
Não podemos negar que, de certo
modo, trata-se de formalidade disciplinar, uma vez que o ministério do
leitorato e do acolitado já são exercidos há anos por mulheres em toda a
Igreja. No Brasil, esta é uma práxis comum, natural, na Pastoral Litúrgica de
nossas comunidades.
O que é alterado, com o motu
proprio de Papa Francisco, é o cânone 230, do Código de Direito Canônico. O
cânone 230 inicia-se dizendo:
“§1. Os leigos varões que tiverem idade e as
qualidades por decreto da Conferência dos Bispos, podem ser assumidos
estavelmente, mediante o rito litúrgico prescrito, para os ministérios de
leitor e de acólito.”
A mudança, a partir do motu
proprio de Papa Francisco, é a exclusão do termo “leigos varões”, exclusão da
palavra “varões” (homens). O novo texto passa a ser redigido desse modo:
“Os leigos que tiverem a idade
e as aptidões determinadas com decreto pela Conferência Episcopal, podem ser
assumidos estavelmente, mediante o rito litúrgico estabelecido, nos ministérios
de leitores e de acólitos; no entanto, tal concessão não lhes atribui o direito
ao sustento ou à remuneração por parte da Igreja.”
O texto modificado mantém o
critério e a condição da idade. O que significa? Que existe uma idade própria
para o leitorato e acolitato? Inúmeras comunidades têm crianças exercendo o
ministério do leitorato e, neste caso, elas poderão continuar no exercício
desta atividade? Quanto ao acolitato, a idade leva a entender que seja exercido
por jovens de caminhada e adultos.
Ministérios
conferidos pela Igreja
É preciso notar que, no caso do
leitorato, não se trata, unicamente de “fazer leituras” nas celebrações
litúrgicas. O ministério do leitorato é mais amplo e seu exercício ministerial
não se limita unicamente à Liturgia da Palavra. O foco está na importância que
a Igreja dá ao leitor, a ponto de criar um ministério instituído. Não se
improvisam leitores, escolhendo-os antes da celebração e nem se escolhem
leitores “democraticamente”, como se diz, perguntando antes da celebração:
alguém quer fazer uma leitura? O leitor é um ministério importante que implica
não somente a leitura, mas o modo de viver. Quer dizer, vida coerente com
aquilo que lê, com aquilo que proclama na celebração diante da assembleia. Além
disso, o leitor instituído tem funções extras celebrativas, na catequese, por
exemplo, em celebrações devocionais...
Tais elementos — entre outros —
indicam que a escolha de alguém para exercer o ministério de leitor precisa levar
em conta a idoneidade moral. O critério do ministério do leitor não está na
oratória, isto é básico, mas no exemplo de vida cristã.
Quanto ao acolitato, este não
tem nada a ver com coroinha. Hoje, muitos padres e leigos atuantes na Pastoral
Litúrgica, inexplicavelmente — especialmente da parte de padres — confundem o
ministério de ajudante do altar com o ministério de acólito.
O coroinha não é acólito. Ele
exerce seu ministério como servidor do altar. O Acólito, comparando, exerce as
atividades que os Ministros da distribuição Eucarística realizam na maior parte
das nossas comunidades. O acólito, além de ajudar na celebração Eucarística,
tem como função do seu ministério a distribuição da Eucaristia na Missa, como
também levar a comunhão Eucarística para doentes e idosos.
Sinalização para
outros ministérios
Vários teólogos e liturgistas consideram
que o motu próprio Spiritus Domini aparece como sinalização de abertura para
outros ministérios femininos, como o diaconato permanente, que já está em
estudo na Igreja, desde o início do Pontificado de Francisco.
Causa estranheza comentários ao
motu próprio relacionados a “igualdade de poder” entre homens e mulheres na
Igreja. O motu próprio não está equiparando poderes, mesmo porque isso seria
ridículo, em termos de Teologia Ministerial. O foco da paridade entre homens e
mulheres encontra-se no Batismo (Gl 3,28). Isto vale tanto para a essência da
vida cristã como para as atividades ministeriais, salvo aquelas em ordem
disciplinar canônicas, como é o caso das ordenações.
O motu próprio, além das
discussões acadêmicas, é uma oportunidade pedagógica para valorizar o leitorato
e o acolitato em nossas comunidades. Lembrar, por exemplo, que a Liturgia da
Palavra não é um rito de leituras, mas é celebração proclamadora da Palavra de
Deus que, em tese, deve ser proclamada por quem a Igreja considera digno de
exercer tal atividade pela coerência entre aquilo que vive e a Palavra que
proclama. Da mesma forma, o exercício do acolitato orienta para a importância
da Eucaristia na vida da comunidade, considerando especialmente a necessidade
de distribuí-la entre aqueles que não podem se fazer presente na celebração
Eucarística comunitária.
Serginho Valle
Fevereiro de 2021
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