23 de jan. de 2021

Espiritualidade batismal e crismal na pastoral litúrgica

 

Do ponto de vista da espiritualidade, a Pastoral Litúrgica precisa atender para o momento único e decisivo na vida dos cristãos: o Batismo. É um momento decisivo que afeta a vida inteira. Hoje, existe o fato de se batizar crianças recém-nascidas, sem condição de tomar uma decisão existencial. Disto a decorrência de todo um processo catequético pós Batismo para favorecer a correspondência ao compromisso existencial assumido no Batismo. O meio pastoral para isso acontecer é pela catequese crismal.

Conhecemos as dificuldades existentes em nossas comunidades e, entre muitas, uma delas é o esquecimento da espiritualidade cristã na formação batismal e crismal daqueles que irão receber estes Sacramentos. Nem todos os ditos “cursos de preparação” e a denominada “Pastoral da Crisma” insistem na importância do crescimento da espiritualidade cristã e no compromisso existencial decorrentes do Batismo e da Crisma.

A Pastoral Litúrgica da comunidade, juntamente com a Pastoral da Catequese, é desafiada a refletir e encontrar meios pedagógicos para incrementar e valorizar a espiritualidade cristã naqueles que participarão das Liturgias do Batismo e da Crisma. O processo inicia-se na preparação dos pais e padrinhos e continua na formação pessoal, até quando aquele recém-nascido, que foi batizado sem condições de decidir, possa assumir conscientemente o compromisso cristão e acolher a proposta da espiritualidade do discipulado pela e na catequese crismal.

 

Formação pedagógica pelas celebrações

A formação necessária e a introdução na via da espiritualidade cristã podem contar com o recurso pastoral de celebrações litúrgicas, seja com as celebrações catecumenais, como com aquelas celebrações consideradas temáticas ou pedagógicas. Celebrações realizadas em contextos orantes para proporcionar experiência de oração litúrgica e incentive a caminhar na estrada da espiritualidade cristã.

Não é uma prática nova e nem novidade pastoral. Na Igreja antiga existiam várias celebrações, no decorrer do tempo catequético catecumenal, para preparar espiritualmente aqueles que iriam receber o Batismo e a Crisma. Nestas celebrações, através das homilias de bispos, padres e catequistas, dava-se atenção particular à espiritualidade que resultaria na vivência em Cristo, na vivência cristã da vida nova em Jesus Cristo.

Hoje, grande parte das comunidades, graças ao projeto pastoral com intenção de recuperar efetivamente o caminho do catecumenato, está adotando a prática formativa pelo caminho celebrativo litúrgico. Os frutos começam a aparecer seja no crescimento espiritual de adolescentes e jovens, seja no surgimento de novas lideranças comunitárias. Esta é uma atividade própria da Pastoral Litúrgica Paroquial.

Serginho Valle

Dezembro de 2020

 

16 de jan. de 2021

Datas móveis no Ano Litúrgico

 

Quando começamos a nos interessar e estudar Liturgia, uma das primeiras interrogações é sobre algumas datas litúrgicas, especialmente aquelas datas variáveis, como da Páscoa, Pentecostes, Corpus Christi, Sagrado Coração de Jesus. Tem também as datas de grandes solenidades e festas, como Natal e as celebrações de Nossa Senhora que são invariáveis; são datas fixas.

É evidente que a Igreja, no contexto do Ano Litúrgico, tem um critério para determinar o calendário das suas celebrações mais solenes e mais importantes, como é o caso da data da Páscoa, que é a celebração fonte de todas as celebrações litúrgicas cristãs.

A celebração do centro da vida cristã é a Páscoa que, por ser a celebração mais importante da Igreja e dos cristãos, é celebrada em três dias, o chamado Tríduo Pascal. São três dias com celebrações diferentes, mas celebrando o mesmo acontecimento: a Páscoa de Jesus Cristo; sua páscoa, sua passagem pela morte e sua Ressurreição.

Deste modo, na quinta-feira Santa, a Igreja celebra a Páscoa ritual, na sexta-feira Santa, celebra a Páscoa dolorosa e, no sábado Santo, a Páscoa gloriosa, em forma de vigília, que se conclui com a Missa do Domingo da Páscoa.

Uma característica para perceber que se trata da mesma Páscoa, em uma única celebração, é que as celebrações da Quinta-feira Santa e da Sexta-feira Santa não são concluídas com uma bênção e nem com o envio. A conclusão é feita com uma oração sobre o povo.

 

Data móvel da Páscoa

Mas, voltemos ao que interessa: a data móvel da Páscoa. A determinação da data da Páscoa não segue o calendário solar, como temos no ano civil, com início em 1º de janeiro e fim em 31 de dezembro. Segue sim o calendário lunar, que era o calendário usado pelos judeus. O livro do Êxodo (Ex 12) conta que os judeus saíram do Egito — fizeram a sua Páscoa — em uma noite de lua cheia, no primeiro mês da estação da Primavera; o mês se chama Nissan. A Páscoa dos judeus teria ocorrido em 14 de Nissan. O texto de Ex 12 explica como proceder para celebrar de modo memorial a Páscoa.

Ora, a Páscoa de Jesus, sua Paixão, Morte e Ressurreição aconteceu nos dias das celebrações pascais dos judeus. Isso originou aquilo que ficou conhecido na História da Liturgia como “Controvérsia Pascal”, que teve origem na segunda metade do século II. Este é um tema que sugiro para sua pesquisa pessoal.

O mês do calendário solar, grosso modo, tem 30 dias, ao passo que o calendário lunar tem 28 dias. Como diz o nome, é um calendário que marca as datas pelas fases da lua. Esta é uma herança que a Liturgia cristã herdou da Liturgia hebraica. Ou seja, ainda hoje, a data da Páscoa é estabelecida a partir do calendário lunar, mas com um detalhe: a Páscoa cristã sempre será celebrada no Domingo seguinte à primeira lua cheia da Primavera. Não da Primavera aqui no Brasil, mas na primavera da Europa.

Segundo as datas das narrativas evangélicas da Paixão, Morte e Ressurreição, Jesus morreu no início da Primavera, na primeira lua cheia do ano, quando era celebrada a Páscoa dos judeus. Esta tradição da data da Paixão, Morte e Ressurreição de Jesus é mantida até hoje. Como a lua cheia nunca cai no mesmo dia, as datas pascais nunca são celebradas numa data específica do ano. Por isso, a Páscoa obedece a uma data móvel.

A regra que estabeleceu a data da Páscoa cristã foi determinada pelo Concílio de Nicéia, no ano de 325. Desde então ficou estabelecido que a Páscoa cristã será celebrada no Domingo seguinte à primeira lua cheia da Primavera.

 

Datas móveis de outras celebrações

Em decorrência disso, as festas que estão ligadas à celebração da Páscoa, como Corpus Christi, que sempre é celebrada na segunda quinta-feira depois da Solenidade de Pentecostes — ou na primeira quinta-feira depois da Solenidade da Santíssima Trindade — nunca tem data fixa. O mesmo acontece com a Solenidade do Sagrado Coração de Jesus, celebrada na semana seguinte à Corpus Christi.

Serginho Valle

Janeiro de 2021

 

 

9 de jan. de 2021

Para que serve a Liturgia na comunidade?

 



No tempo que eu ministrava cursos de Liturgia em comunidades paroquiais, eu costumava iniciar com uma pergunta bem provocadora: para que serve a Liturgia na sua comunidade? Cada representante recebia um papel e deveria elencar a finalidade e a serventia da Liturgia na sua comunidade.

Depois de propor a pergunta, eu ficava observando as reações dos cursistas. Alguns abaixavam a cabeça, outros olhavam para o alto, alguns mordiam a tampa da caneta, outros coçavam a cabeça... As mesmas reações do aluno que foi pego de surpresa na prova; o aluno ou aluna não estudou aquele ponto da matéria e o professor foi perguntar justamente sobre aquele argumento que não havia estudado.

As reações dos cursistas eram sintomáticas, reveladoras de algo que se tornou habitual e, por isso, desnecessário encontrar algum motivo especial para ser questionada. Sempre foi assim, sempre existiu, então: por que eu preciso me questionar sobre a serventia ou finalidade da Liturgia na comunidade?

Voltando aos cursos, depois de breve silêncio, uma pergunta quase que se repetia em todas as comunidades, de norte a sul, de leste a oeste: quando o senhor fala de Liturgia está querendo dizer que é a Missa? Minha resposta era sempre a mesma: sim, pode ser! Outra pergunta: o terço conta? Repetia a mesma resposta: sim, pode ser. Outro dizia, as confissões e os casamentos contam? ... Eu respondia da mesma forma: sim, pode ser. Uma espécie de nervosismo tomava conta da sala e todos riam ou murmuravam algum desabafo.

Depois vinham as respostas. Uma grande parte das folhas com uma única reposta, e bem lacônica: a Liturgia serve para rezar. Outra resposta famosa era: a Missa na nossa comunidade é muito bonita. Uma terceira resposta, que lembro bem: a Liturgia serve nos reunir, rezar e cantar na igreja.

Estas respostas serviam como termômetro para o meu curso. Pelo teor das respostas eu podia avaliar o nível litúrgico da comunidade. Não posso esquecer de ter sido surpreendido em muitas comunidades com repostas que chamavam atenção, como por exemplo: serve para atrair pessoas para a quermesse ... serve para invocar milagres nas Missas de cura e libertação ... serve para nos emocionar diante de Deus.

De outro lado, em muitas comunidades, eu era positivamente surpreendido com respostas de uma caminhada de formação litúrgica bem adiantada. Graças a Deus, encontrei comunidades que estudavam Liturgia regularmente e, neste caso, as respostas sobre a utilidade da Liturgia na comunidade mostravam várias direções e — no contexto da pergunta — várias serventias para a comunidade. Respostas como: a Liturgia é a alma da nossa pastoral, é um momento adorante, tem uma finalidade pedagógica, a Liturgia serve para renovar o compromisso com o Evangelho, a Liturgia é a fonte da Igreja e das pastorais... Encontrei comunidades que tinham encontros formativos a cada três meses. Ali as repostas eram de outro nível, modeladas em tonalidades da Teologia Litúrgica, respostas que demonstravam o caminho de uma formação litúrgica.

Diante disso, você já pode compreender que eu sempre precisava ir preparado com, pelo menos, três níveis de cursos: um para iniciantes, que estavam no ponto morto, outro para quem já tinha uma noção e andava em terceira marcha, e outro, para quem já andava na quinta marcha.

 

Finalidade da Liturgia e Pastoral Litúrgica

A busca da finalidade da Liturgia na comunidade — o para que serve a Liturgia na comunidade? — é um questionamento fundamental para se ter um rumo, metas e estilo celebrativo na comunidade. E aqui, não estou me limitando à Missa, mas a tudo aquilo que respeita à Liturgia, seja sacramentos, sacramentais, piedade popular...

Para quem, na comunidade, se dedica à Pastoral Litúrgica, esta é a primeira questão que precisa ser colocada: para que serve a Liturgia na comunidade? A partir desta questão inicia-se o processo de busca de respostas pela reflexão, pelo estudo, pela oração, pela criatividade...

Se Equipe Litúrgica, que é a responsável pela Pastoral Litúrgica Paroquial não colocar esta questão – para que para serve a Liturgia na comunidade? – aquela Equipe Litúrgica Paroquial se limitará a fazer escalas de leitores e músicos para a Missa. Tudo continuará por muitos anos do mesmo modo com a tendência de se repetir uma das respostas que mais freia a criatividade litúrgica: “aqui sempre foi feito assim.”

Este “aqui sempre foi feito assim” virou dogma em muitas comunidades. Tornou-se uma verdade intocável, que ninguém pode mexer ou questionar. E desse modo, em vez de tornar a Liturgia um caminho de Emaús, a transformam em peça de museu.

 

Finalidade da Liturgia em várias dimensões

A resposta ao questionamento – para que serve a Liturgia na comunidade – deve ser procurada em diferentes dimensões, como por exemplo, a dimensão espiritual, a dimensão da formação cristã, a dimensão do discipulado...

A Equipe Litúrgica Paroquial não pode se limitar a fazer escalas de leitores porque para isso não precisa nem mesmo uma equipe; uma pessoa, como por exemplo, o secretário ou secretária da paróquia, faz como parte de suas atividades.

A Liturgia tem uma função fontal, de fonte, de coração da comunidade. É neste aspecto que os membros da Equipe da Pastoral Litúrgica Paroquial precisam focar sua atenção para perceber para que serve a Liturgia na comunidade.

Serginho Valle

Janeiro de 2021


2 de jan. de 2021

Espiritualidade vivencial no Batismo e na Crisma

A Liturgia é a fonte da espiritualidade cristã. Uma fonte que dessedenta a sede de vida com a graça e a luz do Espírito Santo. Uma fonte que não somente revigora a vida do celebrante, mas também compromete quem celebra a Liturgia com um estilo de vida proposto por Deus, especialmente presente no Evangelho.

As consequências na vida pessoal, que os Sacramentos do Batismo e da Crisma trazem, requer uma resposta de vida que seja de acordo com a graça (presença de Deus) na vida pessoal de cada cristão. É justamente essa resposta de vida que marca e caracteriza a espiritualidade litúrgica do Batismo e da Crisma. Viver a espiritualidade batismal e crismal é fazer memória, atualizando na vida cotidiana, a realidade da Páscoa de Cristo. Por este motivo, a espiritualidade batismal e crismal não se volta exclusivamente para o alto, pois tem como característica ser extremamente vivencial.

Na prática, estou dizendo que quem celebrou na própria vida a Liturgia batismal e crismal compromete-se para sempre por meio dessa celebração. Trata-se, portanto, de uma celebração que, de per se, exige a maturidade da opção, o que deverá ser reforçado na prática existencial que produz compromisso dos pais, no Batismo de crianças, nos adolescentes, jovens e adultos, na celebração da Crisma.

Se é no Evangelho que encontramos a fonte da espiritualidade litúrgica do Batismo e da Crisma, são as cartas apostólicas que se encarregam de demonstrar como a espiritualidade da celebração batismal e crismal traçam o perfil de vida para um celebrante (Cf. Cl 2,12 e 1Pd 3,21). São textos indicadores que a importância de viver a espiritualidade, que um dia foi celebrada na fonte batismal e na unção crismal, está em assumir o Batismo e a Crisma com a atitude de vida proposta por Jesus. Ou seja, trata-se de deixar o Espírito Santo de Deus, que em nós habita desde o dia do Batismo e confirmado na Crisma, aja e oriente o nosso viver em todo e em qualquer momento da vida.     Na prática, como demonstram vários textos das catequeses dos padres da Igreja, trata-se de recusar o pecado, recusar a lógica do mundo e assumir os valores do Reino de Deus, para ali agir como fermento na massa (Lc 13,21), como sal e luz no meio do mundo (Mt 5,13). Nisto está a prática concreta da espiritualidade batismal e crismal.

Juntamente com a importância de explicar o que significam e quais efeitos causam os Sacramentos do Batismo e da Confirmação na vida de quem os recebe, é importante traçar o estilo de vida que os dois Sacramentos exigem a quem é Batizado e Crismado.

Serginho Valle

Novembro de 2020

 

← Postagens mais recentes Postagens mais antigas → Página inicial