23 de out. de 2021

Música sacra, música litúrgica

A música sacra é “parte integrante da solene liturgia”, e para tanto responde a alguns critérios fundamentais: a santidade — “será tanto mais santa, quanto mais estiver unida à ação litúrgica” — (SC 112).

Beleza 
“Não deveria haver na celebração uma música que não fosse uma verdadeira obra de arte” (Pio X).

Universalidade 
Ajudar os celebrantes de todas as culturas a se identificar na celebração através da música.

             Citei três critérios, que considero básicos na compreensão da música e para sua finalidade na Liturgia: santidade, beleza, identidade cultural. Existe um quarto critério que deve ser incluído, ao meu ver: a espiritualidade litúrgica.

            Dizer que a música é parte integrante da celebração litúrgica é considerar que a música faz parte da celebração juntamente com a palavra, com os gestos, com os sinais e símbolos. É dizer que a música não é um “opcional” da celebração e nem uma decoração. É dizer que a Liturgia celebra com palavras, gestos, música, espaços... Perceba que o termo usado é “juntamente com”, o que significa que, não é nem mais e nem menos importante; reforça dizer que a música faz parte e compõe a celebração. A música não é o elemento principal, embora seja, depois da palavra, o modo mais utilizado na comunicação litúrgica e aquela que tem a capacidade de dar um colorido especial e festivo à celebração.

            Considerando a Liturgia, do ponto de vista celebrativo e não ritual, não se pode pensar a celebração litúrgica sem a música, principalmente quando se considera que a música é rito, no que se denomina de música ritual. Tudo isso, faz-nos compreender duas coisas importantes: qualquer música não serve e, é imprópria a ideia de fazer uma folha de cantos que sirva para todas as Missas da comunidade. Por que? Primeiramente, porque cada celebração tem uma característica próprio, enfoque ou contexto diferentes, como dizemos em nossas propostas celebrativas do SAL – Serviço de Animação Litúrgica (www.liturgia.pro.br ). Mas tem um detalhe a mais, que precisamos atender.

            Uma vez que existem leituras diferentes nas celebrações, uma vez que não se faz a mesma homilia e nem as mesmas motivações nas Missas, uma vez que existem propostas simbólicas diferentes para cada Missa... entende-se que a música não pode ser um elemento estranho na celebração; a música é parte integrante daquela celebração como um todo e, como um todo colabora para a que a celebração seja uma unidade: palavras, símbolos, sinais, música e gestos celebrando o mesmo Mistério Pascal de Cristo, sempre iluminado por diferentes contextos.

            Outro dato que gostaria de chamar atenção, como parte integrante da Liturgia, é o fato que algumas músicas têm finalidade didática; ajudam os celebrantes a compreender o que estão celebrando. Exemplo: o canto de entrada “é o exórdio, a abertura solene da celebração; é a preparação dos fiéis” para a missa (...) “Este canto introduz os fiéis no mistério de comunhão com Cristo, desperta-os e os prepara para ouvir a Palavra de Deus e participar dignamente da Eucaristia” (CNBB, estudo 12, p. 12-13).

            Ainda na dimensão didática da música, podemos considerar a escolha da canção que irá acompanhar o rito da partilha, na Comunhão Eucarística dos celebrantes. É uma canção escolhida à luz da Palavra, especialmente com o Evangelho. Se o Evangelho, por exemplo, fala de caridade, a canção escolhida cantará a caridade na vida cristã; se o Evangelho fala de justiça, a canção da comunhão cantará a justiça do Reino. Entende-se que a canção escolhida tem o papel didático de unir o Evangelho à comunhão, comprometendo o celebrante a viver aquilo que ouviu e a vida divina que comunga na Eucaristia.

Aqueles três critérios, mais um, citados no início desse artigo — santidade, beleza, identidade cultural — tornam-se compreensíveis nos pontos referidos. Sendo a Liturgia a “ação sagrada (santa) por excelência na Igreja” (SC 7), entende-se que a música deve refletir poeticamente a santidade da Liturgia. Sendo a comunicação litúrgica composta basicamente pela linguagem artística, a música cantada na celebração deve resplandecer pela beleza da arte musical. Uma vez que a celebração acontece num contexto cultural próprio, a identidade musical deve ser refletida no modo de cantar e executar a música.

Serginho Valle
Setembro de 2021

 

 

 

 

9 de out. de 2021

Nem toda música é litúrgica

Nem todas as músicas servem para ser cantadas numa celebração litúrgica. Mesmo que mencionem Deus ou falem de amor ou, até mesmo tenham uma bela mensagem... nem toda música serve para a Liturgia. De modo mais aviltante, algumas celebrações matrimoniais, por exemplo, sem algum critério litúrgico, cantam músicas que são temas de um personagem de novela, ou cantam algum hit que está no sucesso do momento. A Liturgia não se rege pelo sucesso, mas pelo Mistério que celebra.

Não estamos discutindo a qualidade da música, mas a finalidade e a função da música na celebração litúrgica. Em algumas comunidades, infelizmente, encontramos o ministério da música cantando músicas bonitas, mas impróprias para a celebração da Missa. Com intenções ou finalidades que não correspondem ao Mistério celebrado, alguns músicos valorizam mais a música que a celebração. Este é um modo de desafinar, não a música, mas a celebração.

 

Cantar “A” celebração ou “NA” celebração

            Há alguns anos, apareceu uma música que fez sucesso em algumas assembleias litúrgicas: “Anjos de Deus”. Foi uma prova e tanto para o ministério de música das comunidades, pois foi possível verificar quem deles cantava “a” celebração e quem cantava “na” celebração. A distinção encontra-se no “a celebração” e “na celebração”.

Os primeiros, aqueles ministérios de música que “cantam a celebração”, analisaram a letra da canção evangélica “Anjos de Deus” e perceberam algumas contradições com a Teologia Litúrgica da Missa. Perceberam incompatibilidades de anjo que faz barulho e a necessidade de ouvir barulhos angelicais para abrir o coração e oferecer a oração a Deus. Uma canção, da autoria do Pastor Elizeu Gomes que, em 1996, depois de uma grande polêmica por direitos autorais e de gravação, afirmou à revista Veja que a música é do repertório evangélico e não católico.

Os segundos, aqueles ministérios de música que “cantam na celebração”, não viram problema em cantar esta música na Missa, inclusive na hora da comunhão. Não estudaram a canção; importaram-se mais com o agitado e gostoso ritmo da música e adotaram este critério para cantar a canção. Outros, se serviram do critério do sucesso que a canção fazia, embalada por Missas na TV, que “pretensamente” justificava cantar esta canção na celebração da Eucaristia.

Quem conhece a canção “Anjos de Deus”, e gosta de música ritmada, a classifica como uma música bonita e envolvente. Mas este não é o único critério litúrgico para que uma canção possa acompanhar um rito celebrativo, seja da Missa ou dos demais Sacramentos. No caso exemplar da música que estamos mencionando, quem conhece Liturgia entende que as celebrações não se caracterizam pelo barulho de anjos levando nossas preces ao Pai. Quem conduz nossas preces ao Pai é Jesus, nosso único mediador, como sempre concluímos as orações: “por Cristo, nosso Senhor, na unidade do Espírito Santo”.

É bom e necessário cantar músicas agradáveis em nossas celebrações, mas isso significa que qualquer música sirva para ser cantada na Liturgia.

Serginho Valle

Agosto de 2021

 

2 de out. de 2021

A música litúrgica em debate

Uma das questões mais debatidas em encontros formativos de Liturgia é a música. Tem de tudo um pouco. Desde comunidades com um excelente ministério de música, até comunidades onde um músico precisa salvar a pátria sozinho, caso contrário ninguém canta nas celebrações. Outra realidade é aquela de comunidades com grupos musicais que dominam e não aceitam sequer sugestões, seja de quem for. Existem comunidades com grupos musicais que pesquisam, fazem cursos e melhoram a olhos vistos aprendendo e se aprimorando na arte da música litúrgica. 

Por fim — para a lista não ficar longa demais — existem grupos de música que tocam nas igrejas como se estivessem num salão de festas, com som alto e com falta de critério na escolha das músicas. De outro lado, e felizmente, existem ministérios de músicos que fazem os celebrantes cantar, usam os instrumentos como acompanhamento e cantam com a arte que a comunicação litúrgica exige.

 

A música cantada pelos celebrantes

E os celebrantes? Também aqui temos de tudo um pouco. Comunidades onde ninguém abre a boca. Um grupo de músicos ou um coral canta por eles e eles limitam-se a escutar. Culpa de quem? Dos celebrantes que não querem cantar ou dos músicos que preferem cantar sozinhos? Depende! Não vou entrar no mérito desse fato.

Mas, tem também comunidades onde os celebrantes cantam e não se importam com ensaios para aprender canções novas. Existem comunidades onde só as mulheres cantam. Em outras, comunidades, o coral de mulheres e homens cantando é afinado a duas ou mais vozes, ou alterando, em modo dialogado: ora cantam as mulheres, ora os homens. Estas últimas, são comunidades que tratam a música litúrgica como arte e como oração. Na retaguarda de tais comunidades está um ministério da música que trabalha com amor e carinho para comunicar-se bem e ajudar a assembleia a rezar cantando.

 Como se canta a Liturgia

Por último, a questão de como se canta a Liturgia. Estou falando de cantar a Liturgia; não apenas cantar na celebração, mas cantar a Liturgia, cantar a celebração.

Em algumas Missas, grupos musicais e até ministérios de música não favorecem cantar a celebração, mesmo que sejam músicas conhecidas. Ou porque cantam alto demais, ou porque são desafinados ou porque introduzem variações que valorizam mais os instrumentos que as vozes.

Em outras missas, alguns corais ainda não compreenderam sua função ministerial na Missa como servidores dos celebrantes para cantar ritos ou acompanhar ritos com as canções. São grupos musicais e ministérios de música que fazem apresentações na Missa e transformam a música litúrgica em concerto sem a mínima chance de a assembleia participar da celebração cantando.

Mas, graças a Deus, temos também comunidades onde as celebrações, nas quais o modo de cantar é artístico e com muito bom gosto. Mais que cantar por cantar, nestas últimas comunidades se reza cantando e se canta louvando a Deus.

             Chamo atenção que distingo entre grupos de músicos e Ministério da Música. O grupo de músicos vai na Missa, toca, canta e vai embora. O Ministério da Música cultiva a Música Litúrgica, sua espiritualidade, sua arte e sua oração. Dedica-se à música litúrgica pelo estudo e pela partilha da arte musical nas celebrações.

Serginho Valle

Junho de 2021

 

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