Como
em todos os ritos litúrgicos, a Oração Eucarística também conta com expressões
corporais, feita com gestos e com posições do corpo. Expressões
comunicativas para favorecer quem preside a Oração Eucarística e, ao mesmo
tempo, mensagem para quem dela participa através do silêncio e, igualmente,
participante da comunicação gestual. Isto significa que, no processo
comunicativo da gestualidade, o presidente da celebração poderá estar
comunicando-se de modo orante ou, poderá promover ruídos, quando os gestos
perdem a força comunicativa por se tornarem mecânicos.
A
maior parte dos gestos, na Oração Eucarística, é realizada pelo presidente da
celebração. Todos são gestos orantes, como estar em pé, levantar os
braços, inclinar-se bater no peito (Oração Eucarística 1), fazer
genuflexão, apresentar e elevar ofertorialmente o Corpo e Sangue do Senhor... Deste
ponto de vista, o proclamador da Oração Eucarística reza com palavras e com
gestos; com gestos que correspondem às palavras e significados simbólicos, de
onde a necessidade do conhecimento da gestualidade litúrgica para uma boa e
eficiente comunicação litúrgica e celebrativa.
De pé
Iniciemos
com a posição gestual de estar de pé, tanto da parte de quem preside como dos
demais celebrantes. É o gesto mais utilizado na comunicação celebrativa e conta
com um significado muito rico, especialmente aplicado à Oração Eucarística.
O
sentido e o significado de estar de pé inspiram-se no livro do Apocalipse, onde
se lê: “Depois disso, vi uma grande
multidão que ninguém podia contar, de toda nação, tribo, povo e língua:
conservavam-se em pé diante do trono e diante do Cordeiro, de vestes
brancas e palmas na mão, e bradavam em alta voz: A salvação é obra de nosso
Deus, que está assentado no trono, e do Cordeiro.” (Ap 7,9-10).
O
texto indica que os celebrantes participam da mesma adoração prestada ao
Cordeiro vitorioso, com a diferença de os santos e santas estarem diante do
trono do Cordeiro e de nós, aqui na terra, estarmos diante do mesmo Cordeiro,
mas de modo sacramental. Também nós fomos revestidos com a veste branca, no dia
do Batismo, o que nos dá o direito de adorar o Cordeiro Pascal de pé e,
juntamente com toda a Igreja, aquela gloriosa (que está no céu) e Igreja militante
(nós na terra), cantar a santidade do Cordeiro vitorioso.
Além
disso, esse texto do Apocalipse descreve a posição natural de quem é
ressuscitado em Jesus Cristo e recebeu a veste branca da filiação divina. Diz o
texto do Apocalipse que eles estavam de pé, diante do Cordeiro, em
adoração. O estar de pé é, portanto, posição adorante, de onde ser estranho ao
contexto celebrativo da Oração Eucarística, ficar ajoelhado durante toda a
Oração Eucarística, embora tal possibilidade esteja prevista na IGMR 43 onde
isso for costume.
Ajoelhar-se
O
gesto de ajoelhar-se, realizado pelos celebrantes, no momento da consagração aparece,
na História da Liturgia Roma por volta do século XII, num tempo em que a
Eucaristia passou a ser considerada mais do ponto de vista devocional que memorial
celebrativo do Mistério Pascal de Jesus Cristo. Foi um tempo histórico, no qual
havia preocupação exagerada em ver o "milagre Eucarístico" e não
tanto em celebrar a Eucaristia como alimento para a vida humana, em Cristo.
Foi
nesta época, também, que se introduziu o toque da sineta para avisar o momento
de se ajoelhar diante do Santíssimo. Introduziu-se igualmente a apresentação
dos dons consagrados para serem adorados pelos celebrantes. Nenhum destes
gestos existe na Liturgia Eucarística Oriental.
A
reforma litúrgica (1963) cogitou e procurou reformular a gestualidade do
ajoelhar-se com a proposta de se ficar de pé no decorrer de toda a Oração
Eucarística, mas se preferiu continuar com o ajoelhar-se, de acordo com as
tradições de quase todos os povos da terra. A já citada IGMR 43 estabelece que
as Conferências Episcopais determinem a posição de ajoelhar durante a Oração
Eucarística, de acordo com a índole de cada povo.
Braços abertos
Dos
gestos presidenciais, o mais utilizado é a oração de braços abertos, um gesto
orante, vindo do modo hebreu de rezar e, presente na Liturgia Romana e igualmente
naquela Oriental.
A
Oração Eucarística é proclamada, da parte do padre que a preside, na sua maior
parte, com os braços abertos, em posição orante. Já tive oportunidade de
mencionar em outro texto que o gesto orante dos braços abertos tem o belo
significado de se apresentar totalmente livre, aberto e disponível diante de
Deus.
Quanto
ao gesto orante, na tradição litúrgica, este não se caracteriza como oferente,
ou seja, com as mãos estendidas para o alto, em posição de quem oferece alguma
coisa, mas com os braços erguidos ao longo do corpo e com as mãos espalmadas
para frente, deixando o peito aberto diante de Deus. Mas, o fato de rezar com
as mãos abertas em atitude orante não significa nenhum desvio litúrgico. Estou
apenas ressaltando a postura tradicional orante com os braços abertos.
Imposição das mãos
A
imposição das mãos é o gesto típico da invocação do Espírito Santo, caracterizado
no meio teológico litúrgico como gesto epiclético. O padre impõe as mãos
acompanhado de uma oração invocativa ao Espírito Santo, para que Deus envie seu
Espírito divino e consagre o pão e o vinho em Corpo e Sangue do
Senhor.
Apresentação do Corpo e Sangue
do Senhor
Um
dos gestos mais característicos da Oração Eucarística é a apresentação do
Sacramento do Corpo e Sangue do Senhor aos celebrantes. Uma prática, como
mencionado indiretamente no item sobre “ajoelhar-se”, introduzida na Liturgia
Eucarística a partir do século XII, fruto de um crescente devocionalismo para
com a Eucaristia.
Já
comentado em outra oportunidade, a IGMR 179 orienta a apresentar o Sacramento à
assembléia e não ostentar. O mesmo se lê na rubrica 91 da Oração Eucarística I:
“Hostiam consacratam ostendit populo”,
traduzido pela CNBB: “mostra ao povo a Hóstia
consagrada”. As rubricas propõe a apresentação simples e não se contempla o
erguer, o elevar o Pão e o Vinho consagrados, ou girando-o para todos os lados
da igreja e, menos ainda, o que pode ser qualificado como exagero, caminhar
pela igreja com o Corpo e Sangue do Senhor. A adoração ao Santíssimo, na
Eucaristia, é silenciosa em todos os sentidos, inclusive na gestualidade. A
elevação do Pão e do Vinho consagrados são considerados somente para o gesto
ofertorial, no “Per ipsum” como
orientado pela rubrica 100 do Missal Romano.
Genuflexão
A
genuflexão é um gesto presidencial, feito depois da consagração do pão e do
vinho. Já dediquei uma reflexão sobre este gesto tratando da “homenagem ao
Sacramento”. Na prática consta de um gesto de adoração diante do Senhor
sacramentado, verdadeiramente presente no Pão e no Vinho Eucaristizados,
consagrados, pela presença e pela ação do Espírito Santo.
Inclinar-se
A inclinação tem dois aspectos. O
primeiro deles é contextualizado no mesmo sentido e significado da genuflexão.
Isto é visível nas concelebrações: depois da consagração do Pão e do Vinho,
quem preside a Oração Eucarística faz genuflexão e os demais concelebrantes
fazem inclinação profunda, aquela inclinação feita com o corpo e não somente
com a cabeça.
O segundo aspecto encontra-se no
gesto de inclinar-se prescrito na Oração Eucarística I, mas não nas demais
Orações Eucarísticas. A inclinação acontece no “supplices te rogamus” — “nós vos suplicamos” —. A rubrica 96
instrui o presidente a unir as mãos e inclinar-se para suplicar que a oferta da
Igreja — o Corpo e o Sangue de Jesus Cristo — seja levada até a presença de
Deus Pai. Uma inclinação orante, podemos dizer.
Sinal da Cruz sobre si mesmo
Nesta mesma parte da Oração
Eucarística I, no “supplices te rogamus”, quem preside a Oração Eucarística
conclui este momento, erguendo-se da inclinação traçando o Sinal da Cruz sobre
si mesmo dizendo “sejamos repletos de
todas as graças e bênçãos do céu”. Um gesto que foi mantido pela reforma da
Liturgia (1963) com o sentido de que a participação na Eucaristia, comungando a
Eucaristia, como diz o texto, é fonte da bênção e da graça da Salvação.
Bater no peito
Outro gesto da Oração Eucarística I,
contemplado na rubrica 98, é o gesto de bater-se no peito. Acontece no momento
do “nobis quoque peccatoribus” — “e a
todos nós pecadores” —. É um gesto de humildade e de reconhecimento de ser
pecador diante de Deus e diante de todos os celebrantes.
Gesto ofertorial
Outro
gesto da Oração Eucarística, este na conclusão da mesma, é o gesto ofertorial,
quando o padre toma o Pão e o Vinho consagrados — Corpo e Sangue do Senhor — e,
como orienta a rubrica 100 (elevans) eleva, ergue e oferta os dons da Igreja ao Pai. É a oferta do sacrifício
da Igreja. É a Igreja ofertando ao Pai o próprio Corpo e Sangue de Jesus
Cristo, ao que a assembléia participa com o grande e solene amém.
O
rito que comumente se chama de “ofertório”, na Liturgia, é designado como “preparação
e apresentação das oferendas”. Ora, isso ajuda-nos a compreender que o
verdadeiro ofertório da Missa acontece na conclusão da Oração Eucarística,
quando, então sim, a oferta da Igreja, isto é, o próprio Jesus Cristo é
oferecido ao Pai, dizendo “Por Cristo,
com Cristo e em Cristo, a vós Deus Pai todo-poderoso, na unidade do Espírito
Santo, toda honra e toda glória, agora e para sempre. Amém”
Sergio Valle
2017