Em tempos idos, a Liturgia era
considerada a cerimônia oficial da Igreja. Era no tempo que os católicos iam à
igreja para assistir Missa, ver batizados, ver a crisma... Era comum, pois,
ouvir falar em cerimônia da Missa, cerimônia do Batismo, cerimônias religiosas.
Antes de continuar, gostaria de
fazer um parêntesis, para considerar um dado. Do ponto de vista da teoria da
comunicação, a assistência é considerada uma forma de participação. Trata-se,
contudo da assistência empática ou simpática; não apática. Nos dois primeiros
casos, empática e simpática, o assistente participa (toma parte) do que vê e
escuta, como por exemplo, numa competição esportiva ou num cinema; ele não
compete, mas se emociona com o acontecimento e participa pelo envolvimento
emocional. Como ainda, na assistência de um filme, que toma parte das cenas de
modo empático, sofrendo, rindo, sentindo medo, criando expectativas com as
cenas. Diferente é a assistência apática, na qual se vê um fato e nele se é
incapaz de tomar parte. Está presente, mas é indiferente porque sabota a
participação. A apatia é um impedimento à participação. É desta assistência que
estamos nos referindo em casos de celebrantes que permanecem alheios a tudo. A
pessoa não celebra, não se faz celebrante.
Há 50 anos, com o Concílio Vaticano
II, a Igreja mudou o modo de entender a Liturgia. Você que freqüenta a Liturgia
não ouve (não deveria ouvir) mais falar de cerimônia litúrgica. Hoje se diz
celebração litúrgica; celebração da missa, por exemplo, celebração do Batismo,
celebrar a Penitência. A Liturgia não é uma cerimônia, embora feita de ritos,
mas que é apresentada por alguém. A Liturgia é celebração porque envolve quem
nela se faz presente.
A cerimônia diz respeito ao modo
exterior de um ato ou de atos ritualizados. Uma série de ritos que alguns
realizam e outros assistem. Pede presença, mas é possível não ter algum
envolvimento, ou ter um envolvimento protocolar como, por exemplo, aplaudir
algum discurso. Celebração, ao contrário, envolve a vida e exige participação.
Não se pode pensar em celebração sem participação, porque a participação é uma
exigência da celebração; é algo intrínseco ao celebrar. A cerimônia está ligada
a formalismos e prescrições. Alguém faz, outros assistem e mantém uma certa
distância. Vê ritualismos, mas não toma parte nos ritos. É fácil perceber a
diferença entre cerimônia e celebração e mais fácil ainda é sentir esta
diferença. Mas, o mais importante está no fato que toda celebração está ligada
à recordação de algo importante, seja um acontecimento, seja uma pessoa. Por
isso, na Liturgia celebra-se um acontecimento, celebra-se uma pessoa. Celebra-se
o acontecimento da História da Salvação e celebra-se a pessoa de Jesus,
celebra-se a ação divina no meio do povo e celebra-se o próprio Deus agindo no
povo.
A este ponto é evidente que não é possível
confundir Liturgia como a cerimônia oficial da Igreja. A Liturgia é mais que
cerimônia; é memória: recorda uma pessoa: Jesus Cristo; recorda um
acontecimento: o Mistério da Salvação de Deus. Cerimônia não rima com Liturgia.
Afinal, nós não fazemos cerimônia a Jesus Cristo nem à Salvação. Fazemos memória,
no sentido teológico de “memorial” de tornar atual; atualizar. Memória com o
significado de “recordar”, da palavra latina “re+cordis”: trazer de novo para o
coração dos celebrantes, para o coração da Igreja, para o coração do mundo. Na
Liturgia, portanto, celebramos Jesus Cristo, celebramos a Salvação, celebramos
nossas vidas com Cristo, por Cristo e em Cristo.
Serginho Valle