A
maior das causas na dificuldade de celebrações litúrgicas autênticas e frutuosas
está na não educação para celebrar. Não uma má-educação, no sentido de não se
respeitar protocolo ou etiquetas celebrativas, mas em ignorar o que é a
Liturgia e o que é celebração litúrgica. Isto é um verdadeiro desafio para a
Pastoral Litúrgica Paroquial (PLP): educar os celebrantes na compreensão do que
é uma celebração litúrgica. Nessa reflexão, vou focar somente num ponto, que
considero básico em vista da educação para celebrar de modo participativo e
consciente. Chamo atenção para a educação orante. A celebração litúrgica, entre outras
dinâmicas comunicativas, é uma celebração orante.
Não
é novidade que carecemos de escolas de oração que ensine e eduque os cristãos a
rezar como Jesus rezava. A maior parte dos cristãos têm dificuldade para rezar
porque não foram ensinados a rezar como Jesus. Uma grande parte de cristãos
sequer reza. Outra parte são recitadores de fórmulas e, nas orações
comunitárias, como são as celebrações litúrgicas, muitos confundem emoção com
oração. Este é um fato que dificulta a participação consciente dos católicos
nas celebrações litúrgicas, especialmente na Missa. O que faz um celebrante
durante a Missa se não participa de um princípio básico, que é a oração
celebrativa?
Na
minha pouca experiência, percebo que a catequese formal feita com crianças,
adolescentes e jovens dedica pouco espaço ao aprendizado da oração ou,
praticamente, não dedica espaço para o aprendizado da oração. Não se dedica
tempo e espaço a educar os catequizandos à oração. Eu desconheço um
investimento de pesquisa pedagógica ou psicológica de como introduzir
catequizandos das mais diferentes idades na prática da oração.
Fora
da catequese, a situação não é diferente e, talvez, até mesmo piorada. Conheço
comunidades que propõe educação e experiências para aprender a rezar através da
Pastoral da Espiritualidade. A maior parte das paróquias, infelizmente, sequer
ouviu falar que existe uma Pastoral da Espiritualidade. Não posso deixar de
mencionar a louvável atividade da Oficina de Oração, cuja experiência tem feito
um grande bem a milhares de pessoas em tantas comunidades paroquiais.
Ouve
-se muito, nas celebrações litúrgicas, em pregações, em programas de rádio de
TV, que é importante rezar, que precisamos rezar, que a oração é a arma do
cristão e tantos outros slogans motivacionais em prol da oração. Mas como
rezar? Ou ainda, para ficarmos no básico: o que é rezar para um cristão? Como
reza um cristão? Perguntas que não são propostas e nem respondidas nas
pregações sobre a oração.
Alguns
pregadores dizem que toda atividade que fazemos é uma oração, por isso basta oferecer
a Deus o dia que iremos viver que tudo isso se transformará em oração. Não vou
entrar em discussão, mas se fosse assim, Jesus, nosso Mestre na oração, não
passaria horas e noites em oração. Sim, no ensinamento de Jesus, a oração é um
tempo diferente da atividade cotidiana; um tempo reservado e dedicado
unicamente para ficar na companhia de Deus. Vejo isso como uma das principais
causas que dificultam a participação consciente e ativa nas celebrações
litúrgicas. A dificuldade de propor a celebração litúrgica como um tempo
dedicado para ficar na companhia de Deus juntamente com a comunidade.
Rezar
celebrando e celebrar rezando
A
celebração litúrgica é uma forma de oração que reúne diferentes modalidades
orantes. Na Missa, por exemplo, existe a oração de súplica, a oração
silenciosa, a oração de escuta da Palavra, a oração falada, a oração cantada e
a oração visual, aquela dedicada à contemplação. Quando não se é iniciado na oração cristã,
quando se aprendeu a rezar com Jesus e a rezar como Jesus rezava, é difícil
rezar celebrando, como também é difícil tornar a celebração um momento orante. Diga-me
como celebras que eu te direi o tempo que dedicas à oração. A celebração
litúrgica, por ser um momento no qual entramos no espaço divino, é a principal
manifestação da vida de oração de quem celebra e de como se celebra. É um
tempo, no qual somos educados por Deus enquanto rezamos.
A
celebração da Liturgia das Horas é um exemplo típico de oração celebrada. Por
manter a característica orante da Bíblia, com o canto dos salmos e hinos, além
de súplicas e responsórios, é totalmente envolvida no silêncio orante, como é
próprio da oração de Jesus. Aqui no Brasil, anos atrás, iniciou-se a
experiência da Liturgia das Horas em forma de “Ofício das Comunidades”. As
comunidades que adotaram o Ofício das Comunidades ou a celebração da Liturgia
das Horas — não dentro da Missa, mas como celebração própria — entram num
caminho de educação celebrativa orante para celebrar rezando.
Outro
exemplo de Liturgia orante acontece na celebração da Unção dos Enfermos. O
ambiente e a condição contextual de celebrar com pessoas em situação de
vulnerabilidade, naturalmente, conduz a realizar uma celebração mais calma,
mais silenciosa e profundamente orante. Já ouvi de muitos agentes da PLP que
trabalham com enfermos o quanto são santificados rezando e celebrando a Palavra
e a distribuição da Eucaristia levada aos enfermos e participando da celebração
da Unção dos Enfermos. A celebração é um tempo de oração e, quando isso é
desconsiderado, realizam-se ritos e deixa-se de celebrar.
A
celebração do Sacramento da Penitência é outro exemplo de celebração orante. É
verdade que nem sempre isso acontece e, em grande parte, nem mesmo celebração litúrgica
existe; faz-se um rito abreviado e reduzido ao acolhimento, acusação dos
pecados, proposta de penitência e absolvição, tudo em forma de bate-papo. Descuida-se
assim de celebrar a busca do perdão divino e do perdão fraterno oferecido pela
Igreja preparando-se pela meditação, pelo exame de consciência (que é contato
da realidade de vida com a proposta do Evangelho) e pela oração. A praenotanda do Ritual da Penitência orienta
que o padre se prepare pela oração para que a escuta do penitente seja um gesto
de acolhimento misericordioso realizado no silêncio compreensivo e não pelo
julgamento. A cena de Jesus com a pecadora é ícone de uma celebração da
Penitência bem-feita, na qual Jesus silencia, escreve no chão, reza e envia com
uma nova proposta de vida (Jo 8,1-11). Tudo envolvido no mais profundo
respeito, como se caracteriza a celebração litúrgica da Penitência.
Conclusão
Grande
parte dos católicos não é educado para celebrar de modo orante, em situação de
contato com a Palavra. Grande parte de nós nos limitamos a realizar ritos e
isso não apenas dificulta, mas impede fazer experiência celebrativa orante, favorecedora
de encontro com Deus e fonte do crescimento na vida espiritual. Disso, a
importância de uma PLP que se proponha a educar para a Liturgia, não se
limitando a ensinar significados e fornecendo explicações de ritos, mas
aprender a celebrar celebrando, aprender a celebrar rezando.
Cada
vez mais fica evidente que a PLP não pode se contentar, ou se limitar, a
preparar celebrações e estar presente nas celebrações. A PLP precisa,
urgentemente em algumas paróquias, a entender que seu trabalho na Liturgia vai
muito além que fazer listas e preparar celebrações. Isto já se faz; agora é
preciso assumir um trabalho capaz de tornar a Liturgia fonte e cume de todas as
atividades da Igreja (SC 10).
Serginho Valle
Fevereiro de 2022.