A Igreja oferece
rituais próprios para interceder pela
saúde — como a “Missa pelos Doentes” (Pro infirmis). É
uma celebração Eucarística para rezar “pelos doentes”, colocando
a vida dos doentes nas mãos de Deus, sem transformar a celebração em um rito
voltado exclusivamente a curas e milagres. O mesmo princípio encontra-se no
Sacramento da Unção dos Enfermos, com sua proposta celebrativa invocando a cura
física do doente, mas sempre em modo tal que a vontade divina prevaleça.
Efeitos psicológicos nas
celebrações emotivas
A Psicologia da Religião observa que encontros
marcados por músicas altas e gestos expressivos, como mãos levantadas, olhos
fechados, o bater palmas e movimentos corporais... podem gerar respostas
emocionais fortes, como choros e, em casos extremos, até mesmo desmaios. Esses
fenômenos, em contextos de grande carga emocional, podem ser confundidos com
ações divinas; é um risco que se corre.
A Igreja sempre é
muito cautelosa e
zelosa em proteger a essência da Liturgia, que sempre celebra o Mistério Pascal de Cristo, cuidando
para não servir a outros fins, como rituais curativos em estilo de atração
religiosa. A celebração litúrgica não se norteia por critérios de espetáculo,
mas em obedecer às normas da Igreja, e não àquilo que apenas “agrada ao povo”,
aquilo que o “povo gosta”.
Desde o início
da Igreja, em termos de celebração Eucarística, a Liturgia deu mais atenção à
dimensão da pedagogia mistagógica,
que a promoção de milagres, embora eles tenham proliferado em forma de bênçãos
e Missas Votivas, na Idade Média, quando a mistagogia é esquecida a ponto de
desaparecer. Voltou com a reforma litúrgica do Vaticano II sendo proposta como
caminho de introdução (iniciação) para participar de modo consciente e ativo do
Mistério celebrado.
Tal dimensão,
repito, deixou de existir na Idade Média e foi retomada com a Reforma
Litúrgica, no século XX. A passagem dos discípulos de Emaús (Lc 24,13-34) ilustra essa pedagogia: antes de
partilhar o pão (Eucaristia), Jesus percorre um caminho com eles, explicando as
Escrituras para, pedagogicamente, conduzi-los ao Mistério da Ressurreição. Este
é um indicativo de como conduzir nossas celebrações com a mesma pedagogia
mistagógica de introduzir os celebrantes no Mistério celebrado. Perceba que não
existe instrumentalização neste caso. Existe um acompanhamento mistagógico,
realizado por Jesus, de introdução no Mistério da Ressurreição, que tem seu
momento culminante — a Liturgia é cume e fonte (SC 10) — na “fractio panis”
Eucarística (Lc 24, 30). Celebrar não para milagres, mas para marcar a
conclusão de uma etapa da caminhada na estrada de Jesus, no discipulado.
Na tradição litúrgica, a celebração dos
Sacramentos e dos Sacramentais tem, entre outras dimensões, esta dimensão
pedagógica de fazer com que os fiéis caminhem
com o Senhor, compreendam a vida a partir da Palavra que
sempre é anunciada em toda celebração litúrgica para serem configurados a Jesus
Cristo como discípulos e discípulas. Como ensina São Paulo VI, “a
Liturgia é a primeira escola da
vida cristã”. Entende-se que a vida cristã é vivida na “estrada
de Jesus”, no caminho do discipulado, cuja fonte encontra-se na Liturgia
proclamadora e celebrante memorial da Palavra. Estou falando da dimensão
evangelizadora da Liturgia.
O papel evangelizador da
liturgia
Papa Francisco,
na “Desiderio desideravi” (n. 37),
reforça que a dimensão evangelizadora
da celebração litúrgica. A celebração como momento
evangelizador, um contato de compromisso para se assumir existencialmente o
Evangelho. A celebração litúrgica não prescinde (nem pode prescindir) do
emocional. Mas, o emocional somente para emocionar, para causar sensações
emocionais fortes, sem evangelização, torna-se incompleta. O encontro com Cristo Ressuscitado, que emocionou os
discípulos de Emaús, continua emocionando aqueles celebrantes
que fazem experiência do encontro com o Senhor vivo na celebração litúrgica.
Quanta emoção e sentimento de alegria ao celebrar a Penitência e se sentir
abraçado pelo perdão divino. Quanta emoção de doentes que se sentem
fortalecidos pela celebração da Unção dos Enfermos.
É a emoção de
quem se compromete com o Evangelho à medida que caminha na estrada de Jesus.
Para isso, entende-se que a pedagogia
mistagógica é essencial para a formação da vida cristã
compreendida de modo holístico: emocional, racional, corporal, relacional. O
primeiro objetivo da Reforma Litúrgica, proposto pelo Concílio Vaticano II,
afirma que a Liturgia, na qualidade de fonte é chamada a fomentar a vida cristã entre dos celebrantes (SC 1).
“Fomentar” aqui significa proporcionar meios para o crescimento
espiritual da vida cristã em tudo aquilo que respeita à vida; de modo
holístico.
Para assim
acontecer é preciso pensar a Liturgia de modo diferente, sempre mais
evangelizada e evangelizadora. A proposta de pensar a Liturgia de forma
diferente não tem o intuito de transformar a Liturgia da Palavra em longas pregações, mesmo porque a
Liturgia da Palavra não contempla toda a celebração. Mas, é Liturgia da Palavra
que dá sentido ao Mistério celebrado em cada Sacramento e, ao mesmo tempo, que
se torna luz para se viver de modo fiel a vida cristã em modo pessoal e a vida
cristã de toda comunidade. Neste caso, a vida cristã em forma de serviço nas
diferentes pastorais e ministérios de uma comunidade paroquial. Eis o contexto
para se compreender a pedagogia mistagógica atuando em celebrações
evangelizadas e evangelizadoras.
Sei que existem
muitos materiais de qualidade disponíveis para ajudar nessa prática de tornar
as celebrações litúrgicas sempre mais evangelizadas e evangelizadoras
servindo-se da pedagogia mistagógica. Permita-me incluir também dois cursos que
escrevi e gravei sobre este tema. Um curso introdutório, chamado Pastoral DA
Liturgia e um curso mais denso para organizar a PLP – Pastoral Litúrgica
Paroquial. Para conhecer e saber mais sobre os cursos, acesse:
Pastoral DA
Liturgia — https://lp.liturgia.pro.br/pastoral-da-liturgia
PLP – Pastoral
Litúrgica Paroquial — https://lp.liturgia.pro.br/plp1
Serginho Valle
Outubro de 2024
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