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pedindo desculpas pelo título: genérico demais. É assunto para uma enciclopédia
litúrgica, dada a dimensão de textos, tratados e considerações teológicas sobre
a ação do Espírito Santo na Liturgia.
Meu
professor de Liturgia Oriental, Padre Daniel Gelsi, um dos professores mais
sábios que tive na vida, definia a ação do Espírito Santo na Liturgia com a
imagem de um “corifeu”. Quem é o corifeu? Os dicionários descrevem o corifeu
como o regente do coro nas
tragédias gregas; a pessoa que aconselha, fomenta ou incita o personagem a
assumir uma atitude diante de um momento da vida. A figura e a atividade do
corifeu facilitam nossa compreensão sobre a atividade do Espírito Santo, nas
celebrações litúrgicas. É o Espírito Santo quem conduz a celebração, que
garante a veracidade do culto celebrativo e, através da Liturgia, “aconselha”,
no sentido que inspira cada celebrante a sintonizar sua vida com o ato
celebrativo do qual participa em vista de viver aquilo que celebra e celebrar o
que vive.
É
do conhecimento de todos o axioma da Teologia Litúrgica: sem o Espírito Santo
não existe Liturgia. É uma verdade. De onde a interrogação sobre a veracidade
de muitas celebrações litúrgicas, especialmente aquelas Eucarísticas, feitas de
modo improvisado, sem invocar a ação do Espírito Santo (epíclesis) em Orações
Eucarísticas, proclamadas ao gosto e aos sentimentos do padre e não da Igreja,
com improvisações nem sempre felizes.
Mas,
não é somente na Oração Eucarística que o Espírito Santo age, na ação
celebrativa. Uma das fórmulas de acolhimento celebrativo confessa a “comunhão
do Espírito Santo” na totalidade do momento celebrativo: “a graça de Nosso
Senhor Jesus Cristo, o amor do Pai e a comunhão do Espírito Santo.” Compreende-se
a assembléia litúrgica não como “platéia”, mas o “corpo de místico de Cristo”
que congrega os celebrantes num culto “em Espírito e Verdade”, ou seja, no
Espírito Santo de Deus e na Verdade, que é Jesus.
Também
a Liturgia da Palavra acontece pela e na ação do Espírito Santo, enquanto
inspirador para acolher e compreender a Palavra divina na vida de cada
celebrante. Na Liturgia da Palavra, o Espírito Santo atualiza a Palavra para o
hoje da comunidade, para o hoje da vida de cada celebrante. Por isso, é
importante que a Palavra seja bem proclamada, como é muito importante que a
comunidade e cada celebrante se disponha a acolher a Palavra divina em sua
vida, oferecendo condições para que o Espírito Santo possa agir na vida
pessoal. Ainda na Liturgia da Palavra, é preciso compreender que a homilia
também é feita (deveria) na ação do Espírito Santo. Mas, isto não significa
improvisação — como se o Espírito Santo mantivesse uma linha direta com o padre,
no momento da homilia —. A homilia é fruto da ação do Espírito Santo que se faz
presente no modo como o homiliasta prepara a homilia, deixando que a Palavra
fale em sua vida no decorrer da semana, por exemplo, não somente do ponto de
vista teórico, mas também vivencial. Por ser um momento de atualização na vida
da comunidade e de cada celebrante, nenhum homiliasta tenha a pretensão de
considerar-se apenas bom comunicador; é preciso que se considere mais que isso,
se considere um facilitador do Espírito Santo agindo na vida dos celebrantes.
Um
dos momentos mais solenes da ação do Espírito Santo acontece pela atividade
“epiclética” da Igreja. Epíclesis é uma palavra de origem grega, que significa
invocação. Esta acontece de modo especial na proclamação da Oração Eucarística,
quando a Igreja invoca o Espírito Santo duas vezes e para duas finalidades
diferentes. Na primeira, invoca o Espírito Santo para consagrar os dons do pão
e do vinho em Corpo e Sangue do Senhor e, na segunda invocação epiclética —
esta sem a imposição das mãos —, para que a Igreja de Cristo seja congregada
num só Corpo e num só Espírito. Por se tratar da invocação do Espírito divino,
a Oração Eucarística acontece no mais profundo e total silêncio. Por ser
momento especial e único do Espírito Santo, uma vez que o silêncio é o local da
manifestação do Espírito divino, qualquer fundo musical, por exemplo, é
intromissão indevida e de muito mal gosto, do ponto de vista da actio
liturgicae.
Nos
demais sacramentos também existe o rito epiclético, pelo qual se invoca o
Espírito Santo, com o gesto da imposição das mãos sacerdotais. Assim acontece na
Unção dos Enfermos, na absolvição dos pecados, na ordenação sacerdotal, na
bênção matrimonial, no Batismo e na Crisma. Todos os sacramentos invocam o
Espírito Santo e conferem o Espírito de Deus aos celebrantes. Por isso, quando
comungamos a Eucaristia, comungamos também o Espírito Santo de Deus, quando
fomos batizados, fomos mergulhados no Espírito Santo; na Crisma, fomos
confirmados no Espírito Santo. Na Unção dos Enfermos e na Penitência somos
fortalecidos e perdoados pela ação do Espírito Santo. No Matrimônio, invoca-se
o Espírito Santo para que o casal, impregnados do amor (caridade) divino
“permaneçam fiéis na aliança conjugal”. Não existe sacramento sem a presença
atuante do Espírito Santo.
A
Igreja conserva o costume da imposição das mãos sacerdotais para invocar o
Espírito Santo e como gesto de transmissão do Espírito Santo. Outra
característica que revela a ação do Espírito Santo no momento celebrativo é o
silêncio. O silêncio é o espaço onde se move o Espírito Santo. Por isso, a
Liturgia da Palavra (em todas as celebrações) acontece no silêncio, não somente
para ouvir a Palavra, mas para que o Espírito Santo possa agir no coração de
cada celebrante. Isto torna estranho no uso de folhetos, com os celebrantes distraindo-se
(barulho mental) com a leitura pessoal, em vez de ouvir silenciosamente a
proclamação da Palavra, além da já referida desastrosa invasão de fundos
musicais na consagração Eucarística. O mesmo se diga em momentos silenciosos da
celebração que são invadidos por orações (inclusive pela secreta do sacerdote,
por exemplo, da antes da comunhão). Silêncio tolhido por músicas ou mensagens
ou, pior que isso, pelos avisos paroquiais depois da comunhão, quando se silencia
para se orar no Espírito e para permitir ao Espírito orar silenciosamente
dentro do comungante.
Inconcebível,
do ponto de vista teológico-litúrgico, é fazer a imposição das mãos na Unção
dos Enfermos com palavras ou orações suplicando curas. Exceto no Sacramento da
Penitência, toda imposição das mãos é silenciosa. Muitas celebrações extra-sacramentais,
como noites de louvor, com ênfase na invocação do Espírito Santo são
barulhentas demais e correm o risco de confundir reações emocionais com
acolhimento ou ação do Espírito Santo. O que vale para a Liturgia vale para as
celebrações da Palavra, Adoração, Vigílias, louvores...
Uma
questão igualmente importante é refletir os “sinais” da ação do Espírito Santo
na comunidade, como fruto das celebrações litúrgicas. Não milagres, curas ou
coisas do gênero, como muito se difunde, quase reduzindo a isso a eficácia do
Espírito Santo. Penso nos sinais do crescimento fraterno, no interesse de uns
pelos outros, na preocupação em atender os que se sentem colocados à margem, na
importância que a comunidade dá aos doentes... é no amor fraterno que o
Espírito Santo reflete na comunidade aquilo que foi celebrado na Liturgia. O
Espírito Santo é impedido de agir onde existe indiferença para com o projeto
divino e apatia fraterna para com os necessitados. “O mundo é incapaz de
receber” o Espírito Santo, diz Jesus (Jo 14,17) porque está indiferente a Deus
e é vesgo aos precisados de socorro. Se nas celebrações da comunidade acontece
a atuação do Espírito divino e este mesmo Espírito não tem condições de motivar
atitudes cristãs, então é preciso celebrar com mais silêncio para se ouvir e
perceber com mais atenção a ação do Espírito Santo. A alegria celebrativa não
se encontra nos exageros de canções, de súplicas ou na multiplicação de gestos,
mas no acolhimento do Espírito Santo de Deus.
Serginho Valle
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