O
itinerário quaresmal do Ano B propõe o quarto encontro: o encontro com Jesus
Cristo, o Mestre. Em outras reflexões, considerei o encontro consigo mesmo
(1DQ-B), o encontro com Deus (2DQ-B) e o encontro com o culto (3DQ-B); culto
como modo de entrar em contato com Deus, em privado e comunitariamente, na
oração pessoal e nas celebrações.
O encontro com Jesus, no 4º Domingo
da Quaresma B, convida cada pessoa a se colocar no lugar de Nicodemos,
assumindo o papel do discípulo: ir ao encontro do Mestre, colocar-se diante
dele e silenciar para ouvir seu ensinamento. O encontro com Jesus, portanto, inicia-se
com a decisão de ir procurar o Mestre, escutar o Mestre e silenciar diante do
Mestre. Em tal contexto, minha proposta não considera a exegese do texto, mas o
movimento existencial de quem se dispõe entrar no caminho da conversão indo ao
encontro de Jesus para torná-lo Mestre de sua vida.
Ir
ao encontro do Mestre
O encontro com Jesus, na qualidade
de Mestre, é uma decisão estritamente pessoal. Claro que este encontro tem seus
precedentes, como o conhecimento do Mestre, a admiração, o vínculo de simpatia
com o modo de viver e de pensar do Mestre, ou, pode ser, até mesmo, a
curiosidade para conhecê-lo melhor. Todas são motivações humanas que favorecem
o ir ao encontro do Mestre.
“À
noite, Nicodemos foi se encontrar com Jesus e lhe disse: Rabi, sabemos que
viestes como Mestre da parte de Deus, pois ninguém é capaz de fazer os sinais
que fazes se Deus não está com ele” (Jo 3,2). Este versículo não é
contemplado na pericope evangélica da Liturgia do 3DQ-B, mas faz parte do
contexto do Evangelho proclamado no 3DQ-B, por isso é importante tê-lo presente
para não se perder de vista a motivação de Nicodemos que, em última instância,
deveria ser a finalidade de todo celebrante disposto a converter-se ao
Evangelho: ir ao encontro de Jesus para encontrar-se com o Mestre que veio da
parte de Deus. Esta é uma motivação importantíssima no processo da conversão
quaresmal: encontrar-se com Jesus, para que ele seja Mestre da vida pessoal. Jesus
mesmo confirma o grau deste encontro quando diz: “não chameis a ninguém de Mestre, porque um só é vosso Mestre” (Mt
23,8).
Existe uma condição para se procurar
Jesus como Mestre: a fé. Não a fé como crença, desta que consiste em acreditar
(se convencer) na divindade de Jesus, mas a fé como experiência de quem vê os
sinais feitos por Jesus, quem ouve seus ensinamentos e de quem, como Nicodemos,
deduz que somente alguém que vem de Deus pode realizar as obras que Jesus
realiza.
Colocar-se
diante de Jesus para ouvir
Nicodemos vai ao encontro de Jesus
com o propósito de ouvi-lo, de escutar seu ensinamento. Esta é a atitude típica
do discípulo e da discípula: ouvir o Mestre. Para isso, o discípulo e discípula
partem do pressuposto que o Mestre entende a vida, que o Mestre tem uma visão
particular e peculiar da vida, uma visão existencial, com a qual vale a pena
empenhar a própria existência.
No processo do discipulado, o
colocar-se diante do Mestre exige a atitude de ouvir, e essa atitude nem sempre
é confortável, especialmente em nossos dias. O ouvir, neste caso, indica
colocar toda a atenção naquilo que o Mestre diz. Não somente no sentido de
prestar atenção no ensinamento para compreendê-lo, mas no sentido de assimilar
o ensinamento do Mestre para desapegar-se do modo pessoal de pensar em vista de
assimilar existencialmente o ensinamento do Mestre.
Os
primeiros místicos do cristianismo denominam tal dinâmica com o termo
“ruminatio”. A ruminação é um processo digestivo de muitos animais para
transformar o alimento em energia vital. Este é o significado do colocar-se
diante do Mestre para ouvir, escutar o que diz e deixar que o ensinamento do
Mestre rumine no coração e se transforme em energia espiritual; em modo de
viver. Transforme-se em comportamento.
Silenciar
diante do Mestre
Por fim, um terceiro aspecto, decorrente
do anterior: a necessidade do silêncio para ouvir. É o silenciar diante de
Jesus para ser capaz de conversar com Jesus sobre questões existenciais. À
medida que Jesus vai propondo seu ensinamento, Nicodemos ouve, silencia e
interroga; coloca questionamentos a partir de sua experiência existencial.
O encontro com Jesus é um encontro
de diálogo, mas o protagonismo do diálogo é dado ao Mestre, dada a Jesus, a ele
que é a prova concreta do amor de Deus pelo mundo. Quando se dá o protagonismo
ao Mestre, quando se silencia para ouvir o Mestre Jesus, então se entra na dinâmica
de vida eterna, de vida plena. Vida eterna, vida plena porque é vida de Deus
vivendo na vida humana.
Concluindo
Nos encontros quaresmais, o encontro
com Jesus Mestre é o convite para converter-se de todas as propostas de vida
feitas pelos mais diferentes “mestres” que nos rodeiam. Uma proposta de
conversão para encontrar-se com o único Mestre que propõe a vida plena, que
conduz à vida eterna.
Serginho Valle
Março 2018
0 comentários:
Postar um comentário
Participe. Deixe seu comentário aqui.