Pregações apocalípticas e medo

Já tive oportunidade de refletir neste espaço sobre a escolha evangelizadora que privilegia ameaças e medo nas pregações. Refiro-me a pregadores que, na falta de argumentos consistentes, preferem apelar para castigos e anúncios destruidores que acontecerão no final dos tempos. Tais pregadores seguem a lei do menor esforço: em vez de anunciar um Evangelho — uma boa notícia — e o compromisso que este traz consigo, anunciam o medo, o que pode transformar-se em “má notícia”. Configuram kerigma, alegre anúncio de uma boa nova, a ameaças de destruições apocalípticas, no sentido dado ao termo em nossos dias. Em vez de incentivarem a confiança, insistem no medo da destruição. Um desserviço ao Evangelho.
            Estes pregadores seguem o caminho mais fácil porque é cômodo profetizar ameaças e destruição. Agem na base do “avisei; se não quiserem me ouvir, não venham reclamar depois”. Adotam a atitude de quem se coloca num patamar acima de seus ouvintes. Pessoas mais simples e com poucas referências para interrogá-lo aceitam sua pregação e, de um modo ou de outro, tornam-se dependentes do medo e do pregador. Quem questiona o teor de suas pregações, é classificado de incrédulo e, por não acreditar no que ouve, está destinado à condenação eterna.
De um modo ou outro, os pregadores apocalípticos se consideram donos da verdade, com suas interpretações literais negam a eclesiologia de  Igreja Povo de Deus, peregrina nas estradas da vida e construtora de um mundo melhor, como Deus  propõe. Para essa gente, quase tudo se transforma em castigo de Deus: a fome, a seca, a miséria... e, em apenas poucas ocasiões são consideradas como causas de injustiça social. São pregadores que não leram o Evangelho em sua totalidade e, por este motivo, não compreenderam o projeto de Deus. Eles se contentaram, apenas, com os últimos capítulos.
            Como é possível verificar nos últimos Domingos do Tempo Comum e nos dois primeiros Domingos do Advento, a Liturgia tem um modo sereno e esperançoso de celebrar a Salvação que se realizará na 2a vinda do Senhor. Não descarta o fim de todas as coisas, mas sem, por isso, assumir posição alarmista, como dos pregadores que anunciam desgraças. Uma reflexão séria e serena da 2a vinda do Senhor não espanta, ao contrário, vê como normal que a natureza e toda a criação desmanchem-se diante da glória divina, a qual deverá brilhar para sempre diante de nossos olhos. Nada de ameaças, como fazem os profetas do pessimismo. A Liturgia celebra e proclama esperança e confiança naquele dia que o Senhor voltará e nós o veremos em poder e glória.
Serginho Valle
Dezembro 2018


O valor da Palavra de Deus na Liturgia

O texto de Ne 8,2-10 é um texto base para a Pastoral Litúrgica, especialmente para quem atua no Ministério da Palavra. Um tema decorrente deste texto é a importância da Palavra de Deus na celebração e na assembléia litúrgica. Iluminando-se neste texto, vou considerar quarto temas relativos à importância da Palavra de Deus na celebração Eucarística e nas celebrações dos demais Sacramentos.
É útil considerar igualmente como a assembléia respeita a Palavra de Deus: se tem os olhos voltados para os leitores ou, se é uma assembléia cabisbaixa, cada qual concentrado em seu folheto, ou em seu livrete ou, em tempos atuais, em seus celulares com aplicativos da “Missa do Dia” para ler a Palavra individualmente em vez de dedicar-se a ouvir comunitariamente a Palavra.  

Dignidade do leitor
             Não é qualquer um que pode subir a um lugar mais elevado — ambão — para proclamar a Palavra de Deus na assembléia. O texto de Neemias trata o leitor como alguém especial, escolhido do meio do povo, elegido por vocação de ter intimidade com a Palavra de Deus. Nada, portanto, de “pastoral do laço”, realizada pelos (i)responsáveis da Missa que vão “laçar” leitores e salmistas 10 ou 5 minutos antes de a Missa começar. Nada de depender da “boa vontade” de quem veio à missa e é convidado, sem tempo de preparar-se previamente, para assumir um ministério na assembléia litúrgica.
            Sim, porque não se trata somente de ler uma leitura ou fazer leitura de um texto Bíblico. Existe um a necessidade de algum envolvimento, de alguma intimidade, nem que tenha sido uma espécie de conversa com a Palavra que será proclamada. Leitor que não se prepara, comparando à parábola do semeador, é um semeador semeando sem sementes, por não ter a Palavra dentro de si.

Espaço especial para proclamar a Palavra
Esdras sobe num estrado, num lugar mais elevado, especial para proclamar a Palavra. Jesus, no relato da sinagoga de Nazaré (Lc 4,14-21) levanta-se e toma o “livro”. A proclamação da Palavra de Deus merece um lugar especial, destinado unicamente a ela, o ambão. Tempos houve, que alguém levantava-se no meio da assembléia e, sem microfone, aos gritos, ia lendo uma leitura e depois a outra. Este é um aspecto que, graças a Deus, já está superado.
Outro aspecto é considerar — e aqui sempre é útil e necessário insistir — que o ambão é o local da Palavra de Deus, não é lugar para comentários, avisos ou promoções do dízimo, da quermesse... O ambão é um local especial, sagrado, de onde Deus fala a seu povo pela voz do leitor e do diácono ao proclamar o Evangelho.

Um livro aberto diante do povo
O que dizer do livro que é aberto diante do povo e do livro que Jesus toma em mãos, qual símbolo da Palavra de Deus que se abre diante dos celebrantes? Em ambas as situações, a importância que a Bíblia dá ao livro; seja ao Lecionário como, particular e especialmente, ao Evangeliário.
Por isso, o que dizer de tantas comunidades usando folhetos descartáveis ou livretes para proclamar a Palavra de Deus? Alguns apressados se contentam em defender a proclamação da Palavra usando folhetos pelo conteúdo; é a mesma leitura escrita no livro. Não tem dúvida; é a mesma leitura. No contexto ritual litúrgico, contudo, não se trata apenas de equivalência de conteúdo, mas de dignidade simbólica. E neste caso, considerando que a Liturgia é linguagem simbólica, proclamar leituras e Evangelho de folhetos é aberração e ruído comunicativo.

Os olhos fixos em Jesus
Por fim, a atitude dos celebrantes, que tinham os olhos voltados para os leitores, no texto de Neemias, e os “olhos fixos em Jesus”, na sinagoga de Nazaré. As Equipes de Celebrações, juntamente com o Ministério do Leitorato podem se interrogar para onde os celebrantes dirigem seus olhares? É triste considerar que uma assembléia litúrgica senta-se para ouvir a Palavra comunitariamente e que, quase que por automação, abaixa os olhos para se ocupar individualmente com seu folheto ou com seu livreto e, como dizia, atualmente, com seu smarphone.
Serginho Valle

Novembro de 2018

Ministério do leitorato e espiritualidade

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