Quem
acompanha a caminhada de seminaristas sabe que a conclusão do curso de
Teologia, em muitos casos, é marcada pela procura e compra dos paramentos. Já
presenciei ansiedade exagerada em seminaristas às vésperas de ordenação, preocupados
com a compra de seus paramentos. Agitação compreensível, até certo ponto,
marcada pela alegria que a proximidade da ordenação provoca em quem vê no
sacerdócio a realização de sua vida.
Depois
de tantos anos trabalhando em seminário maior, é possível prever o estilo do
paramento de cada um. O modo de entender a Igreja, a visão teológica e o
conceito de Liturgia são refletidos no modo como o padre (e o futuro sacerdote)
paramenta-se para presidir as celebrações litúrgicas. Pelo modo de paramentar-se,
inclusive, é possível compreender o estilo comunicativo da presidência
celebrativa. Não existe nada de novo nisso; a Psicologia social, o estudo
antropológico e cultural do vestuário dedica páginas e páginas explicando que a
personalidade de cada povo, e de indivíduos, manifesta-se pelo modo como se
veste. Não seria diferente para o padre; ele reflete seu modo de celebrar também
pela paramentação.
Os
paramentos são um meio comunicativo da celebração, que tem a ver com comunicação
corporal; o corpo paramentado comunica. O modo como o padre se paramenta para
celebrar é uma mensagem comunicativa corporal, estética e cultural. Dizem os
estudiosos da moda, que a pessoa é um corpo vestido para uma finalidade
específica: trabalho, esporte, festa, andar na rua... Do ponto de vista
estético, a veste revela o conceito de beleza que a pessoa cultiva; é reflexo
da sua estética. Do ponto de vista cultural, a veste simboliza a cultura de um
povo ou de uma instituição, como é o caso da Igreja. A cultura litúrgica da
Igreja Católica usa os paramentos para celebrar sua Liturgia e não para fazer
shows, por exemplo; paramenta-se para celebrações e não para participar de um
protesto social.
Por
isso o bom gosto ou o desleixo revelam também o cuidado ou o descuido para com
a celebração. Revela o carinho, a atenção para com a celebração e, mais que
isso, o respeito para com os celebrantes. Um padre ou diácono que se paramenta
de modo desmazelado para assistir a um Matrimônio, por exemplo, comunica seu
pouco caso para com a celebração e seu desrespeito para com os noivos e convidados.
Modelos
e estilos
Em
se tratando de paramentação, a gente vê quase de tudo. Tem aqueles coloridos
que parecem carros alegóricos, aqueles com imagens de Nossa Senhora e de santos
estampados em casulas, os que inventam símbolos e sinais pessoais ou
relacionados a alguma atividade pastoral, como o bordado de um chapéu
sertanejo... Símbolos e sinais estranhos à cultura, ao simbolismo Bíblico e
Litúrgico. Entre aquela casula que se aproxima do estilo de um macacão de
piloto da Formula 1, pelo excesso de informação, e uma que destaca a beleza
pela sobriedade, a Liturgia tende e orienta sua escolha para a segunda, aquela
sóbria.
A
Liturgia tem sua parte de culpa nessa dificuldade de entender a cultura do
vestuário litúrgico. No decorrer da história, a Liturgia chamou os melhores
arquitetos, os melhores pintores e escultores, mas só vi, até hoje, uma
participação com profissionais da arte têxtil e da costura debatendo as
vestes litúrgicas. Foi no tempo que estudava Liturgia em Roma. Na época
(1998, se não me falha a memória) foi organizada em Milão uma exposição para
que grandes nomes da arte do vestuário (que normalmente resume-se com o termo
“moda”) expusessem propostas de casulas, a partir dos conceitos Bíblicos e
Litúrgicos da Eucaristia. Professores de faculdades, pesquisadores e
profissionais que atuam nesta área fizeram suas propostas. Os professores que
nos acompanharam na visita à exposição chamaram nossa atenção para a
simplicidade e a sobriedade da maior parte das peças. Casulas que se distinguem
pela simplicidade e sobriedade.
Hoje,
promovem-se exposições de paramentos em feiras para vender, não com a
finalidade de um debate sobre a comunicação corporal pela paramentação. Tenho
visitado algumas dessas exposições, entro em algumas lojas de paramentos de vez
em quando e, o que vejo, além do preço salgado, é um certo descuido com a arte
litúrgica da paramentação. Não estou propondo o fechamento das empresas de
confecção litúrgica, mas, um debate com estudos, pesquisas e propostas sobre
este importante meio de comunicação litúrgica. É um assunto importante,
porque onde não existe indicativos de caminhos a seguir, cada um faz o que quer
e, neste caso, gosto se discute sim, porque se está lidando com a Liturgia, que
ultrapassa o conceito pessoal, por se tratar de uma cultura que é da Igreja, de
todo povo de Deus.
Serginho Valle
Junho 2018
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