16 de set. de 2015

Compromisso concreto da celebração

            O título completo desta reflexão deveria ser: “o compromisso concreto como conseqüência de cada celebração litúrgica, especialmente da Missa”. Por isso, o título acima está abreviado como “compromisso concreto da celebração”. Um título que reponde à questão: como a Eucaristia favorece o caminho do discipulado?
            Quem usa as propostas celebrativas do SAL – Serviço de Animação Litúrgica – está acostumado com uma sugestão que denominamos de “compromisso concreto”. Trata-se de uma proposta de vivência iluminada na celebração de cada Domingo. Uma proposta de vivência concreta inspirada na Palavra da celebração, especialmente no Evangelho, que pode ser de caráter pessoal, comunitário, espiritual, familiar, pastoral... Por ser concreto, vem com matizes de praticidade, como por exemplo, realizar alguma atividade ou obra de misericórdia, ou com matizes de crescimento na espiritualidade, ou com alguma proposta de atividade pastoral em vista do bem da comunidade etc...  tenha o matiz que tiver, sempre se sintoniza com a pedagogia do crescimento no discipulado a partir da Palavra, da celebração em sua totalidade e do contexto social no qual a Liturgia é celebrada. De onde vem isso?
            O Documento 43 da CNBB — “Animação da Vida Litúrgica no Brasil” (1989) —, a partir do n. 64 apresenta seis dimensões da Liturgia: memorial, glorificação da Trindade, ação de graças, súplica de intercessão, pedido de perdão e compromisso. Quanto à dimensão do compromisso, o Documento 43 diz:

Quando se tem consciência de que pecar é condição da humanidade toda, de que a unidade de todos os homens e mulheres é obra do Espírito Santo, e de que a glória de Deus é a realização de seu povo também na História, é fácil compreender que a Liturgia, além da conversão pessoal, comporta um compromisso social. O Reino de Deus que se realiza onde Deus reina por sua graça, também se explicita no pão de cada dia, na convivência fraternal e nos anseios de libertação de todo o mal. A Liturgia não nos convida apenas para ouvirmos falar do Reino, mas para nos impelir e animar a construí-lo.” (Doc 43, 72-73).

            O compromisso concreto, no Documento 43 da CNBB, do ponto de vista teológico e espiritual, tem um caráter reparador, não no sentido de “consertar” os estragos do pecado no contexto comunitário, mas de reparar, de colaborar com o Espírito Santo para refazer o novo. Lembremos que é o Espírito Santo aquele que “renova a face da terra”, como cantamos nos hinos pascais de Pentecostes. A celebração, sempre no contexto do Documento 43, envia para o compromisso de colaborar com Deus, para que os valores do Reino aconteçam na história da sociedade, através da fraternidade, da convivência solidária, da libertação do mal. Um compromisso, portanto, que tem a ver principalmente com o projeto divino do Reino de Deus. Este é um modo de entender que a celebração não acaba na igreja, mas continua na vida. Quem fez experiência de Deus celebrando a Liturgia age conforme o projeto divino, de modo prático no concreto da vida comunitária e social.
            Quando trato deste tema, gosto de fundamentá-lo na passagem evangélica de Lc 10,25-37. Um Doutor da Lei se levanta e pergunta a Jesus: “quem é o meu próximo?” Jesus responde com a parábola do “Bom Samaritano”. Chamo atenção para a conclusão de Jesus, que responde ao Doutor da Lei nestes termos: “vai e faze tu também o mesmo” (Lc 10,37). Sempre dizia em minhas aulas, cursos e palestras que considero esta frase de Jesus o modo mais adequado para o envio de toda celebração litúrgica, especialmente da Missa. Depois de ouvir a Palavra, depois de partilhar a Palavra na homilia, depois de celebrar a fração do Pão e do Vinho, o celebrante deveria ouvir, no momento do envio: agora você deve fazer o mesmo que celebramos aqui dentro. Esta é, aliás, uma compreensão do desejo de “celebrar a vida”. Celebra-se aquilo que se vive e vive-se aquilo que é celebrado.
            Este fundamento bíblico torna-se ainda mais profundo se consideramos o contexto da Última Ceia, quando a Eucaristia é instituída e iluminada pelo gesto do lava-pés (Jo 13,5). De um lado, o recado que a celebração litúrgica sempre encerra um forte apelo ao serviço. De outro lado, os mesmos joelhos que se dobram em adoração a Jesus sacramentando, também se dobram para servir; “Jesus ajoelhou-se e começou a lavar os pés de seus discípulos”. A exemplo da conclusão da parábola do Bom Samaritano, Jesus conclui o gesto propondo seu compromisso concreto: “vocês viram o que eu fiz ... façam o mesmo” (Jo 13,14; Lc 10,37).
            A celebração litúrgica, em todos os sacramentos, especialmente a Eucaristia, em certo sentido, nos coloca na posição de quem interroga Deus sobre como devemos agir, como devemos viver concretamente aquilo que celebramos. Sua Palavra orienta como agir e a homilia atualiza a Palavra para a realidade concreta do agir no contexto social da comunidade. Cada celebração é, igualmente, um “ver” como Deus e como Jesus agem, para depois de ver, refletir, rezar e celebrar, viver e agir concretamente do mesmo modo. É desta forma que a celebração litúrgica vai modelando o coração dos celebrantes, não apenas como devotos ou orantes (que também é um efeito concreto), mas como discípulos e discípulas que agem e vivem como o Mestre.
            Diante de tais considerações, fica claro que a Equipe de Celebração, juntamente com a homilia do padre e com o ministério da música, precisam estar afinados para facilitar uma proposta concreta e vivencial em cada celebração.  
(Serginho Valle)


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