogo beneditino, um dos principais protagonistas da reforma litúrgica do Vaticano II, nos anos 60, define o Ano Litúrgico como a ação salvífica de Jesus Cristo na história atual. Na prática, não difere em nada da definição de Aldo Bergamini, que foi aluno de Marsili. Num de seus artigos, na “Rivista Liturgica”, Marsili diz que o Ano Litúrgico é Jesus Cristo agindo no tempo e formando os cristãos para o momento histórico que se está vivendo. O enfoque de Marsili ilumina a ação salvífica de Jesus Cristo no tempo e destaca a atividade de Jesus Mestre. Destaca a dimensão pedagógica do Ano Litúrgico.

Se você ler os livros dos dois autores, não perceberá diferença na Teologia de Marsili e Bergamini. Mesmo assim, é interessante perceber a nuance que caracteriza o Ano Litúrgico como celebração do Mistério Pascal de Jesus Cristo e como pedagogia que introduz os celebrantes no Mistério Pascal de Jesus Cristo.

São enfoques confluentes quanto a ação de Cristo no Ano Litúrgico: a presença salvífica do Mistério Pascal em nosso hoje e sua dinâmica transformadora da história, em cada época e cultura. Na primeira definição, Bergamini ressalta o valor litúrgico-celebrativo do Ano Litúrgico acentuando a teologia do memorial. Marsili, por sua vez, destaca o Ano Litúrgico na dimensão salvífica e pedagógica, como tempo de formação do discipulado de Cristo. Ambas são visões importantes para compreender a formação espiritual na vida cristã a partir do Ano Litúrgico.

Serginho Valle

Novembro de 2020

 

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