13 de jul. de 2024

A celebração como fonte e cume da missão evangelizadora

O conhecido arcebispo americano Fulton Sheen (1895 – 1979), que tive a alegria de ler no tempo do noviciado, dizia: “A primeira palavra de Jesus foi vinde, e a última foi ide. Ninguém pode ir sem antes ter sido chamado.” Este chamado, que pode acontecer de muitas formas e em qualquer lugar, é essencial para que a vida cristã caminhe na estrada de Jesus, no caminho do discipulado. A Liturgia desempenha papel importantíssimo no discernimento do chamado, atuando como fonte e como o ápice de todas as atividades da Igreja (SC 10). Se é de “todas as atividades da Igreja”, entende-se que a evangelização faz parte e, mais que isso, parte essencial para a missão da Igreja.

 Embora a liturgia não seja o único meio pelo qual o chamado se manifesta, ela é um espaço nutricional em termos de evangelização. Cada celebração litúrgica alimenta os celebrantes com a Palavra e os fortalece para se tornarem mais evangelizados e, consequentemente, mais preparados para testemunhar o Evangelho. Disto se deduz a essencialidade de que as celebrações sejam tanto evangelizadas quanto evangelizadoras.

 Papa Bento XVI, em discurso aos participantes da assembleia plenária do Pontifício Conselho para a Cultura, em 8 de março de 2008, destacou como o secularismo tenta retirar Deus do espaço social e, às vezes, até mesmo, tenta tirar Deus da própria Igreja. Esse fenômeno, dentro da Igreja, resulta em propostas celebrativas carentes de espiritualidade, que se assemelham a produtos religiosos consumíveis. É o que se vê em Missas marcadas pelo genitivo: Missa de Bênção, Missa de Cura, Missa disso ou daquilo... Toda Missa é bênção, é curativa, é libertadora... toda Missa é evangelizadora.

 Encontro com Jesus Cristo
Em um dado momento do Evangelho, os discípulos se aproximam de Jesus e dizem: “Todos te procuram” (Mc 1,37). É uma realidade que persiste em nossos tempos: uma multidão de pessoas continua procurando por Jesus, e cabe a nós apresentá-lo. Existem muitos modos de fazê-lo, como atividades pastorais, estudos bíblicos, propondo caminhos de espiritualidade, propondo e sugerindo práticas caridosas e atividade pastorais... Dentre todos esses modos, vale destacar a Pastoral DA Liturgia, como proponho em meu curso, do mesmo nome, no qual se considera a atividade evangelizadora da Liturgia em todas as celebrações litúrgicas, mas com especial atenção para as Missas Dominicais.

 Papa Paulo VI, na Evangelii Nuntiandi, enfatiza a necessidade contínua de a Igreja ser evangelizada. Novamente, gostaria de lembrar que uma das principais fontes de evangelização é a Liturgia, que cumpre este papel evangelizador celebrando, adorando e rezando. Iluminados pelo aprofundamento teológico e pastoral, entende-se que a evangelização não se trata apenas da comunicação de um conceito ou da apresentação de um livro, o Evangelho; evangelizar consiste em conduzir alguém e toda a comunidade ao encontro com Jesus Cristo. Na Liturgia, considerando a Pastoral DA Liturgia, isso ocorre servindo-se da pedagogia mistagógica que, nos meus cursos — Pastoral DA Liturgia e PLP (Pastoral Litúrgica Paroquial) — é apresentada com a dinâmica da semeadura: semeia sementes do Evangelho, cultiva, poda e colheita com atividades pastorais, ministeriais e carismáticas. É uma atividade simples, esta de propor celebrações evangelizadas e evangelizadoras? Não! Uma das causas é o analfabetismo religioso.

Analfabetismo religioso
Infelizmente, muitos batizados e batizadas vivem um analfabetismo religioso e, uma das consequências, é uma quase aproximação da religião com a magia. Muitos cristãos e cristãs, por exemplo, buscam proteção em “orações poderosas”, outros fundamentam sua fé unicamente em aparições e tem aqueles que vivem de um canto ao outro buscando milagres com a necessidade de visualizar feitos e fatos extraordinários. A Liturgia, servindo-se da pedagogia mistagógica, sempre propõe celebrações evangelizadas e evangelizadoras, educando a prática religiosa cristã de modo simples em vista do discipulado e purificando a religião de finalidades que não são próprias do Evangelho.

Sabemos que muitas pessoas reencontram o caminho religioso pela emoção, e isso é uma porta que jamais pode ser fechada; o emocionar-se diante da maravilha divina é inevitável. O encontro com o divino é, frequentemente, provocado pela emoção, e isso é prazeroso em termos de felicidade. Os salmos bíblicos, por exemplo, refletem a força emocional nas súplicas, agradecimentos e queixas. No entanto, é necessário avançar além da emoção em direção ao discipulado no cotidiano, nem sempre marcado por emoções. Para isso, a necessidade e, mais que necessário, a importância de não se pautar somente em celebrações emocionadas, mas celebrações evangelizadas e evangelizadoras.

 Lembro aqui a citação de Papa Francisco na Desidereio Desideravi:  “uma celebração que não evangeliza não é autêntica, tal como não o é um anúncio que não leve ao encontro com o Ressuscitado na celebração: ambos, por fim, sem o testemunho da caridade são como o bronze que soa e como o címbalo que retine (1Cor 13, 1)(DD 37). Celebrações litúrgicas que não parem na emoção, mas conduzam ao testemunho da caridade que, como dizia acima, se manifestam em pastorais, ministérios, carismas.

 Tudo certo que haja emoção nas celebrações litúrgicas. Penso que seja inevitável, como é o caso de um Matrimônio, de um Batizado, de celebrações exequiais..., mas este não é um fim celebrativo. Em situações de normalidade, penso nas Missas Dominicais, a Liturgia não pode ter um fim unicamente emotivo, realizada com gestos e frases típicas de um coach que anima um auditório... na medida certa, isso é saudável. Mas, pode tornar-se um problema se atividade litúrgica da PLP está finalizada a emocionar; isso só servirá para aumentar o analfabetismo religioso em forma de sino que badala: muito barulho e nada de atividade. O propósito da Pastoral DA Liturgia é semear sementes do Evangelho no terreno existencial de cada celebrante.

A Igreja é missão 

Outro elemento importantíssimo na relação entre Liturgia e evangelização é considerar a missão da Igreja. Para que a Igreja existe? Para que Jesus instituiu a Igreja? São João Paulo II, na Teologia da Redemptoris Missio, ensina que a Igreja não tem apenas uma missão evangelizadora, ela é missão. A Igreja é missão em sua identidade. Quer dizer, não existe Igreja sem missão. Neste sentido, a Igreja a Igreja existe se estiver em perene atividade evangelizadora. Onde a dinâmica evangelizadora é alimentada? Na Liturgia!  Como isso é alimentado na vida dos cristãos e cristãs? Com o alimento da Palavra e do Sacramento celebrados na Liturgia. Não somente, porque a Igreja não é somente Liturgia, diz a SC 9, mas permita-me ressaltar este aspecto no contexto da Pastoral DA Liturgia.

 Do ponto de vista da Pastoral DA Liturgia isso significa que cada celebração deve levar cada celebrante a questionar sua participação na atividade missionária e evangelizadora da Igreja. Não apenas emocionar os celebrantes com o Evangelho, embora a emoção seja necessária, mas celebrar de tal modo que a celebração desinstale os celebrantes de suas comodidades para assumir, em pessoa, o compromisso evangelizador.

 A Liturgia desempenha um papel importantíssimo nesse contexto nos dias atuais. É com celebrações evangelizadas e evangelizadoras, o que significa celebrações que adotam a pedagogia mistagógica, que os celebrantes são comprometidos e envolvidos profundamente no anúncio do Evangelho, como ocorreu com os discípulos de Emaús. Quer dizer, os celebrantes, em cada celebração evangelizada e evangelizadora, são constituídos como missionários e missionárias para testemunhar a ressurreição de Jesus.

 Alegria e evangelização 
A alegria é um componente indispensável da evangelização. Lembro de uma frase das minhas leituras do tempo de estudante de Filosofia, de Pierre Teilhard de Chardin, grande pensador jesuíta, que dizia: “a alegria é o sinal mais infalível da presença de Deus.” Quem vive com Deus e caminha com Jesus é uma pessoa feliz. O Evangelho é fonte de alegria e evangelizar com alegria é algo natural e fundamental. Esta alegria deve também estar presente e ser bebida em nossas celebrações litúrgicas. Isto acontece com celebrações bem preparadas e liturgicamente celebradas. O como fazer isso, pode ser encontrado no meu curso de Pastoral DA Liturgia.

 Como tenho proposto em outras publicações, a alegria na Liturgia não se traduz em adotar linguagens que não sejam apropriadas para a celebração. Do ponto de vista psicológico, a alegria pode se manifestar de diversas formas, inclusive chorar de alegria. Durante as celebrações, a alegria se expressa através da paz interior, uma paz própria de quem está na presença de Deus. É com essa alegria que, no envio de cada celebração, o celebrante é enviado para viver o que celebrou pela vivência alegremente autêntica do Evangelho.

 Voltando à frase inspiradora na abertura do artigo — de Dom Fulton Sheen: “A primeira palavra de Jesus foi vinde, e a última foi ide. Ninguém pode ir sem antes ter sido chamado” — entendo que a Liturgia é exerce a atividade de chamar e de enviar. E, para isso, servem celebrações evangelizadas e evangelizadoras.

Serginho Valle 
Julho de 2024

 

PS — Para saber mais sobre os meus cursos acesse:

Pastoral DA Liturgia — https://lp.liturgia.pro.br/pastoral-da-liturgia

PLP – Pastoral Litúrgica Paroquial — https://lp.liturgia.pro.br/plp1

 

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