O conhecido arcebispo americano
Fulton Sheen (1895 – 1979), que tive a
alegria de ler no tempo do noviciado, dizia: “A primeira palavra de Jesus
foi vinde, e a última foi ide. Ninguém pode ir sem antes ter sido chamado.”
Este chamado, que pode acontecer de muitas formas e em qualquer lugar, é
essencial para que a vida cristã caminhe na estrada de Jesus, no caminho do
discipulado. A Liturgia desempenha papel importantíssimo no discernimento do
chamado, atuando como fonte e como o ápice de todas as atividades da Igreja (SC 10). Se é de “todas as atividades da
Igreja”, entende-se que a evangelização faz parte e, mais que isso, parte
essencial para a missão da Igreja.
Embora a liturgia não seja o único
meio pelo qual o chamado se manifesta, ela é um espaço nutricional em termos de
evangelização. Cada celebração litúrgica alimenta os celebrantes com a Palavra e
os fortalece para se tornarem mais evangelizados e, consequentemente, mais
preparados para testemunhar o Evangelho. Disto se deduz a essencialidade de que
as celebrações sejam tanto evangelizadas quanto evangelizadoras.
Papa Bento XVI, em discurso aos
participantes da assembleia plenária do Pontifício Conselho para a Cultura, em
8 de março de 2008, destacou como o secularismo tenta retirar Deus do espaço
social e, às vezes, até mesmo, tenta tirar Deus da própria Igreja. Esse
fenômeno, dentro da Igreja, resulta em propostas celebrativas carentes de
espiritualidade, que se assemelham a produtos religiosos consumíveis. É o que
se vê em Missas marcadas pelo genitivo: Missa de Bênção, Missa de Cura, Missa
disso ou daquilo... Toda Missa é bênção, é curativa, é libertadora... toda
Missa é evangelizadora.
Encontro com Jesus Cristo
Em um dado momento do Evangelho,
os discípulos se aproximam de Jesus e dizem: “Todos te procuram” (Mc 1,37). É uma realidade que persiste em
nossos tempos: uma multidão de pessoas continua procurando por Jesus, e cabe a
nós apresentá-lo. Existem muitos modos de fazê-lo, como atividades pastorais,
estudos bíblicos, propondo caminhos de espiritualidade, propondo e sugerindo práticas
caridosas e atividade pastorais... Dentre todos esses modos, vale destacar a Pastoral DA Liturgia, como proponho em meu curso, do mesmo
nome, no qual se considera a atividade evangelizadora da Liturgia em todas as
celebrações litúrgicas, mas com especial atenção para as Missas Dominicais.
Papa Paulo VI, na Evangelii
Nuntiandi, enfatiza a necessidade contínua de a Igreja ser evangelizada. Novamente,
gostaria de lembrar que uma das principais fontes de evangelização é a Liturgia,
que cumpre este papel evangelizador celebrando, adorando e rezando. Iluminados
pelo aprofundamento teológico e pastoral, entende-se que a evangelização não se
trata apenas da comunicação de um conceito ou da apresentação de um livro, o
Evangelho; evangelizar consiste em conduzir alguém e toda a comunidade ao
encontro com Jesus Cristo. Na Liturgia, considerando a Pastoral DA Liturgia, isso ocorre servindo-se da pedagogia
mistagógica que, nos meus cursos — Pastoral DA Liturgia e PLP (Pastoral Litúrgica Paroquial) — é apresentada com
a dinâmica da semeadura: semeia sementes do Evangelho, cultiva, poda e colheita
com atividades pastorais, ministeriais e carismáticas. É uma atividade simples,
esta de propor celebrações evangelizadas e evangelizadoras? Não! Uma das causas
é o analfabetismo religioso.
Analfabetismo religioso
Infelizmente, muitos batizados e
batizadas vivem um analfabetismo religioso e, uma das consequências, é uma
quase aproximação da religião com a magia. Muitos cristãos e cristãs, por
exemplo, buscam proteção em “orações poderosas”, outros fundamentam sua fé
unicamente em aparições e tem aqueles que vivem de um canto ao outro buscando
milagres com a necessidade de visualizar feitos e fatos extraordinários. A Liturgia,
servindo-se da pedagogia mistagógica, sempre propõe celebrações evangelizadas e
evangelizadoras, educando a prática religiosa cristã de modo simples em vista
do discipulado e purificando a religião de finalidades que não são próprias do
Evangelho.
Sabemos que muitas pessoas
reencontram o caminho religioso pela emoção, e isso é uma porta que jamais pode
ser fechada; o emocionar-se diante da maravilha divina é inevitável. O encontro
com o divino é, frequentemente, provocado pela emoção, e isso é prazeroso em
termos de felicidade. Os salmos bíblicos, por exemplo, refletem a força
emocional nas súplicas, agradecimentos e queixas. No entanto, é necessário
avançar além da emoção em direção ao discipulado no cotidiano, nem sempre
marcado por emoções. Para isso, a necessidade e, mais que necessário, a
importância de não se pautar somente em celebrações emocionadas, mas celebrações
evangelizadas e evangelizadoras.
Lembro aqui a citação de Papa
Francisco na Desidereio Desideravi: “uma
celebração que não evangeliza não é autêntica, tal como não o é um anúncio que
não leve ao encontro com o Ressuscitado na celebração: ambos, por fim, sem o
testemunho da caridade são como o bronze que soa e como o címbalo que retine (1Cor 13, 1)” (DD 37). Celebrações litúrgicas que não parem na emoção, mas
conduzam ao testemunho da caridade que, como dizia acima, se manifestam em pastorais,
ministérios, carismas.
Tudo certo que haja emoção nas
celebrações litúrgicas. Penso que seja inevitável, como é o caso de um
Matrimônio, de um Batizado, de celebrações exequiais..., mas este não é um fim
celebrativo. Em situações de normalidade, penso nas Missas Dominicais, a
Liturgia não pode ter um fim unicamente emotivo, realizada com gestos e frases
típicas de um coach que anima um auditório... na medida certa, isso é saudável.
Mas, pode tornar-se um problema se atividade litúrgica da PLP está finalizada a
emocionar; isso só servirá para aumentar o analfabetismo religioso em forma de sino
que badala: muito barulho e nada de atividade. O propósito da Pastoral DA Liturgia é semear sementes do Evangelho no
terreno existencial de cada celebrante.
A Igreja é missão
Outro elemento importantíssimo na
relação entre Liturgia e evangelização é considerar a missão da Igreja. Para
que a Igreja existe? Para que Jesus instituiu a Igreja? São João Paulo II, na
Teologia da Redemptoris Missio, ensina que a Igreja não tem apenas uma missão
evangelizadora, ela é missão. A Igreja é missão em sua identidade. Quer dizer,
não existe Igreja sem missão. Neste sentido, a Igreja a Igreja existe se
estiver em perene atividade evangelizadora. Onde a dinâmica evangelizadora é
alimentada? Na Liturgia! Como isso é
alimentado na vida dos cristãos e cristãs? Com o alimento da Palavra e do
Sacramento celebrados na Liturgia. Não somente, porque a Igreja não é somente
Liturgia, diz a SC 9, mas permita-me ressaltar este aspecto no contexto da Pastoral DA Liturgia.
Do ponto de vista da Pastoral DA Liturgia isso significa que cada celebração deve
levar cada celebrante a questionar sua participação na atividade missionária e
evangelizadora da Igreja. Não apenas emocionar os celebrantes com o Evangelho,
embora a emoção seja necessária, mas celebrar de tal modo que a celebração
desinstale os celebrantes de suas comodidades para assumir, em pessoa, o
compromisso evangelizador.
A Liturgia desempenha um papel importantíssimo
nesse contexto nos dias atuais. É com celebrações evangelizadas e
evangelizadoras, o que significa celebrações que adotam a pedagogia
mistagógica, que os celebrantes são comprometidos e envolvidos profundamente no
anúncio do Evangelho, como ocorreu com os discípulos de Emaús. Quer dizer, os
celebrantes, em cada celebração evangelizada e evangelizadora, são constituídos
como missionários e missionárias para testemunhar a ressurreição de Jesus.
Alegria e evangelização
A alegria é um componente
indispensável da evangelização. Lembro de uma frase das minhas leituras do
tempo de estudante de Filosofia, de Pierre
Teilhard de Chardin, grande pensador jesuíta, que dizia: “a alegria é o
sinal mais infalível da presença de Deus.” Quem vive com Deus e caminha com
Jesus é uma pessoa feliz. O Evangelho é fonte de alegria e evangelizar com
alegria é algo natural e fundamental. Esta alegria deve também estar presente e
ser bebida em nossas celebrações litúrgicas. Isto acontece com celebrações bem
preparadas e liturgicamente celebradas. O como fazer isso, pode ser encontrado
no meu curso de Pastoral DA Liturgia.
Como tenho proposto em outras
publicações, a alegria na Liturgia não se traduz em adotar linguagens que não
sejam apropriadas para a celebração. Do ponto de vista psicológico, a alegria
pode se manifestar de diversas formas, inclusive chorar de alegria. Durante as
celebrações, a alegria se expressa através da paz interior, uma paz própria de
quem está na presença de Deus. É com essa alegria que, no envio de cada
celebração, o celebrante é enviado para viver o que celebrou pela vivência
alegremente autêntica do Evangelho.
Voltando à frase inspiradora na
abertura do artigo — de Dom Fulton Sheen: “A primeira palavra de Jesus foi
vinde, e a última foi ide. Ninguém pode ir sem antes ter sido chamado” —
entendo que a Liturgia é exerce a atividade de chamar e de enviar. E, para
isso, servem celebrações evangelizadas e evangelizadoras.
Serginho Valle
Julho de 2024
PS — Para saber mais sobre
os meus cursos acesse:
Pastoral
DA Liturgia — https://lp.liturgia.pro.br/pastoral-da-liturgia
PLP – Pastoral Litúrgica
Paroquial — https://lp.liturgia.pro.br/plp1
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