18 de jan. de 2020

Pastoral Litúrgica Paroquial e casamentos


Na maior parte das comunidades, a “indústria dos casamentos” tomou conta das celebrações e ocupa o lugar da Pastoral Litúrgica Paroquial (PLP). Existe todo um comércio que gira em torno das celebrações de casamentos, incluindo a Liturgia. Comércio de olho no vestuário dos noivos, padrinhos e madrinhas, na preparação da festa e, no caso da Liturgia, nos ritos da celebração matrimonial. No que se refere a este último aspecto, a “indústria dos casamentos” assume a função que deveria ser da equipe (ou equipes) de celebrações matrimoniais. Tornou-se uma espécie de “equipe celebrativa terceirizada”. Vou considerar somente o Rito Matrimonial fora da Missa.


            O ingresso da “indústria dos casamentos” na Liturgia começou com a ornamentação, entrou com tudo pela música e, agora, chega aos ritos, com um novo personagem: o cerimonialista. Na Liturgia, temos o cerimoniário, no casamento, o cerimonialista.
            O cerimonialista se apresenta bem vestido e age discretamente, com precisão e classe. Inicia sua atividade na porta da igreja como recepcionista e organizador da procissão de entrada — de várias procissões, algumas das quais semelhantes a desfiles. Em termos celebrativos, exerce a atividade do ministério da acolhida, dedicando atenção especial aos noivos, aos pais dos noivos e aos padrinhos e madrinhas. Procura acalmar os noivos, se necessário, garantindo que tudo acontecerá como preparado.
            Munido de um discreto fone de ouvido e um microfone de lapela, comunica-se com os músicos e com outros atores da celebração, como fotógrafos e cinegrafistas, preparando-os antecipadamente para cada momento e cada rito. Se o cerimoniário atua vistosamente diante da assembleia, no presbitério, o cerimonialista não aparece. Fala baixo no microfone para pedir que os músicos iniciem as canções, alerta o pessoal da imagem (fotógrafo e cinegrafistas) para algum detalhe do rito. Não interfere no padre (ao menos por enquanto), mas no movimento que acontece ao redor da celebração.

Dois sentimentos
            Tenho dois sentimentos diante desse cenário. O primeiro é de admiração porque existe neste desenrolar de ritos todo um exercício de criatividade e de organização celebrativa. Preciso admitir que a “indústria dos casamentos” percebeu que o rito da celebração matrimonial é simples, como é característico da nossa Liturgia, e por isso era necessário introduzir ali o sentimento e a emoção. O rito descrito no Ritual do Matrimônio precisava ganhar vida e isto significou um exercício de criatividade.
            O exercício da criatividade está na decoração do espaço celebrativo, na qualidade artística dos músicos e dos cantores, na discrição do cerimonialista, na introdução de gestualidades. Um dia, um padre me confessou que, na sua paróquia tem uma “empresa que faz casamentos” (nas palavras dele) que, quando atuam, até ele se sente motivado a celebrar melhor para não fazer feio, tal a qualidade com que preparam e conduzem a celebração. Este é o meu primeiro sentimento: admiração com certa dose de santa inveja: por que nossas comunidades não poderiam exercer este ministério com a mesma qualidade e competência?
            Meu segundo sentimento, como liturgista, é de tristeza. Fico triste porque este cenário é indicativo claro da falta de uma PLP. Quem deveria realizar toda esta celebração, e com igual qualidade e competência, deveria ser uma equipe celebrativa (ou várias) designada pela Equipe Litúrgica que coordena a PLP.
Seria uma equipe grande, é verdade, constituída por músicos, ornamentadores, cerimonialista... Uma ou várias equipes de celebração capaz de preparar os noivos para não apenas serem atores na celebração, mas protagonistas. O Rito do Matrimônio proposto pela CNBB, em 1991, tem a finalidade de criar esta participação e comunhão celebrativa litúrgica dos noivos, da família e da comunidade. Não saberia dizer se o rito foi bem acolhido e nem mesmo se é celebrado com certa frequência.

Formação
            Hoje, na situação que chegamos, na maior parte das nossas comunidades, impedir que o pessoal da “indústria dos casamentos” atue é comprar briga. Por isso, em vez do litígio, os coordenadores da PLP poderiam encontrar meios de ajudá-los a celebrar liturgicamente. Refiro-me a um projeto formativo direcionado a esse pessoal.
            A maior parte deles não conhece Liturgia, por isso não se preocupa com o conteúdo. A preocupação é com a encenação, com a beleza do espaço celebrativo, da música, da gestualidade dos ritos. Já fazem bem isso, portanto, o projeto formativo para esse pessoal precisa ser pensado a partir do conteúdo. E, neste caso, estou dizendo que o departamento formativo da PLP pode criar um roteiro formativo de cunho teológico, litúrgico e ritual, por exemplo.
            Outro roteiro formativo, poderá ser focado em grupos específicos. Com os ornamentadores, a formação contará com o conteúdo litúrgico do espaço celebrativo, indicando, desde coisas bem simples, como por exemplo, não fazer do altar uma prateleira de flores, até elementos que fundamentam a Teologia do espaço celebrativo. Claro que isso não deveria ser feito num único dia. Outro exemplo, seria ajudar os músicos a entender como a música litúrgica se comunica na celebração e quais critérios são adotados na escolha de músicas para cada rito, além de outros temas. Conheço uma comunidade que realizou este processo formativo tão bem, que os músicos profissionais não só começaram a participar de um ministério da música, como também se responsabilizaram pela formação de outros músicos.
            Formação importante, e em certos casos, importantíssima, deve ser proposta aos fotógrafos e cinegrafistas, para ajuda-los a realizar o seu trabalho de modo discreto e sem invadir espaços rituais, prejudicando (e enervando) o padre, por exemplo.

Diálogo
            Pela formação, dialogando com essa gente, existe a possibilidade de um enriquecimento mútuo. É um trabalho que vai colocar a PLP em contato com pessoas de outras Igrejas, em contato com pessoas que vêm à igreja só para exercer este trabalho. Por isso, não se trata, somente, de um trabalho organizativo, mas também evangelizador e de crescimento espiritual. Quando se conversa com o pessoal da “indústria do casamento” ouve-se dois assuntos: as queixas que padres (alguns) e o pessoal da Igreja não é acessível para conversar e, a queixa que fazem como fazem porque nunca foram instruídos.
            É um diálogo que pode ser muito proveitoso, porque a PLP vai conversar com pessoas que trazem experiências, queixas, propostas e, em muitos casos, buscando esclarecimentos sobre como agir no desenvolvimento do Rito Matrimonial.
            É um diálogo que não pode ser feito com argumentos do “eu acho bonito” ou do “sempre foi feito assim”. É um diálogo que prima pela qualidade da celebração litúrgica matrimonial, que se caracteriza não somente pela beleza ritual, mas que a beleza ritual realce a beleza espiritual de um casal que é abençoado para iniciar uma nova família. Uma celebração que não seja somente para ser vista, mas vendo-a, torne-se capaz de questionar especialmente a vida dos casais presentes. Celebração evangelizadora, portanto, capaz de tocar a vida.
Serginho Valle
Janeiro de 2020


← Postagem mais recente Postagem mais antiga → Página inicial

0 comentários:

Postar um comentário

Participe. Deixe seu comentário aqui.