O semiólogo italiano Umberto Eco escreveu
um livro chamado “Opera aperta” (“Obra aberta”). Eco explica que alguns
processos de comunicação são obras abertas, quer dizer, fontes de mensagens com
interpretações diversas. É o que acontece com a linguagem artística. Um quadro,
uma escultura, uma foto, por exemplo, têm significados diferentes, promove
reações diferentes dependendo do contexto, da cultura, do tempo e do estado
emocional de quando se entra em contato com a obra de arte. É uma obra aberta; não
fechada numa única interpretação.
É
exatamente isso que acontece com a Liturgia; com a linguagem litúrgica, mais
especificamente. Cada celebração é diferente da anterior e diferente da
vindoura. É única. A proeza de transformar uma celebração igual à outra é
própria da miopia de quem vê a realidade da vida sempre igual, de quem parou no
tempo, de quem não entrou na dinâmica do Reino, que é semelhante ao fermento
jogado na massa para levedá-la. A celebração litúrgica sempre tem algo
diferente a dizer, sempre tem um significado novo a se contemplar, sempre é uma
experiência nova e renovadora; é uma “Obra aberta”.
Por se tratar de linguagem
simbólica, repleta de ritos, de significantes que promove significados, a
celebração litúrgica nunca se esgota e nem envelhece no tempo. Mas, o modo de
celebrar, especialmente se houver carência espiritual, favorecerá a monotonia e
a monocromia de olhar a realidade existencial da comunidade sem as luzes da
Palavra e os desafios do Reino. São casos típicos de celebrações
caricaturizadas, aquelas realizadas pela leitura de formulários ou de folhetos,
distantes da vida.
Quando assim
acontece em celebrações Eucarísticas de comunidades, não é de estranhar que a
Igreja fique vazia, como em tempo da Covid 19. Mas, isto tem um motivo a ser
considerado. Faço um exemplo típico. Tenho observado a transformação da
Liturgia como “obra aberta” em “obra monótona” e “obra monocromática” na
celebração da Liturgia da Horas. Não poucas vezes, ouço padres, religiosos e
religiosas, e muitos seminaristas reclamando da monotonia da Liturgia das
Horas. Transformaram a celebração comunitária ou individual em leitura. E,
quando se lê sempre a mesma coisa, é claro que isso vira monotonia; deixa de
ser “obra aberta”, que interroga a vida, que desafia a ascese do cultivo de
virtudes e impede o crescimento espiritual e místico na escola e na fonte da
oração litúrgica.
A dificuldade de
usar a linguagem litúrgica para se comunicar na celebração e com a celebração tem
várias origens, mas a principal delas, ao meu ver, é a ausência ou carência do
hábito da Lectio Divina na preparação das celebrações. Tantos de padres como de
equipes de celebrações. Quando não modelamos nosso olhar para ver a realidade
da história com a luz da Palavra, especialmente com a luz do Evangelho, então,
pouco a pouco, a vida torna-se monocromática e as celebrações monótonas.
Serginho
Valle
Junho
de 2020
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