Fractio panis. Este foi um
dos primeiros nomes com os quais era denominada a Eucaristia. Estamos falando
do rito da "fração do pão". É um rito importante, do ponto de vista
teológico, mas nem sempre valorizado como mereceria, no contexto ritual
da celebração Eucarística.
Esta desvalorização do
rito da "fração do pão" pode muito bem ser devido ao desconhecimento
do significado do rito. Isso se evidencia quando o padre parte o pão enquanto a
assembléia realiza o abraço da paz, por exemplo. Deixa assim,
a intercessão do Cordeiro de Deus vazia, uma vez que o rito da Fração
do pão é compreendido a partir do canto do Cordeiro de Deus. Em outras
palavras, Cordeiro de Deus e Fração do pão formam um único rito.
Além do exemplo
citado, desconsidera-se, ou se desrespeita o rito quando este é realizado
de modo apressado, quando o pão é partido em cima da patena, escondido,
impossibilitando aos celebrantes de verem a fração do pão. Sendo gesto
escondido, do ponto de vista comunicativo, o gesto perde seu
sentido. Desconsidera-se o rito, igualmente, quando a fração do pão
acontece no momento da Consagração do Pão, na Oração Eucarística. É o caso do
padre que pretende dar realismo à Oração Eucarística e, ao dizer as palavras
“partiu o pão”, de fato parte o pão. Neste caso dois são os ritos castigados ao
mesmo tempo: a Consagração e a Fractio Panis. Uma clara indicação de
duplo desconhecimento da função ritual da Oração Eucarística e da função ritual
da fração do pão.
O sentido do rito
A fração do Pão é um
rito sacramental e, enquanto tal, fundamentado pela Bíblia e pela Teologia
simbólica. Não se trata, portanto, de um gesto prático (qual fosse partir a
grande hóstia para melhor ser ingerida), mas de um gesto, repito, sacramental.
O principal sentido Bíblico
encontra-se na figura do Cordeiro, a vítima pascal imolada como oferenda a Deus
e ao povo, como se lê no relato de Ex 12,1-14. Este relato da Ceia Pascal
Judaica é figura daquilo que acontece com o verdadeiro Cordeiro, com a
verdadeira vítima, que é Jesus Cristo, com as qualidades descritas por Isaias
(Is 53,7) e, igualmente, como apresentado por João Batista (Jo 1,29).
Jesus é apresentado
por João Batista como o Cordeiro de Deus, como a oferta sacrifical que o
próprio Deus oferece para a Salvação da humanidade. O gesto
sacrifical está presente na fração o Pão. É Corpo de Cristo
que é repartido como sacramento da doação da vida divina e como
alimento divino para a vida humana.
O Cordeiro é o próprio
Jesus oferecido sacrificalmente no altar, como fora oferecido na
Cruz. Na Ceia Pascal judaica, que serve como figura, o cordeiro deveria ser sem
defeito. Na Cruz e, sacramentalmente, no altar da Eucaristia, Jesus,
Cordeiro de Deus, é a vítima pura, sem defeito, da qual nenhum de seus ossos
foi quebrado. Como na Cruz, também o altar é o local onde a Igreja
"sacrifica" a vítima pura, santa, imaculada — como proclama a Oração
Eucarística I —, no sentido de oferecer ao Pai e aos celebrantes a vitima pura,
um sacrifício santo e redentor. Tudo isso está representado no gesto ritual da
fração do Pão.
Diante de tal riqueza
da Teologia Eucarística, realizar o rito fora do contexto ou de qualquer jeito
é empobrecê-lo ou, é um infeliz modo de manifestar o desconhecimento do rito.
Commixtio
O “gesto sacrifical”
da fração do Pão é concluído com um rito chamado commixtio. Rito com o
qual o padre coloca uma partícula da hóstia no cálice com o vinho
sagrado. Um rito antiquíssimo que, nas origens expressa a comunhão com entre
todas as igrejas. Isso acontecia do seguinte modo, na cidade de Roma: o Papa
celebrava a Eucaristia e, no momento da fração do Pão reservava um pedaço do
pão para ser enviado a cada uma das “estações” (comunidades) da cidade de Roma.
O bispo da estação recebia a partícula da hóstia e a depositava no seu cálice
com o Vinho consagrado para expressar a comunhão, na Eucaristia, com o Bispo de
Roma. Sinal que em todas as igrejas e comunidades se celebra a única e mesma
Eucaristia.
Mesmo diante da
impossibilidade de, hoje, realizar um rito semelhante, a Igreja conservou o
rito com um sentido novo, expresso na oração secreta que é recitada no momento
que o padre deposita a partícula no Vinho consagrado: “Esta união do Corpo e do Sangue de Jesus, o Cristo e Senhor nosso, que
vamos receber, nos sirva para a vida eterna”. Um gesto simbólico de
comunhão que é espiritualizado para manifestar o Dogma Eucarístico da presença
de Jesus no Pão e no Vinho consagrados.
Também a commixtio não
pode ser feita de modo automatizado, mas realizado com devoção, com calma e em
espírito de adoração.
Serginho
Valle
2017
0 comentários:
Postar um comentário
Participe. Deixe seu comentário aqui.