31 de mar. de 2017

“Velatio” das imagens

A tradição de velar as imagens, na Quaresma, a partir do 5º Domingo da Quaresma, mas especificamente, vem de longa data. Os historiados litúrgicos falam de uma tradição que remonta ao século IX. Consiste em cobrir as imagens com um pano roxo e, o crucifixo, com um pano branco, antes de iniciar a Semana Santa. Hoje, não existe obrigatoriedade, mas o Diretório Litúrgico continua propondo a “velatio” das imagens a partir do 5º Domingo da Quaresma. 
O contexto, no qual nasceu a “velatio”, retornando ao século IX, era marcado pela devoção aos santos e santas de maneira muito intensa, superando inclusive a atenção para com a Eucaristia. Por isso, buscando na “velatio” um recurso didático, a Igreja pretendia chamar atenção para a centralidade da Páscoa cobrindo as imagens. 
Por que no 5º Domingo da Quaresma? De acordo com uma antiga tradição da Teologia Quaresmal, no 5º Domingo da Quaresma iniciava-se aquilo que é considerado “Tempo da Paixão”, marcada por uma atenção especial nos preparativos da Semana Santa, quando se celebra a Paixão, Morte e Ressurreição do Senhor.
Depois da Reforma Litúrgica (1963), a maior parte das comunidades abandonou o costume da “velatio”, talvez devido a uma interpretação indevida no uso deste e de outros sinais que favoreciam a participação do povo no tempo litúrgico. Uma retomada deste costume veio com a Carta Circular “Paschalis Sollemnitatis” que, no seu parágrafo 26 diz o seguinte: “o uso de cobrir as cruzes e as imagens na igreja, desde o V domingo da Quaresma, pode ser conservado segundo a disposição da Conferência Episcopal. As cruzes permanecem cobertas até ao término da celebração da Paixão do Senhor na Sexta-feira Santa; as imagens até ao início da Vigília Pascal.”
Outra prescrição semelhante a esta, ainda na “Paschalis Sollemnitatis”, no parágrafo 57 orienta como proceder a “velatio” na conclusão da Missa “n Coena Dmini”, na Quinta-feira Santa, com estas palavras: “concluída a Missa é desnudado o altar da celebração. Convém cobrir as cruzes da igreja com um véu de cor vermelha ou roxa, a não ser que já tenham sido veladas no sábado antes do V domingo da Quaresma. Não se podem acender velas ou lâmpadas diante das imagens dos santos.”

Duas considerações sobre a “velatio” em nossos dias
            A primeira consideração que faço a este costume litúrgico é considerar sua finalidade catequética: chamar atenção para a centralidade do Mistério Pascal que está para ser celebrado proximamente. Proximidade pelo fato de que a “velatio” acontece no 5o Domingo da Quaresma.  Ligado ao fator catequético, existe a disposição pedagógica, de estabelecer um sinal no contexto do espaço celebrativo como que avisando os celebrantes sobre a proximidade da Semana Santa, na qual se celebra o Mistério Pascal de Jesus Cristo. Este é um conceito que seria bom que o Ministério da Ornamentação tivesse presente.
            Minha segunda consideração sobre a “velatio” está no contexto da reflexão sobre a ornamentação do espaço celebrativo, daquilo que denomino de “símbolo contextual”.
Talvez a “velatio” não se enquadre no aspecto simbólico, porque do ponto de vista da semiologia está mais para sinal que para símbolo. Por isso, uma sinalização que anuncia a proximidade da Semana Santa. No conceito de “símbolo contextual” a “velatio” tem sim espaço para que o Ministério da Ornamentação proponha uma mensagem de atenção em vista da proximidade da Semana Santa.
Serginho Valle
2017



24 de mar. de 2017

Espaço celebrativo gaudete e laetare

O espaço celebrativo "gaudete" e "laetare" merecem atenção do Ministério da Ornamentação por se tratarem de espaços simbólicos, feitos com flores, com a possibilidade de introduzir algum elemento próprio do contexto celebrativo particular. Ambos têm a mesma finalidade: comunicar simbolicamente a alegria da Igreja pela proximidade do Natal (gaudete) e a alegria da proximidade da Páscoa (laetare). 
O "Domingo gaudete" é celebrado no 3º Domingo do Advento e, o "Domingo laetare" no 4º Domingo da Quaresma. O titulo destes dois Domingos provém de suas antífonas de entrada. Ambas convocam a assembléia celebrante a alegrar-se no Senhor. Assim, a antífona de entrada do 3º Domingo do Advento canta: “gaudete in Domino semper” (“alegrai-vos sempre no Senhor) e o 4º Domingo da Quaresma canta: “laetare, Ierusalem” (“alegra-te, Jerusalém”).
O convite à alegria é contemplado nas orientações litúrgicas com a possibilidade de se ornamentar o espaço celebrativo com flores. Isto não significa transformar o espaço celebrativo numa floricultura, mas tão somente, e apenas, propor um indicativo floral para expressar a alegria da Igreja. Trata-se, sim, de alegria, mas ainda contida, digamos assim; um contentamento de quem espera festejar brevemente a alegria da realização de uma promessa divina, no Natal (nascimento do Messias) e na Ressurreição de Jesus (vitória da vida sobre a morte).
Isto significa propor um arranjo simples, que não interfira no silêncio do Advento ou da Quaresma. Tudo indicando que se trata se um arranjo floral discreto, simples, apenas indicativo, não em forma de notícia, mas no modo de um recado ou, se quiserem, de um simples aviso. 
Como dito acima, existe a possibilidade de preparar o arranjo floral com algum símbolo relativo ao contexto celebrativo, no caso, do Advento ou da Quaresma. No Advento, por exemplo, pode-se formar o arranjo floral de modo simples e contendo dois ou três enfeites natalinos, como as bolas coloridas. No caso da Quaresma, o arranjo floral com uma vela, por exemplo, em se tratando do contexto do 4º Domingo da Quaresma, do Ano A, porque o Evangelho da cura do cego nato remete ao símbolo batismal da entrega da luz de Cristo, representado por uma vela acesa.
Nada, portanto, de enfeites florais exagerados nem no 3º Domingo do Advento e nem no 4º Domingo da Quaresma. No silêncio do espaço celebrativo, próprios do Tempo Litúrgico do Advento e da Quaresma, silenciosamente se introduz um elemento para despertar a alegria avisando que a festa já está próxima.
Serginho Valle 
2017 


22 de mar. de 2017

Oração Eucarística 3 - homenagem ao Sacramento

Já tivemos oportunidade de considerar a Oração Eucarística como a eucologia mor e mais bem estruturada da Liturgia. Trata-se de uma “peça orante” dirigida ao Pai, por Cristo, no Espírito Santo. 
É importante reconfirmar isso: oração dirigida ao Pai. Uma oração contínua, do início (Prefácio) ao fim (grande doxologia), completamente dirigida ao Pai. É ao Pai que se dirige o louvor e a glorificação, ao Pai que se invoca o Espírito Santo para consagrar o pão e o vinho em Corpo e Sangue do Senhor. Ao Pai que se fazem as preces em favor da Igreja, dos vivos e falecidos. Ao Pai, por fim, que se oferece o sacrifício da Igreja, que é o próprio Jesus Cristo. 
Mas, este é um dado que parece não ser considerado, especialmente quando a Oração Eucarística é transformada em homenagem ao Sacramento da Eucaristia. Em tal proposta, rompe-se com o destinatário da Oração Eucarística, o Pai, para dirigir homenagem ao Sacramento. A Oração Eucarística, como se lê em todos os documentos litúrgicos da Igreja, como evidenciado em textos de teólogos, não é momento para se prestar homenagem, adoração, louvores e súplicas ao Santíssimo. Esta acontece fora da celebração Eucarística, na Adoração ao Santíssimo, por exemplo. 
Antes que alguém me julgue ou me entenda mal, não estou falando de pecado, tão somente de um desvio de finalidade, nitidamente claro do ponto de vista da comunicação litúrgica. Ou seja, a Anáfora é uma oração dirigida ao Pai e não momento para homenagear o Sacramento.

Genuflexão 
Um modo de prestar homenagem ao Sacramento é através da genuflexão. No Missal de Pio V, usado antes do atual (Missal de Paulo VI), eram feitas duas genuflexões, num total de quatro. Duas genuflexões para o Pão consagrado e duas genuflexões para o Vinho consagrado.
Na reforma Litúrgica, realizada pelo Concilio Vaticano II (1963), os especialistas em Liturgia tinham um projeto para se abolir as quatro genuflexões. Assim só não aconteceu, mas se optou por apenas duas, por uma questão histórica. O motivo de uma possível abolição das genuflexões era evidenciar a direção da Oração Eucarística totalmente orientada ao Pai. 
É interessante observar que até mesmo a elevação  do Pão e do Vinho consagrados são tratados, na Instrução Geral do Missal Romano (IGMR), com discrição, seja pela presença em alguns parágrafos, seja no modo de orientar como fazer. A IGMR fala de “ostensionem hostiae ... ostensionem calicis”, traduzido no português como “apresentação da hóstia e apresentação do cálice” (cf. IGMR 179; 274) e não como "elevatio". Este termo aparece na orientação do rito da doxologia final: “patenam cum hostia elevat” ... “calicem elevatum”, traduzido no português com o verbo “elevar”; orientação, como dito, somente para o momento da grande doxologia do "per ipsum" (Por Cristo...) (cf. IGMR 180). Indicativo para não atrair a atenção ao Sacramento em si, com elevação do Pão e do Cálice consagrados e, indicativo para esclarecer que o Sacramento é o Sacrifício da Igreja oferecido ao Pai; elevado do altar da Igreja ao Pai. Nas anáforas orientais, por exemplo, não se contempla as apresentações do Pão e do Vinho consagrados aos celebrantes.


Momento devocional 
Considero grave, do ponto de vista da comunicação litúrgica, transformar a “consagração” em manifestação devocional ao Sacramento. Hoje, em muitas comunidades, alguns padres transformam a consagração em momento devocional. Ficam ajoelhados diante do Santíssimo cantando canções a Jesus sacramentado, como por exemplo, "Eu te adoro, hóstia divina", ou canções semelhantes.
Do ponto de vista da Teologia Litúrgica, isto pode ser considerado aberração. Não entro no mérito religioso e afetivo do padre e dos celebrantes, mas no fato se introduzir algo pessoal negando-se a fazer o que a Igreja  pede e orienta.

Orações pessoais
Tenho participado de algumas Missas que o absurdo, do ponto de vista litúrgico, é, no mínimo deplorável, para não dizer reprovável. Refiro-me a padres que, ao concluir a consagração, se ajoelham, deixam de lado a Oração Eucarística e passam a fazer orações por conta própria ao Senhor Sacramentado com pedidos de cura e libertação ou com outras intenções.
Esquece-se que quem faz a Oração Eucarística não é o padre, mas o próprio Jesus Cristo, que é o mediador junto ao Pai, que apresenta a ação de graças ao Pai, juntamente com a Igreja. O padre age "in persona Christi", e age como "vox ecclesiae" e, deste ponto de vista teológico, não é do seu direito modificar, a seu gosto e com seu sentimento pessoal, a Oração Eucarística que é sempre “prex ecclesiae”.
Quem sou para julgar se Jesus ouve ou não as preces. O que ressalto é a incompatibilidade entre a Oração Eucarística, que é da Igreja, e a escolha de substituí-la por preces pessoais. Nas vezes que questionei os padres sobre isso, alguns responderam-me: "o povo gosta". O problema é que quando a teoria do "povo gosta" entra na Liturgia, ou a Igreja ou o próprio Jesus deixam de ser protagonistas da celebração e cedem lugar ao padre ou a alguém que se julga acima de ambos. 
Serginho Valle 
2017


17 de mar. de 2017

Ornamentação litúrgica inspirada na natureza

Quem atua na Pastoral da Ornamentação precisa ter sempre presente que a Liturgia vem em primeiro lugar e que a ornamentação está a serviço da Liturgia e de cada celebração, mais especificamente. A ornamentação é um elemento importante para bem celebrar, mas não o principal. Deste modo, a ornamentação assume a função de serviço em vista do bem celebrativo. Ornamenta-se para favorecer uma melhor participação e compreensão do Mistério celebrado.
O serviço da ornamentação tem muitas fontes inspiradoras. Entre estas, a natureza; inspirações que vêm da natureza, em se tratando de ornamentação floral. Falo de inspiração na composição de alguns arranjos e do simbolismo constante que outros arranjos florais podem exercer na vida dos celebrantes. Em outro artigo, propus a técnica da ikebana para compor arranjos florais. A proposta continua de pé; agora, minha proposta é buscar a inspiração que se encontra na natureza, sempre iluminados, é evidente, pela Palavra de cada celebração.
É um aspecto que convida o ministério da ornamentação a ficar atento ao que vê na nossa flora.  Um arranjo com cactos, por exemplo, pode ser inserido numa composição floral com pedras, indicando simbolicamente a força da vida, mesmo onde existem pedras. Trata-se de uma representação simbólica e, ao mesmo tempo, de um símbolo vivo presente na flora de muitas regiões do nosso país. Uma composição da paisagem que, em forma simbólica, foi "participar" da celebração, mas que continua na paisagem evocando a mesma mensagem da Palavra anunciada naquela celebração. É um símbolo que não termina sua função simbólica no fim da celebração, pois continua depois de a celebração ter sido concluída, por estar presente na natureza.
Outro exemplo. No Domingo que o Evangelho traz o convite de Jesus para olhar os lírios do campo (8DTC-A), não é necessário compor um arranjo floral, exatamente, com lírios do campo. Para ajudar os celebrantes a compreender o significado dos lírios do campo, na parábola de Jesus, pode-se preparar um arranjo com flores silvestres ou com aquelas flores que nascem em qualquer terreno e até mesmo em calçadas. Assim, o arranjo floral se coloca a serviço da celebração, favorecendo nos celebrantes maior compreensão do Mistério que se está celebrando. Este é outro exemplo de como a mensagem do arranjo continua falando depois de concluída a celebração.
Minha proposta, nesta breve reflexão, quer também chamar atenção para compor arranjos com aquilo que se tem na flora onde vive a comunidade. Em comunidades com dificuldades financeiras, o custo com flores pode ser proibitivo, de onde a proposta de buscar na vegetação local a inspiração para fazer algum arranjo que simbolize e favoreça uma participação ativa e consciente.
Serginho Valle
2017


15 de mar. de 2017

Oração Eucarística 2 - A dinâmica orante

A Oração Eucarística tem uma dinâmica orante, fundamentada na tradição eucológica da Liturgia latina. Isto significa que a Oração Eucarística obedece ao esquema latino "ad - per - in". Traduzindo: ao Pai, por Cristo, no Espírito Santo. A Oração Eucarística é dirigida ao Pai, por Cristo e realizada no Espírito Santo. Mas, é essencialmente dirigia ao Pai. Este é um dado teológico que esclarece e facilita a orientação comunicativa da e na Oração Eucarística.
Outra característica da dinâmica orante da Oração Eucarística é tratar-se de uma oração memorial. Aqui temos dois significados: um teológico e outro comunicativo. Tratarei somente do significado que diz respeito ao processo comunicativo. Neste caso, a Oração Eucarística é  uma prece narrativa, isto é, vai narrando, vai fazendo memória ao Pai daquilo que Jesus realizou na Ceia derradeira. No decorrer da narrativa intercala algumas súplicas, que teremos oportunidade de comentar mais adiante. Narra ao Pai, dirige-se ao Pai, o que provoca e questiona a estranheza inserir momentos de adoração ao Santíssimo Sacramento no interior da Oração Eucarística.

Toda dirigida ao Pai  
Voltando ao primeiro aspecto, de se caracterizar como uma oração dirigida ao Pai, do ponto de vista comunicativo,  a dinâmica narrativa realiza-se com palavras e com gestos. Não somente com palavras, mas também através da gestualidade.
O rezar ao Pai com palavras é muito simples de perceber. Basta ler com atenção as anáforas para se constatar que a Oração Eucarística não se dirige nem a Jesus Cristo e nem ao Espírito Santo, mas unicamente ao Pai. Aliás, toda a Eucaristia é uma grande ação de graças ao Pai: os louvores e glorificações são dirigidos ao Pai, bem como as súplicas. Uma que outra coleta inicial é direcionada a Jesus Cristo, além de orações, como é o caso da “oração pela paz”.
Quanto aos gestos, estes consistem em levantar os braços, gesto orante de quem mostra um coração aberto diante de Deus, mas também gestos realizados no interior da narração da Instituição da Eucaristia, com exceção do "partir o pão" e "beber o vinho". Assim, o presidente da celebração mostra, também com os gestos, o que Jesus realizou: "Tomou o pão", toma o pão nas mãos. "Elevou os olhos ao céu" e eleva os olhos ao Pai. "Tomou o cálice". Então toma o cálice em suas mãos. São gestos discretos que, infelizmente, para muitos presidentes se tornaram automatizados, de onde o risco de perder relevância para quem preside e para quem contempla (os celebrantes) a dinâmica comunicativa da prece gestual.
Não uma prece unicamente verbal, portanto, mas, verbal e reforçada pela gestualidade, como que "obrigando" o Pai a ver que, não apenas se está "narrando o que Jesus fez e disse", mas também mostrando com os mesmos gestos o que ele fez antes de entregar sua vida no Mistério da Cruz. 

Comunicação oral e visual  
Do ponto de vista comunicativo, agora do lado do receptor, digamos assim, do lado dos celebrantes, a Oração Eucarística pode ser caracterizada como um processo comunicativo oral e visual. Um processo comunicativo para ser ouvido e para visto. Em termos mais diretos: para ser ouvido e olhado.  
Quanto ao primeiro aspecto, o aspecto oral, existe certa facilidade, digamos assim. Os celebrantes ouvem o que está sendo proclamado na Oração Eucarística. No que respeita ao segundo, a gestualidade, o uso dos folhetos desviam o olhar dos celebrantes do altar para a leitura individualista da narrativa. Neste caso, não se tem uma assembléia que olha na mesma direção, a Mesa do Altar, mas um grupo de pessoas com cabeças baixas lendo seus folhetinhos ou livretes. Também a alternativa do telão torna-se prejudicial neste caso pela atração que a luz projetada pelo mesmo exerce sobre a assembleia; um poder de imã, com força suficiente para desviar o foco dos olhos: em vez da contemplação silenciosa do altar, onde acontece o Mistério, a concentração na luz luminosa para a leitura. Não deixa de ser um ruído.

Não ler, mas proclamar 
Por fim, a arte de comunicar a Oração Eucarística da parte do presidente da celebração. Deixo de lado o óbvio: voz e dicção claras, pausas, tom de voz... Concentro-me no aspecto orante que o texto da Oração Eucarística propõe. Quanto a isso muito se tem a dizer, mas, nesse momento, concentro-me num único aspecto: o rezar! A arte de se comunicar rezando; rezando sinceramente e não teatralmente, para ser visto.
O estilo literário da Oração Eucarística é laudativo e narrativo. Duas características próprias da oração Bíblica e da eucologia. Por isso, o padre não declama a Oração Eucarística para a assembléia, mas reza a Oração Eucarística com a assembléia, que a acompanha silenciosamente. Reza dirigindo-se ao Pai e não para a assembléia. Sua atitude é de orante, portanto, e quanto mais for orante mais eficaz estará sendo sua comunicação, tornando-a comunicação sincera. Quando isso acontece, a assembléia também reza e, deste modo, cai por terra qualquer argumento de que todos precisam rezar junto a Oração Eucarística em vista de uma melhor participação.
Serginho Valle 
2017 


10 de mar. de 2017

A ornamentação silenciosa da Quaresma

Como sabido, a Quaresma caracteriza-se como um tempo silencioso. Isto deveria ser manifestado nas canções, no modo de celebrar, na gestualidade e, também, no espaço celebrativo. Em se tratando de ornamentação, o contexto tem a ver com o espaço celebrativo e, neste caso, com um espaço celebrativo que seja silencioso, que inspire silêncio e, principalmente, que convide ao silêncio. 
Trata-se, portanto, de um espaço silencioso. Para compreender este aspecto é preciso remeter-se ao deserto, o símbolo religioso do espaço silencioso. Hoje, temos condições de ter uma imagem formada da paisagem do deserto como um local vazio e sem vegetação; um indicativo de silêncio. É este o cenário que se tornou um dos símbolos fortes da Quaresma. Deserto como indicativo de silêncio, de local silencioso onde o homem e a mulher entram em contato com Deus. Assim fez Jesus e assim fizeram milhares de eremitas: vão ao deserto para buscar o silêncio, o espaço e o ambiente mais favorável para se encontrar com Deus.
Dito isto, compreende-se que o espaço celebrativo, na Quaresma, não se compõe de ou com arranjos florais, nem que for feito com flores roxas. Compreende-se que não se compõe nem mesmo com folhagens. Estas são retiradas do ambiente celebrativo para indicar com mais a insistência o clima e o espaço silencioso do deserto. A Liturgia entende transmitir este tempo de silenciar também aos olhos. É o convite para “ver” o silêncio. Para quem é capaz de sentir os tempos litúrgicos, não apenas compreender, mas sentir, não existe dificuldade alguma celebrar no espaço silencioso proposto pela Quaresma. Esta é uma dificuldade presente em pessoas barulhentas, que ficam incomodadas com o silêncio.
Na prática, a Liturgia orienta a tirar qualquer presença de vegetação: flores e folhagens. Não se pode entender tal orientação como imposição, mas como condição própria e adequada ao tempo da Quaresma, tempo silencioso por excelência.

Simbolizar os Domingos da Quaresma 
Como dito, ausência de vegetação para indicar e conduzir os celebrantes ao silêncio. Isto abre espaço para a possibilidade de simbolizar cada Domingo quaresmal com elementos que não sejam vegetais. Esta é uma prática muito comum na Europa, principalmente na França.
Desta forma, no 1º Domingo da Quaresma, por exemplo, poderia ser criado um espaço que simbolizasse o deserto, com areia e algumas pedras. No 3º Domingo da Quaresma, do Ano A, pode-se criar um poço no presbitério para simbolizar o encontro de Jesus com a samaritana. Tudo muito simples. Nada de grandes simbolizações, a estilo de carro alegórico, porque não se trata de alegoria. Na verdade, tais simbolizações, do ponto de vista da comunicação e da semiologia, comportam-se como atividade icônica, ou seja, indicativo daquiilo que se proclama na Palavra.
Faço tal referência por ser pratica comum em muitas comunidades, também aqui no Brasil, mas minha predileção, quanto a espaço celebrativo quaresmal, continua sendo por uma igreja deserta, silenciosa, como pede a tradição quaresmal no que se refere ao espaço celebrativo.
Serginho Valle 
2017 


3 de mar. de 2017

Catequese Litúrgica – Quaresma do “Ano A”

Um tempo muito rico e muito especial, do ponto de vista Litúrgico, acontece no decorrer deste mês de março, a partir da quarta-feira de cinzas. Estou falando da Quaresma que, neste ano de 2017, será vivenciada e celebrada, praticamente, no decorrer de todo o mês de março. 
É também um tempo especial do ponto de vista da espiritualidade pessoal e comunitária. Trata-se de um convite que a Igreja faz a cada um, pessoalmente, para irmos ao deserto com Jesus. Ali, no silêncio do deserto, teremos as  condições necessárias para silenciar e entrar em contato conosco mesmos para avaliarmos como está nossa vida espiritual, se estamos crescendo ou estagnados em nossa caminhada espiritual.

Dois primeiros Domingos  
Os dois primeiros Domingos da Quaresma têm o mesmo Evangelho, nos Anos A, B e C. Muda, sim, o evangelista. No 1º Domingo da Quaresma, relata-se o Evangelho da "tentação de Jesus", no 1º Domingo, e, o Evangelho da "Transfiguração do Senhor", no 2º Domingo. 
Em comum, os Evangelhos deste Domingo ressaltam o silêncio do deserto e da montanha como locais para o encontro com Deus. Ainda em comum o destaque para a força vinda de Deus para vencer as tentações e, a mesma força divina para encorajar os Apóstolos, com a Transfiguração; encorajamento necessário para quando vissem o Senhor desfigurado, no alto da Cruz.
Dois elementos apenas, a serem considerados a partir dos dois primeiros Domingos da Quaresma: o silêncio e a força divina como propostas pedagógicas para vivenciar espiritualmente a Quaresma.

Demais Domingos Quaresma 
A Quaresma do “Ano A”, que celebramos neste ano, tem a característica de ser uma Quaresma catequética, iluminada pelo caminho catecumenal da Iniciação Cristã. Assim, no 3º Domingo da Quaresma - A, os celebrantes  são colocados diante do símbolo batismal da água. A fonte da água viva que o Senhor fez brotar no deserto (1L) para se libertar o povo da escravidão e da sede, é figura da libertação que alcançamos quando somos mergulhados nas águas batismais. Mergulhar na água do Batismo é mergulhar no Espírito Santo, como ensina Jesus à Samaritana. 
No 4o Domingo, a Liturgia coloca dois símbolos batismais: o óleo (1L) e a luz (E). Com o óleo somos ungidos com o dom do Espírito Santo de Deus, que penetra em nossas vidas como o óleo penetra em nosso corpo. Com a vela, Jesus coloca sua luz divina em nossos olhos para ver a realidade da vida com a mesma luz divina. Um Domingo para refletirmos a viver iluminados pela luz do Espírito Santo de Deus.
Por fim, o ultimo Domingo traz o símbolo da veste branca, com a qual somos revestidos com a veste divina. O símbolo encontra-se no ressuscitamento de Lázaro, quando Jesus pede que sejam retiradas as vestes de morte para revesti-lo com vestes novas. Vestes que recebemos no dia do Batismo, sinal da vida nova realizada com atitudes e por comportamentos iluminados e pautados à luz do Evangelho.
Serginho Valle
2017


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