Um
tempo novo e um novo caminho se abre diante de nós no mês de Janeiro. Por isso,
votos de feliz ano novo, abençoado e repleto das bênçãos divinas. Este é o
primeiro sentimento que a Liturgia expressa quando celebra a Solenidade da Mãe
de Deus, invocando na 1ª leitura a bênção divina para todo o povo, na certeza
que somos necessitados desta bênção para iluminar nossos passos no decorrer de
todo o novo ano.
A
Palavra da Solenidade da Mãe de Deus, além da teologia e espiritualidade
litúrgica da Maternidade Divina em Maria, considera também o contexto do Ano
Novo, que se inicia com a intercessão pela paz no mundo inteiro. A bênção
divina é a pessoa de Jesus Cristo presente na vida pessoal, na vida da
comunidade e em toda a terra. O melhor modo de participar dessa bênção, diz São
Paulo, é tornando-se filhos e filhas de Deus (2L da Solenidade
da Mãe de Deus).
Tempo
epifânico: adoração e conversão
Do
ponto de vista da Teologia Litúrgica, as primeiras celebrações do Ano
Litúrgico, depois do Advento, caracterizam-se como celebrações “epifânicas”.
Isto em decorrência das celebrações natalinas, mas também presente no início da
primeira parte do Tempo Comum.
A
Epifania, do ponto de vista da Liturgia cristã, é a celebração da manifestação
divina no mundo em Jesus Cristo. Deus que se manifesta em Jesus Cristo. — Para
a Teologia Litúrgica Oriental, as celebrações litúrgicas são epifanias divinas,
são manifestações da presença divina na terra em modo sacramental. — As celebrações
que acontecem no início do Ano Litúrgico (que corresponde a dezembro e janeiro
do mês civil) facilitam esta compreensão, porque nos ajudam a perceber como Deus
se manifesta ao mundo, na pessoa de Jesus, o Verbo Encarnado, celebrado na
Liturgia em sua dupla dimensão: memorial e compromisso de vida.
O
primeiro momento (no mês de janeiro) encontra-se na Solenidade da Mãe de Jesus,
quando a Sagrada Família manifesta (faz epifania) da glória divina deitada numa
manjedoura aos pastores. Tal manifestação continua na Solenidade da Epifania
propriamente dita, com a profissão de fé dos Reis Magos: “Vimos sua estrela no Oriente e viemos adorá-lo!” Deus se manifesta
como recém-nascido pobre e como luz que atrai todos os povos à adoração. Neste
sentido, a Epifania não apenas vê, contempla, mas tem o compromisso de convidar
a adorar o Deus único e verdadeiro. Consequentemente, o inverso disso consiste
na necessidade de abandonar os ídolos e toda forma de idolatria antiga e atual.
É a conversão existencial, representada nos Reis Magos que voltam por um
caminho diferente depois de terem adorado o Menino Deus (Mt
2,12).
Vida iluminada pela luz divina:
atraídos para Jesus
A
Liturgia relacionada à Epifania divina demonstra que toda a humanidade pode ser
iluminada com a luz divina, porque Jesus, o Filho de Deus, é a luz que veio
para iluminar o mundo (Jo 1,8-13). Isto vem do simbolismo
da “estrela guia” que conduziu os Magos até o presépio. Por isso, a Liturgia é
Epifania enquanto conduz e acende a luz divina entre os celebrantes e os atrai
para o encontro com Jesus. Esta é a definição da nova evangelização: evangelizar
não é tanto explicar o Evangelho, mas promover o encontro com Jesus para fazer
discípulos. Assim a Epifania é movimento evangelizador por atrair os
celebrantes ao encontro com Jesus. Os Magos são o exemplo evangélico, neste
sentido.
Também
a celebração da Festa do Batismo do Senhor entra no contexto da Epifania, pela
apresentação de Jesus, não feita pela sua família, como no presépio, mas feita
pelo próprio Pai: “Eis meu Filho muito
amado, escutai-o todos vós!” Jesus é manifestado (epifania) pelo Pai como
seu Filho e como seu Servo.
A
referência ao “Servo de Javé”, o escolhido especialmente por Deus para uma
missão que o próprio Deus deveria realizar na terra, é Jesus. No contexto da
Teologia da Epifania, a Liturgia não o apresenta somente como Filho de Deus,
mas como “Servo de Deus”, o servidor de Deus, aquele que está entre nós para
prestar um serviço a Deus em favor da humanidade. O Servo de Javé e sua missão,
descritos por Isaias (Is 52,13-53,12),
realiza-se plenamente em Jesus. O tema do “Servo de Javé” é celebrado pela
Liturgia na Paixão do Senhor, de onde a Epifania ter uma ligação direta com o
momento máximo do serviço que Jesus presta ao Pai em favor da humanidade.
Quanto
aos celebrantes do Batismo epifânico de Jesus, estes recebem da celebração o
compromisso concreto de viverem como filhos e filhas de Deus, como também, a
exemplo de Jesus Cristo, o compromisso relacionado ao serviço. Em resumo, configurados
a Jesus, no e pelo Batismo, o cristão assume a mesma dinâmica e a mesma
proposta existencial do Mestre que veio não para ser servido, mas para servir (Mt
20,28).
Epifania
no início do Tempo Comum - A
A
manifestação (epifania) de Jesus continua no início do Tempo Comum, no 2º
Domingo do Tempo Comum – A (2DTC-A),
mais precisamente, com a apresentação de Jesus pelo maior de todos os profetas,
João Batista, que o manifesta (faz epifania) como o “Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo!”
João
é o terceiro personagem que “manifesta”, faz epifania da presença divina no
mundo, na pessoa de Jesus. Primeiro foram José e Maria, depois o próprio Deus
Pai e, agora, João Batista. Como de cada epifania se percebe uma atividade
messiânica de Jesus, o mesmo acontece na epifania feita por João Batista, no
início deste Tempo Comum: introduz Jesus na missão profética do Servo de Javé,
aquele que tem a vocação de, pelo sacrifício, se tornar “cordeiro”, isto é,
oferecer a própria vida como oferta pascal. A vocação profética do "Servo
de Javé" realiza-se plenamente em Jesus Cristo, que trouxe para a terra e
para toda a humanidade o projeto divino: o Reino de Deus. Um projeto a ser
seguido por quem deseja morar com Jesus, isto é, tornar-se discípulo e
discípula de Jesus (Evangelho do 2DTC-A).
A consequência concreta, portanto, não é apenas conhecer Jesus como “Cordeiro
de Deus”, mas entrar no discipulado.
A
conclusão de todas estas celebrações epifânicas, realizadas no final do Tempo
Natalino e início do Tempo Comum - A, retomam o tema da luz, que pode ser
resumido na seguinte passagem Bíblica: “O
povo que vivia nas trevas viu uma grande luz!” (1L
do 3DTC-A). É a profecia de Isaias que se realiza em Jesus,
porque ele é a luz do mundo e trouxe o seu Evangelho para iluminar a terra com
a luz divina. Novamente, o compromisso concreto do discipulado para não se
viver nas trevas do mundo.
Do
ponto de vista celebrativo, entende-se que todos que se fazem discípulos e
discípulas de Jesus tornam-se iluminados e também iluminadores da luz divina,
trazida por Jesus e seu Evangelho. É a dinâmica da evangelização: iluminar a
terra com a luz do Evangelho. É pela evangelização, que o grande sonho humano
coincide com o sonho divino de acender a luz do Evangelho para iluminar os
corações de homens e mulheres tornando-os discípulos e discípulas. Isto tem seu
início pela vivência das Bem-aventuranças, o coração do Evangelho, que é
proclamada na última celebração Dominical de Janeiro (4DTC-A).
Assim, depois da Epifania, depois de apresentar quem é Jesus, a Liturgia,
pedagogicamente, inicia a formação dos celebrantes no discipulado.
Serginho Valle
2016