24 de ago. de 2016

Leitor da Palavra na Missa

A Igreja estabelece um ministério especial para quem é convidado a proclamar a Palavra de Deus na celebração litúrgica. É o ministério do leitorato. É um ministério conferido pelo bispo diocesano a pessoas que, em primeiro lugar, são dignas de testemunhar a Palavra proclamando-a publicamente diante da comunidade. Diante disso, a celebração litúrgica não tem um simples leitor, mas alguém que se coloca a serviço da Igreja, na comunidade, para proclamar a Palavra de Deus aos celebrantes reunidos em assembléia celebrativa.
Hoje, infelizmente, a maior parte das comunidades não atenta para este ministério e opta pelo caminho mais fácil: escolher qualquer um que saiba ler. Piora a situação quando esta escolha acontece poucos minutos antes do início da Missa. Corre-se o risco, deste modo, de desconsiderar o testemunho existencial, por exemplo, como um requisito importante para alguém ser leitor na celebração da Missa. Não se considera aquilo que o bispo diz ao instituir alguém no ministério: “recebe o Livro Sagrado, medita o que lês e viva o que proclamas”. Ou seja, não se trata de um simples leitor de um texto Bíblico, mas alguém que anuncia aquilo que crê e procura pautar sua vida na luz da Palavra de Deus.
O fato de colocar qualquer um que, apenas, saiba ler, mas vive distante da Palavra é indicativo de desrespeito para com a Palavra. O leitorato deveria ser valorizado em nossas comunidades também pela coerência de vida e não apenas pela aptidão da leitura. Para isso, é importante oferecer ao leitor a oportunidade de entrar em contato com a Palavra para aprender a afinar sua vida com esta mesma Palavra antes de assumir o ministério do leitorato.  
Posso adivinhar uma pergunta: onde encontrar pessoas assim? Não é tão difícil. Em nossas comunidades existe muita gente que vive ou procura viver a fé através de um testemunho ético, com princípios de honestidade e de bondade. Entre nós, existe muita gente que testemunha (ou se empenha) de modo exemplar na vivência da fé e no discipulado do Evangelho.

Preparação dos leitores
Outro elemento a ser considerado é a preparação dos leitores. A atividade inicial desta preparação consiste em colocar os futuros leitores em contato com a Palavra. Eles precisam conhecer a Palavra que irão proclamar, qual a dinâmica desta Palavra na vida deles e como se colocam a serviço do Reino proclamando a Palavra. Em muitos casos, isso é suficiente para se ter bons leitores e leitoras. Reconhecer, em resumo, que se trata de uma Palavra divina e como tal deve ser tratada. Não se admite, portanto, nenhuma atitude desrespeitosa.
Tal pressuposto coloca algumas condições para que alguém possa assumir o leitorato, como é o caso de crianças e de adolescentes, ou até mesmo de adultos, quando não são capazes de compreender o que leem. Em outras palavras, não se pode assumir como leitor quem apenas sabe ler, mas não compreende o que lê; é preciso um algo mais que isso. É preciso conhecer a Palavra e entender o que cada leitura pretende comunicar. Em resumo, não se trata de algo funcional, do cumprimento de uma função, mas de algo como que emprestar a boca e o exemplo de vida para que a Palavra produza frutos na assembléia onde é semeada.
A preparação para o leitorato contempla também recursos comunicativos: capacidade de ler interpretando o texto, capacidade de proclamar de maneira compreensiva aquilo que está lendo; além de recursos básicos como saber ler, conhecer a pontuação, ter boa dicção, saber lidar com o microfone... Leituras mal feitas desrespeitam a Palavra e os celebrantes.
Além disso, o respeito do leitor para com a Palavra (e também para com a assembléia) é demonstrado pelo seu modo de vestir, o modo como se apresenta diante dos celebrantes. Já fizemos menção da importância da “veste celebrativa” para os leitores em outra oportunidade. Onde esta não é adotada, então o critério do vestir-se é regido pela simplicidade, pelo decoro e pelo bom gosto.
Tais recursos para os leitores exigem capacitação e isto significa oferecer oportunidades de cursos para o treinamento de leitores, seja do ponto de vista técnico como espiritual.

Ambão e livro
Ainda com relação ao respeito para com a Palavra de Deus, chamo atenção para a dignidade do local de onde se proclama a Palavra e para a importância do Livro da Palavra.
O local da proclamação da Palavra é o Ambão ou Mesa da Palavra. Já tivemos oportunidade de escrever sobre o ambão neste blogger. Lembro, apenas, que não se trata de uma simples estante, mas de um espaço privilegiado, de destaque e nobre.
A Palavra de Deus também é respeitada pelo uso do Livro: Lecionário para as leituras e salmo responsorial e, o Evangeliário para a proclamação do Evangelho nas Missas Dominicais e solenes. Não se admite, em hipótese alguma, proclamar a Palavra de folhetos ou de livretes. Nenhum dos dois é digno de ser usado na proclamação Palavra.
Serginho Valle

2016

19 de ago. de 2016

IGMR 45 – O Silêncio na comunicação litúrgica da Missa

Oportunamente, como parte da celebração deve-se observar o silêncio sagrado. A sua natureza depende do momento em que ocorre em cada celebração. Assim, no ato penitencial e após o convite à oração, cada fiel se recolhe; após uma leitura ou a homilia, meditam brevemente o que ouviram; após a comunhão, enfim, louvam e rezam a Deus no íntimo do coração.
 Convém que já antes da própria celebração se conserve o silêncio na igreja, na sacristia, na secretaria e mesmo nos lugares mais próximos, para que todos se disponham devota e devidamente para realizarem os sagrados mistérios.

Com este parágrafo concluímos uma parte da leitura da Instrução Geral do Missal Romano, relativa a elementos gerais do processo comunicativo na Missa. A conclusão acontece com o tema do silêncio, apresentado na IGMR 45, como elemento essencial na comunicação litúrgica. O silêncio é um elemento essencial em qualquer comunicação, não somente na comunicação litúrgica. Não existe comunicação saudável sem silêncio, isto é, de comunhão e participação, sem o silêncio, porque o silêncio é o ambiente apropriado para se acolher o que o outro diz. É no silêncio que acolhemos a mensagem de uma bela música ou de uma pintura, de uma foto ou de uma dança. Ora, se o silêncio é importante na comunicação humana, tanto mais importante o é na comunicação com Deus, seja na oração, na meditação da Palavra, no estudo da Teologia e, particularmente no contexto da celebração litúrgica.
A IGMR 45 diz que o silêncio é parte integrante da celebração litúrgica. Isso significa que a comunicação litúrgica, no contexto celebrativo do Mistério Eucarístico, acontece em ambiente silencioso e em clima de silêncio. Celebra-se a Eucaristia no silêncio. Missas barulhentas, com volume alto nos microfones ou no ministério de música; com conversas e murmúrios antes e no durante celebrativo... são ruídos que impedem uma boa comunicação litúrgica.

Diferentes silêncios
Outro fato que chama atenção são os diferentes modos de silenciar propostos pela IGMR 45. O texto, para ser mais preciso, fala de diferentes contextos nos quais se criam diferentes formas de silenciar. Da mesma forma como diferentes ritos têm características celebrativas diferentes, existe uma finalidade do silenciar para cada rito em vista da participação plena e ativa na Eucaristia.
Assim, existe o “silêncio para o recolhimento” como condição necessária para se refletir sobre a própria vida, antes do ato penitencial. Existe o “silêncio meditativo”, na Liturgia da Palavra, com a finalidade de refletir sobre o que se ouviu na Palavra e na homilia. Existe o “silêncio orante”, para silenciosamente louvar e agradecer a Deus, para adorar a Eucaristia. O silêncio é sempre silencioso, isto é, sem fundo musical e sem motivações de mensagens do padre ou de outro ministro; é silencio mesmo, mas com finalidades diferentes.
Acrescentaria ainda o “silêncio da escuta”, necessário para se ouvir quem preside, quem proclama a Palavra ou propõe uma monição. E, ainda, o “silêncio da educação” que respeita quem celebra ao meu lado, não conversando durante a Missa, não rindo ou, pior de todos, não mexendo no celular.

Silêncio antes da Missa
Uma orientação que merece ser considerada, com certa urgência em algumas comunidades, é o silêncio antes da celebração. A importância do silêncio, seja na sacristia, como mencionado na IGMR 45, seja na igreja, no tempo que se espera para o início da Missa. Em algumas comunidades, tem-se a impressão que a igreja, antes da Missa, é uma praça pública, tanto se conversa. Sem contar o mau gosto de ministérios de músicas afinando seus instrumentos antes da Missa, dentro da igreja. O ideal é criar um clima de silêncio e, neste caso, uma música ambiente gregoriana ou instrumental ajudaria os celebrantes a se prepararem silenciosamente para a celebração.
Quanto ao silêncio na sacristia, dedicarei futuramente um artigo sobre este espaço. Que se converse sobre alguns detalhes da celebração, tudo bem, mas quando a sacristia, antes da da celebração da Missa, é local para se contar piadas ou fazer brincadeiras, então é preciso pensar se tais atitudes condizem com aquilo que se vai celebrar.
Tenho a impressão que existe uma confusão motivada pelo sentido festivo da Missa. Sempre se diz que a “Missa é uma festa”. É verdade. Mas, qual o sentido da festa litúrgica? É a festa do encontro fraterno e com Deus, que não acontece na barulheira, mas na alegria interior, de onde a necessidade de silenciar para experimentar a manifestação silenciosa do silencioso Deus. Quando não é capaz de celebrar a Missa em clima silencioso, então a comunicação litúrgica deixará a desejar.
Serginho Valle
2016




17 de ago. de 2016

Estrutura básica da Liturgia da Palavra

Chama-se Liturgia da Palavra por reunir elementos que compõem aquilo que caracteriza uma Liturgia, especialmente pela presença de Jesus Cristo na assembléia celebrante. Presença esta que acontece na proclamação da Palavra, pois é o próprio Jesus Cristo que anuncia o seu Evangelho (SC 7).
Como em todas as Liturgias, também esta é formada por diferentes ritos, com a particularidade comunicativa de serem ritos proclamativos. Assim, proclamam-se as leituras, como facilmente se intui, mas proclama-se também a homilia, a Profissão de Fé e as orações dos fiéis. Teremos oportunidade de tratar cada um dos elementos da Liturgia da Palavra. Este pequeno artigo contempla apenas a estrutura básica da distribuição das leituras na Liturgia da Palavra.

Distribuição geral das leituras
Nas Missas Dominicais e naquelas solenes, a Liturgia da Palavra se compõe com duas leituras, salmo responsorial e Evangelho. Nas Missas ferias, celebradas durante a semana, a Liturgia da Palavra se compõe com uma leitura, o salmo responsorial e o Evangelho.
Acrescente-se que a distribuição das leituras,  nas Missas feriais, mantém o critério de divisão entre “anos pares” (concordando com os números pares de cada ano; assim 2016 lê as leituras dos anos pares) e “anos ímpares” (concordando com os números ímpares de cada ano; assim em 2017 são lidas as leituras dos anos ímpares).
Não é assim nas indicações do Lecionário Dominical, distribuídos nos Anos A – B – C. Para o Lecionário Dominical, as leituras obedecem a critérios diferentes para cada Tempo Litúrgico.

Tempo Comum
O Lecionário dos Domingos do Tempo Comum é composto de três leituras, mais o salmo responsorial. A 1ª leitura sempre coincide tematicamente com o Evangelho e, a 2ª leitura é livre, escolhida de modo linear, isto é, seguindo um autor sagrado, lendo um capítulo depois do outro em cada celebração dominical. Dada esta característica, as 2ª leituras nem sempre coincidem nem com o Evangelho e nem com a 1ª leitura. A escolha do Evangelho obedece o mesmo critério linear, por isso a 1ª leitura e o salmo responsorial são escolhidos de acordo com o Evangelho.

Tempos fortes
Nos tempos fortes, Tempo Pascal e Tempo Natalino, as três leituras coincidem com único tema. Na preparação do Tempo Pascal, a Quaresma, as 1ª leituras (do Antigo Testamento) e as 2ª leituras (Epístolas) mais o Evangelho formam uma unidade temática.
Nos Domingos depois da Páscoa, não se fazem leituras do AT. As 1ª leituras são proclamadas dos Atos dos Apóstolos. A única presença do Antigo Testamento são os salmos responsoriais.

Missas rituais, santoral, fiéis defuntos e diversas circunstâncias
Para as Missas Rituais (Batismo, Crisma, Ordenações...), para as Missas do calendário santoral (comemorações de santos e santas), Missas dos fiéis defuntos (exéquias ou comemorações de datas), como nas Missas para diversas circunstâncias (pela Igreja, pela Pátria, para pedir chuva, em ação de graças...)... todas estas celebrações obedecem um Lecionário próprio, com indicações de leituras próprias presentes no “Ordo Lectionum Missae” (Diretório das Leituras da Missa).

Serginho Valle

2016

12 de ago. de 2016

IGMR 44 – Ritos processionais na Missa

Entre os gestos incluem-se também as ações e as procissões realizadas pelo sacerdote com o diácono e os ministros ao se aproximarem do altar; pelo diácono antes da proclamação do Evangelho ou ao levar o Livro dos evangelhos ao ambão; dos fiéis, ao levarem os dons e enquanto se aproximam da Comunhão. Convém que tais ações e procissões sejam realizadas com dignidade, enquanto se executam cantos apropriados, segundo as normas estabelecidas para cada uma (IGMR 44)

Pode parecer que não, mas a celebração da Missa não acontece num mesmo local; realiza-se em lugares diferentes, deslocando-se em pequenas caminhadas processionais. Inicia-se na porta da igreja, vai até o altar e dali até a cadeira de quem preside. Sai da cadeira presidencial para ir até o altar e, de lá até o ambão. Volta para a cadeira presidencial, de onde se preside a Profissão de fé e, dirige-se ao ambão para se proclamar a oração dos fiéis. Volta para o centro da igreja, de onde os celebrantes levam as ofertas ao altar. Depois da grande ação de graças, proclamada na Oração Eucarística, do altar dirige-se ao centro da igreja para a partilha da comunhão Eucarística. Não se contempla, depois da despedida e encerramento da Missa, uma procissão de retorno, nas Instruções Gerais do Missal Romano (IGMR).
Todas estas procissões e deslocamentos são atitudes rituais, que encontram sentido diferente em cada celebração Eucarística através das canções. Assim, por exemplo, a procissão das oferendas, em cada Missa, tem um sentido diferente e um motivo que possibilita ou impede de se entrar na procissão das oferendas e apresentar as ofertas no altar da comunidade (cf. Mt 5,23-24).
A IGMR 44 descreve as procissões no contexto da gestualidade. Nossas reflexões, no blogger, consideram as procissões como expressões comunicativas. Passam a mensagem de uma assembléia em movimento, imagem visível de um povo a caminho que vai ao encontro de Jesus Cristo, simbolizado no altar e, do altar se alimenta com o alimento divino. O fato que todas as procissões se dirigirem ao altar e do altar partirem é uma mensagem importante, indicação de uma Igreja que sempre caminha ao encontro de Jesus Cristo. De outro lado, é do altar, de Jesus Cristo, que se parte para alimentar os celebrantes com a vida divina, presente na Palavra e presente no Sacramento da Eucaristia. Indicação que a Igreja e os celebrantes da Eucaristia têm como centro da vida o altar, mesa que alimenta o povo de Deus com a vida divina, como proclama o embolismo do Prefácio da Santíssima Eucaristia, I: “Sua carne imolada por nós, é o alimento que nos fortalece. Seu Sangue, por nós derramado, é a bebida que nos purifica”. E, como diz ainda o Prefácio da Páscoa V: “revelando-se ao mesmo tempo, sacerdote, altar e cordeiro.” Entende-se, assim, o axioma teológico: a Igreja faz a Eucaristia e a Eucaristia faz a Igreja.

Modo comunicativo-litúrgico das procissões
O modo de caminhar comunica o motivo pelo qual a Igreja aproxima-se do altar, na procissão inicial. Convido a reler, neste blogger, um artigo que escrevi sobre a procissão de entrada com o título “Acolhamos o celebrante”. A procissão de entrada não é um desfile que, ao passar pelo centro da igreja, vai-se cumprimentando e acenando para os celebrantes. É um caminhar de toda a Igreja ao encontro do altar, representada no padre e nos ministros que dela tomam parte.
A procissão do Evangeliário realiza-se de modo solene, ostentando o Livro para que todos o vejam, ladeado por duas velas. Pede um caminhar solene, que comunique o momento alto da Liturgia da Palavra, que a proclamação Evangelho. No Brasil, em celebrações mais festivas, a procissão do Evangeliário acontece com coreografias de dança litúrgica, para acolher e aclamar Jesus Cristo que anuncia seu Evangelho entre nós.
A procissão ofertorial caracteriza-se pela espontaneidade, no sentido de ser uma procissão mais livre. Considerando a sequência ritual, primeiro, os celebrantes deveriam levar suas ofertas e coloca-las aos pés do altar, depois viriam as oferendas eucarísticas levadas processionalmente por representantes da assembléia celebrante. Uma vez que as ofertas do povo (dinheiro ou espécies) e as ofertas da Igreja (pão, vinho e água) estiverem próximos do altar e no altar, então sim o padre realiza o rito da preparação e apresentação das oferendas. No modo como acontece atualmente, em muitas comunidades, são três ritos acumulados: procissão das ofertas, procissão dos celebrantes e apresentação das oferendas. Uma observação: sendo uma procissão que se endereça ao altar, é estranho que oferentes parem rezando na cesta das ofertas, como verificado em algumas comunidades. As cestas não são locais de oração, pois têm serventia prática e não representativa do altar.
Por fim, a procissão para a comunhão Eucarística. Comunicativamente, é muito expressiva em sua mensagem. Mensagem de um povo que caminha ao encontro de Cristo para ser alimentado pelo próprio Senhor e mensagem de uma Igreja que, com seus ministros, padre em primeiro lugar, se dirige ao povo para alimentá-lo com a Eucaristia. Disto se deduz ser estranho o fato do padre não distribuir a Eucaristia, na comunhão, mas delegar este ministério litúrgico somente aos ministros extraordinários da comunhão Eucarística.
Serginho Valle
2016



10 de ago. de 2016

Liturgia da Palavra – estrutura comunicativa

A Liturgia da Palavra, na Missa e nos Sacramentos, é comunicativamente estruturada em modo dialógico. Diálogo entre pessoas, aquela Divina, que fala através da Palavra — o meio comunicacional por excelência — e as pessoas humanas, reunidas em assembléia celebrante e celebrativa.
            Do ponto de vista comunicativo, o destaque desta Liturgia é a Palavra, escrita com “P” maiúsculo por se referir à Palavra de Deus. É uma Palavra a ser acolhida, mas também celebrada como elemento memorial da Encarnação, especialmente presente na proclamação do Evangelho, pois quando se proclama é o Evangelho é o próprio Jesus Cristo quem fala (SC 7; IGMR 29). Motivo pelo qual a proclamação do Evangelho é festejada e aclamada com cantos de aclamações ou antífonas aleluiáticas.
            Como referido noutra reflexão sobre a Liturgia da Palavra, a comunicação celebrativa na Liturgia da Palavra acontece num clima de completo silêncio por dois motivos. Primeiro, o motivo humano, considerando que só se é capaz de acolher bem quem nos dirige a palavra quando se é capaz de silenciar para ouvir. De onde o silêncio ser o ambiente necessário para que a Palavra possa ser anunciada e devidamente acolhida. O segundo elemento é Litúrgico. Aqui entramos no campo da comunicação simbólica, do silêncio como símbolo — symbolon, o mesmo que Sacramento — o espaço onde o Espírito Santo age e se movimento. O silêncio litúrgico é símbolo do Espírito Santo. Ele é a voz silenciosa de Deus que fala na quietude do coração celebrante. De onde, pois, a necessidade de silenciar para que o Espírito Santo possa agir no coração e nas mentes dos celebrantes a fim de acolher verdadeira e sinceramente a Palavra. Este silêncio precede à Liturgia, na vida do padre, quando toma contato silencioso (espiritual) com a Palavra antes de proclamá-la e meditá-la com a assembléia, na homilia.

Principais sinais e símbolos na comunicação litúrgica da Palavra
            O processo comunicativo litúrgico da Palavra, como acontece em todo processo comunicativo humano, é feito também com sinais e símbolos. Ambos têm a finalidade de promover melhor participação e compreensão da mensagem que comunicada, como tem ainda a finalidade de valorizar a dignidade da Palavra.
            Estes sinais e símbolos presentes na Liturgia da Palavra destacam a dignidade da Palavra proclamando-a do Livro Sagrado, o símbolo mais sublime da Palavra divina entre nós. São dois livros distintos, especialmente presentes nas Missas Dominicais e naquelas de solenidades e festas: o Lecionário e o Evangeliário. Este segundo livro, o Evangeliário, recebe todas as honras pelo rito processional, seja na procissão inicial como naquela que o conduz até o ambão, além disso é honrado com a incensação, com o beijo, com a ostentação e, nas Missas presididas pelos bispos, usado para abençoar o povo, após a proclamação do Evangelho. Tudo para comunicar a excelência do Evangelho como presença memorial de Cristo, anunciando no nosso hoje o mesmo Evangelho anunciado “in illo tempore” (naquele tempo). Entende-se, portanto, que  proclamar as leituras e principalmente o Evangelho de folhetos ou livretes como que joga no lixo toda a dignidade da Palavra.
            Outro símbolo litúrgico é o espaço de onde se proclamam as leituras: o ambão ou Mesa da Palavra. Depois do altar, o ambão é também uma mesa por isso, não somente do ponto de vista estético, mas comunicativamente simbólico-litúrgico, o ambão é feito com o mesmo material do altar. Se o altar é de mármore, também o ambão será de mármore, por exemplo. Sobre o ambão remetemos a um artigo já publicado neste blogger.

Comunicadores da Palavra
            Um último elemento são os comunicadores da Palavra. O principal comunicador é Deus e Jesus Cristo, mas eles se servem da voz humana para que sua Palavra chegue até as pessoas. Por se tratar de uma Palavra especial, sublime, entende-se que os comunicadores da mesma precisam de preparo, seja na qualidade comunicativa (saibam ler) como na qualidade testemunhal (procurem viver o que leem). Sobre isto já fiz referência em outro artigo sobre a Liturgia da Palavra e dedicarei um artigo somente ao leitor.
            Enquanto presença comunicativa do leitor, foco deste artigo, ela se manifesta através da roupa, da postura, da impostação da voz e da interpretação do texto. Hoje, muitas comunidades vestem seus leitores com a “veste celebrativa”, destacando o ministério do leitorado. Na falta da mesma, espera-se que os leitores façam as leituras bem vestidos, isto é, sem roupas extravagantes.
            Quanto à sua postura, entende-se o modo de se apresentar diante da assembléia, o jeito como fica de pé, o modo como fala no microfone (sem gritar e não falando fora do microfone), o modo de ler (pausadamente, com um ritmo capaz de ser acompanhado, mas não lentamente). Entra aqui também a impostação da voz, no sentido de fazer uma leitura agradável, sem gritos e nem baixa demais a ponto de, mesmo com microfone, seja inaudível. Indispensável dizer que o leitor precisa saber ler e ler bem; se não sabe ler, primeiro aprenda, porque a dignidade da Palavra e o respeito pela assembléia exigem que o ministério do leitorado seja exercido por quem sabe ler bem.
            Mas, não basta apenas saber ler; ele precisa saber interpretar a leitura. Ter o estilo litúrgico de proclamar a Palavra: nem dramático e nem meloso, porque se passará por ridículo, mas proclamar a Palavra de modo natural, interpretando-a de tal modo que seja compreensível e artisticamente agradável de ser ouvida. Sobre isto, voltaremos em outro artigo.
Serginho Valle
2016
           


6 de ago. de 2016

Disciplina litúrgica para a gestualidade e ajoelhar-se – IGMR 43c

Compete, porém, à Conferência dos Bispos adaptar, segundo as normas do Direito, à índole e às legitimas tradições dos povos, os gestos e posições do corpo descritos no Ordinário da Missa. Cuide-se, contudo, que correspondam ao sentido e à índole de cada parte da celebração. Onde for costume o povo permanecer de joelhos do fim da aclamação do Santo até ao final da Oração Eucarística e antes da Comunhão quando o sacerdote diz Eis o Cordeiro de Deus, é louvável que ele seja mantido.

O terceiro parágrafo da Instrução Geral do Missal Romano (IGMR 43c) refere-se à disciplina litúrgica quanto a posição corporal em geral e dirige seu foco ao ajoelhar-se durante a Oração Eucarística e antes do convite para participar da Comunhão Eucarística.
A Igreja sempre assumiu o direito e o dever de estabelecer uma disciplina para o culto litúrgico, como lemos nesta IGMR 43c e em outras referências. Para casos que envolvem conceitos teológicos e Bíblicos, as instruções disciplinares são feitas pela Santa Sé. Em outros casos, como este da IGMR 43c, a Santa Sé passa a competência às Conferências dos Bispos de cada nação.

Disciplina litúrgica: duas anotações
Nos primeiros tempos da Igreja, a Liturgia era celebrada de modo espontâneo, mas com princípios disciplinares gerais propostos pela Igreja, como se conhece pela História da Liturgia. Nunca houve uma espontaneidade total, do padre ou bispo fazer como quisesse. Com o passar dos anos e dos séculos, devido a desvios teológicos de bispos e padres, principalmente na Idade Média, a Igreja se viu na necessidade de regularizar (colocar regras) para a celebração Litúrgica de todos os Sacramentos. Existe, portanto, uma legislação litúrgica, e existem orientações litúrgicas que formam o corpo disciplinar da Liturgia. É o que se denomina de disciplina litúrgica.
Minha segunda anotação é considerar que a disciplina litúrgica não pode ser vista como impedimento à espontaneidade, mas entendê-la como uma proposta de comunicação disciplinada, como acontece com toda comunicação que envolve grande número de pessoas. Além disso, é útil considerar a disciplina litúrgica como manifestação eclesial de unidade, de todos celebrarem o Mistério da Salvação com o mesmo espírito eclesial e não de acordo com os sentimentos de um bispo ou de um padre individualmente. É sempre a Igreja que celebra.

Critérios para a “adaptação” dos gestos
            O primeiro critério, dizem as entrelinhas da IGMR 43c, que não compete nem ao bispo e nem ao padre, isoladamente, determinar ou introduzir gestos na Missa. Esta competência vem da Santa Sé e, no caso presente, necessita do parecer das Conferências Episcopais, que determina como proceder.  
            Para disciplinar a gestualidade e posições corporais (que também são gestos), a IGMR 43c considera três aspectos: primeiro as normas do Direito Canônico, ou seja, naquilo que diz respeito à legislação litúrgica presente no Código de Direito Canônico. Depois, o respeito pela índole do povo, considerando que gestos têm significados diferentes em diferentes contextos sociais de países e povos. Terceiro, uma consequência, o respeito pelas tradições dos povos em favor da da participação e compreensão da celebração por parte dos celebrantes.
            Como se pode intuir, não é algo muito simples, considerando que algumas linhas depois, a IGMR 43c ressalta que mesmo estando de acordo com a índole e as tradições dos povos, esta não pode afetar o sentido original daquilo que a Igreja propõe com os gestos e as posturas corporais na Liturgia.
Vários elementos gestuais, como a genuflexão ou inclinação, o beijo no altar ou o tocar o altar com a testa, a saudação do abraço da paz com um aperto de mão ou com abraço ou beijo... comunicam uma mensagem de adoração, de acolhimento, de prece, de partilha da paz e reconciliação de acordo com o costume de cada povo. Em alguns países com culturas bem diferentes da nossa, não se faz genuflexão, mas inclinação; em outros, não se beija o altar ou o Evangeliário, mas o tocam com a testa porque tais gestos têm significados diferentes. Tudo isso em vista de se comunicar gestualmente com aquilo que é próprio do povo onde é celebrada a Eucaristia e para que os celebrantes, entendendo, participem ativa e compreensivamente.
           
Ajoelhados na Oração Eucarística e antes da Comunhão
            A IGMR 43c, depois de lembrar o principio disciplinar que regular a Liturgia, conclui dizendo ser louvável respeitar o costume de comunidades onde se permanece de joelhos durante toda a Oração Eucarística e não somente no momento da epíclesis (invocação do Espírito Santo) e consagração. O mesmo é considerado quanto ao modo de acolher o convite para a Comunhão Eucarística de joelhos.
Para o Brasil, a orientação da CNBB para a participação da consagração é de ajoelhar-se no momento da invocação do Espírito Santo (epíclesis) até o final da consagração do vinho. Isto significa que a aclamação do “Mysterium fidei” é feita de pé. O mesmo se diga quanto a postura corporal, de ficar de pé, no momento do convite para participar da Comunhão Eucarística, depois do “Cordeiro de Deus”.
Serginho Valle
2016


3 de ago. de 2016

A Liturgia da Palavra

Antes dos celebrantes, que compõem a assembléia litúrgica, se aproximarem da Mesa Eucarística, todos se detém silenciosamente seja como atitude, seja mentalmente para sintonizarem-se com a Palavra, pela qual Deus fala. Sim, é Deus quem fala pela Palavra, presente no Livro Santo, e é o próprio Jesus quem anuncia o Evangelho, pois ele está presente na Palavra, especialmente presente na proclamação do Evangelho, no decorrer da celebração litúrgica (SC 7). Entende-se, pois, que antes de um evento de tamanha importância, diante do próprio Deus e de nosso Mestre que falam na assembléia litúrgica, existe a necessidade de silenciar. Silenciar para ouvir; silenciar os ouvidos dos rumores externos e silenciar o coração e a mente de tudo que os possam distrair. Tudo, seja no corpo como na mente, devem silenciar para ouvir Deus falar.
Do ponto de vista ritual, a Liturgia da Palavra é celebrada com ritos silenciosos, que favorecem a escuta e a atenção para com quem nos fala. Este “quem nos fala”, volto a repetir, é o próprio Deus, é o próprio Jesus Cristo. Além disso, até mesmo o rito da oração dos fiéis, que é parte integrante da Liturgia da Palavra, não se realiza com todos os celebrantes falando juntos, recitando a mesma oração conjuntamente, mas silenciosamente ouvindo as intenções e participando com as súplicas aclamativas. Os momentos de intervenção vocal, na Liturgia da Palavra, são sempre aclamativos: assim são as aclamações depois de cada leitura, a antífona do salmo responsorial, a aclamação ao Evangelho e o refrão das preces. Exceção feita unicamente à Profissão de Fé. Predomina, pois o silêncio, interrompido por aclamações de acolhimento da Palavra divina na vida dos celebrantes.
Os ministros, do ponto de vista comunicacional, também devem favorecer o silêncio, evitando todo tipo de ruídos. Ruídos que passam pela qualidade proclamativa da leitura (“ler bem”), o modo de se apresentar diante dos celebrantes (modo de se vestir e posição corporal), o local de onde proclamam a Palavra (ambão) e a importância de proclamar a Palavra com o Livro. Em resumo: ler bem, jamais folhetos, nada de roupas indecorosas e sempre proclamar a Palavra do ambão. A Palavra de Deus merece todo respeito.
Além disso, quem for proclamar as leituras não pode se limitar ao “ler bem”, precisa saber interpretar a leitura, dar vida e cativar os celebrantes para o que está sendo anunciado. Até mesmo quando crianças forem proclamar as leituras, estas devem estar devidamente preparadas e serem capazes de compreender, dentro de suas capacidades, o que estão lendo. O ambão é um espaço sagrado e merece respeito. Um respeito que é demonstrado, em primeiro lugar pelo leitor. Leituras mal feitas desrespeitam a Palavra e demonstram falta de respeito para com os celebrantes. Primeiro se aprenda a ler, depois se considere apto para proclamar a Palavra diante da assembléia.
Uma última anotação para concluir estas considerações iniciais sobre a Liturgia da Palavra diz respeito ao testemunho de vida. No rito da Instituição dos Leitores, o bispo diz que o leitor deverá se alimentar do que lê na Palavra e viver de acordo com aquilo que proclama. Trata-se de uma predisposição básica na escolha dos leitores. Não se pode admitir pessoas que não tenham vida de testemunho cristão, que estão envolvidos com atitudes indignas de um cristão. O que ele proclama, em suma, não pode ser desmentido pela Palavra que proclama. Neste sentido, o critério do “ler bem”, não é suficiente. Além de “ler bem” é preciso que procure viver o que lê e se empenhe em testemunhar o que lê.
Serginho Valle

2016
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