17 de mar. de 2018

Quaresma e seus encontros – encontro com a Cruz

A reflexão dos Domingos quaresmais, do Ano B, iluminando-se no Evangelho dominical, inspirou-se na dinâmica do encontro. Assim, considerei o encontro consigo mesmo (1DQ-B), o encontro com Deus (2DQ-B), o encontro com o culto (3DQ-B) e o encontro com o Mestre (4DQ-B). A conclusão acontece no encontro com a Cruz, celebrada no 5º Domingo da Quaresma – B.
            O 2º Domingo da Quaresma, quando lê o Evangelho da Transfiguração de Jesus, mantém uma relação com a Cruz, no contexto da Teologia quaresmal. Trata-se, naquele Domingo, da preparação espiritual e psicológica dos discípulos para o momento da desfiguração de Jesus, que aconteceria na Cruz. Agora, a proposta dirige-se mais especificamente para o sentido, o significado ou, se se preferir, a finalidade e o resultado da Cruz de Jesus. A Cruz, neste 5DQ-B, é considerada do ponto de vista Teológico; Teologia no sentido etimológico do termo: o “logos” de Deus, a Palavra de Deus, a mensagem divina para a vida humana.

A glorificação de Jesus
            Logo depois de receber a notícia que os gregos queriam conhecê-lo, Jesus reage anunciando o momento da sua glorificação. Desvia o foco dos gregos para a sua Páscoa — sua passagem — pela Cruz. A glorificação de Jesus consiste na realização plena da vontade do Pai e, logo em seguida, Jesus explica em que consiste a glorificação divina: em doar a vida, comparando-a a um grão de trigo. É o que acontece na Cruz; a Cruz é o local da glorificação de Jesus.
            A glorificação, portanto, é a primeira consequência da Cruz. Nela, o Pai é plenamente glorificado pelo sacrifício da vida de Jesus; por Jesus ter transformado sua vida em oferenda para a redenção do mundo. A confirmação acontece pela voz divina: “eu o glorifiquei e o glorificarei de novo!” (Jo 12,28). Neste sentido, encontrar-se com a Cruz de Jesus é contemplar a glória divina, que se manifesta na realização plena da vontade do Pai por Jesus. A Cruz deixa de ser um objeto repugnante, que desvia o olhar; ao contrário, é objeto que atrai o olhar da humanidade.

Grão de trigo
            O segundo aspecto do encontro com a Cruz convida a considerar o processo da fertilidade vital no grão de trigo. Nele encontra-se escondida a vida, não só a vida que produz a espiga, ma a vida alimentada pelo pão, pelo alimento que nutre e possibilita a vida de continuar viva e vivente. Para isso acontecer, é preciso passar pela morte.
            Encontrar-se com a Cruz de Jesus é compreender o processo da geração da vida divina para o bem da vida humana. Um processo marcado pelo amor, manifestado na doação da vida para alimentar a vida humana com a própria vida divina. É o oferecimento daquilo que Deus tem de mais valioso: a sua própria vida. Para isso, a necessidade de passar pela morte com uma passagem (Páscoa) capaz de destruir a própria morte, para que a morte não tenha nenhum poder sobre a vida humana.
            Na Cruz, o poder da morte é expulso do mundo e, como dito, atrai os olhares de toda a humanidade, profetizado pelo próprio Jesus: “quando for elevado, atrairei todos a mim” (Jo 12,32). Olhar no sentido de perceber e entender que nela se encontra a fonte da vida plena, de onde brota a vida divina, no sangue — símbolo da vida — que jorra do lado aberto do Coração de Jesus. Temos, assim, a Cruz de Jesus como fonte da vida plena que jorra do lado aberto do Transpassado.
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Cruz é serviço
            Por fim, um terceiro aspecto do encontro com a Cruz de Jesus é o serviço caracterizado como entrega da vida. O ensinamento de Jesus é muito claro a este propósito: o apego à vida produz a perda da vida; a entrega da vida é o caminho da realização existencial. O apego à vida é incapacidade de produzir frutos, a entrega da vida é a capacidade para que os frutos apareçam em abundância. Que assume a sua cruz e segue Jesus entra na dinâmica do serviço e descobre que o segredo da vida consiste em oferecer a vida. Quanto mais a vida é ofertada, tanto mais a vida tem sentido.
            É também o que Jesus entende por serviço, caracterizado em dois aspectos. No primeiro, servir significa colocar-se no seguimento do Mestre. Ou seja, o serviço acontece pelo discipulado, tornando-se discípulo e discípula de Jesus, modelando a própria vida na vida de Jesus. O segundo aspecto do serviço consiste em permanecer com Jesus, como um servo permanece ao lado de seu Senhor. Para o discípulo, a Cruz não é derrota, é troféu de vitória porque nela encontra-se o segredo da vida revelado pelo próprio Deus.

Conclusão
            O encontro com a Cruz de Jesus é uma preparação antecipada, proposta pela Liturgia, para que os celebrantes possam compreender o significado profundo, seja do ponto de vista Teológico, como do ponto de vista espiritual, da Cruz de Jesus. Um convite, não para lançar um olhar de dolorismo à Cruz de Jesus, mas um olhar de vitória com um sentimento todo especial, marcado pela ação de graças, pela glorificação e pela adoração ao Senhor elevado no alto da Cruz.
Serginho Valle
Março de 2018


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